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sábado, 30 de março de 2013

Pepe Escobar: “Brics consegue furar o cerco”

Notícias da morte prematura do Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) são muitíssimo exageradas. A imprensa-empresa ocidental está inundada dessas tolices, perpetradas, nesse específico caso, pelo presidente do Morgan Stanley Investment Management.

A realidade é outra. O Brics reúne-se em Durban, África do Sul, nessa terça-feira, para, dentre outros passos, criar sua própria agência de avaliação de riscos, escapando assim da ditadura – ou, no mínimo, das “agendas enviesadas”, como diz a diplomacia indiana – das agências tipo Moody's/Standard & Poor.

Também tocará adiante a criação de um Banco de Desenvolvimento do Brics, com capital inicial de US$50 bilhões (faltam só se definir alguns detalhes estruturais), para ajudar em projetos de infraestrutura e de desenvolvimento sustentável.

Importante, mesmo, é que EUA e União Europeia não serão acionistas desse Banco do Sul – alternativa concreta, estimulada principalmente por Índia e Brasil, ao Banco Mundial e ao sistema de Bretton Woods controlados pelo Ocidente.

Como observou o Ministro das Finanças da Índia, Jaswant Singh, esse banco de desenvolvimento poderá, por exemplo, canalizar o know-how de Pequim, para ajudar a financiar as obras massivas de infraestrutura das quais a Índia carece.

As grandes diferenças políticas e econômicas entre os países do Brics são autoevidentes. Mas, já agora reunidos e operando como grupo, o ponto já não é se podem proteger a economia global contra a crise non-stop do capitalismo-de-cassino avançado.

O ponto é que, além de medidas para facilitar o comércio mútuo, as ações do bloco vão-se tornando cada vez mais políticas. O Brics não apenas mostra seu poder econômico como, também, toma medidas concretas na direção acelerada rumo a mundo multipolar. Nisso, o Brasil é particularmente ativo.

Inevitavelmente, os míopes fanáticos atlanticistas de sempre do consenso de Washington nada veem – miopicamente – além de “Brics esperam mais reconhecimento das potências ocidentais”.

Claro que há problemas. O crescimento está mais lento no Brasil, China e Índia. Dado que a China, por exemplo, tornou-se principal parceiro comercial do Brasil – já ultrapassou os EUA – vastos setores da indústria brasileira sofreram com a concorrência das manufaturas chinesas baratas.

Mas há perspectivas futuras inescapáveis. O Brics muito provavelmente terá mais poder no Fundo Monetário Internacional. Detalhe crucialmente importante, o Brics passará a negociar em suas próprias moedas nacionais, servindo-se, de um iuane globalmente conversível e afastando do dólar estadunidense e do petrodólar.

A China em momento menos acelerado

O inventor da expressão “Bric” (no início, ainda sem a África do Sul) foi Jim O’Neill, do banco Goldman Sachs, nos idos de 2001. Muito interessante e esclarecedor ouvir o que O’Neill tem a dizer hoje, sobre o mesmo tema [em longa entrevista à revista Der Spiegel (21/3/2013, “Brics 'Have Exceeded all Expectations” [Os Brics superaram todas as expectativas], Der Spiegel).

O'Neill destaca que a China, mesmo tendo crescido “meros” 7,7% em 2012, “Criou riqueza equivalente a uma economia grega inteira, a cada 11 semanas e meia”. A desaceleração na China foi “cíclica e estrutural” – um “desligar a máquina” planejado para controlar o superaquecimento e a inflação.

Os impulso adiante que se vê no Brics é parte de uma tendência global irresistível. Boa parte dessa tendência está bem decodificada num novo relatório do Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas [orig. United Nations Development Programme]. Em resumo: o norte está sendo ultrapassado na corrida econômica, pelo sul global, que corre a velocidade estonteante.

Segundo aquele relatório, “pela primeira vez em 150 anos, a soma dos resultados das três principais economias do mundo em desenvolvimento – Brasil, China e Índia – é praticamente igual aos PIBs somados das notórias potências industriais do Norte”.

A conclusão óbvia é que “o crescimento do Sul global está reformatando radicalmente o mundo do século 21, com nações em desenvolvimento comandando o crescimento econômico, arrancando da miséria centenas de milhões de pessoas e empurrando bilhões mais para uma nova classe média global”.

E no coração crucial ardente desse processo, encontramos um épico eurasiano: o desenvolvimento de relação estratégica entre Rússia e China.

O Presidente Vladimir Putin da Rússia não quer saber de arrastar prisioneiros: quer empurrar o Brics no rumo de constituir “um mecanismo de cooperação estratégica em plena escala, que nos permitirá, juntos, procurar soluções para as questões chaves da política global”.

Isso implicará uma política externa comum para todo o Brics – e não só alguma coordenação seletiva em torno de alguns temas. Não será fácil. Exigirá tempo. Putin está perfeitamente consciente disso.

O que torna tudo ainda mais fascinante é que Putin já expôs essas ideias ao novo Presidente da China, Xi Jinping, que o visitou em Moscou, por três dias. Putin não mediu palavras: fez questão de dizer e repetir que as relações sino-russas “são hoje as melhores, em séculos de história”.

Não é exatamente o que os atlanticistas hegemonistas gostariam de ouvir – sempre interessados, eles, em manter todas as relações no pé em que estavam na Guerra Fria.

Xi retribuiu em alto estilo: “Não viemos visitá-los à toa” – como se lê, parcialmente detalhado no China Daily. E esperem só, que a potência criativa dos chineses comece a gerar dividendos.

Inevitavelmente, o Oleogasodutostão está no coração do projeto de relações complementares entre esses dois grandes Brics.

A China precisa do petróleo e o gás da Rússia, como item de segurança nacional.

A Rússia quer vender mais e mais dos dois itens, diversificando a carteira de clientes, na direção do Oriente; mais que tudo, a Rússia receberia com enorme entusiasmo investimentos chineses no extremo oriental de seu território – a imensa região TransBaikal.

E, por falar nisso, não é verdade que o “perigo amarelo” esteja invadindo a Sibéria – como diz o ocidente. Só 300 mil chineses vivem hoje na Rússia.

Consequência direta da reunião de cúpula Putin-Xi é que de agora em diante Pequim pagará adiantado pelo petróleo russo que comprar – em troca de participar em inúmeros projetos, como, por exemplo, na prospecção de petróleo em alto mar nas áreas da CNPC e Rosneft no Mar de Barents e em outros pontos das águas russas.

A Gazprom, por sua vez, fechou negócio longamente esperado de gás com a CNPC: 38 bilhões de metros cúbicos por ano entregues pelo gasoduto ESPO, a partir da Sibéria, começando em 2018. E já no final de 2013, será finalizado e assinado um novo contrato chinês com a Gazprom, envolvendo fornecimento de gás para os próximos 30 anos.

As ramificações geopolíticas são imensas: importar mais gás da Rússia ajuda Pequim a, gradualmente, escapar do seu dilema Malacca e Ormuz – para não mencionar a industrialização das províncias do interior da China, imensas, muito densamente povoadas, duramente dependentes ainda da agricultura, e que ficaram à margem do boom econômico.

Eis como o gás russo encaixa-se no plano máster do Partido Comunista Chinês: para configurar as províncias do interior do país como base de apoio para a classe média chinesa – 400 milhões de chineses cada vez mais ricos, mais urbanizados, que vivem na costa leste.

Putin, ao dizer e insistir que não vê o bloco Brics como “concorrente geopolítico” contra o ocidente, fez o que faltava fazer: negou oficialmente, para não deixar dúvidas de que, sim, sim, se trata exatamente disso. Durban será, provavelmente, a ocasião em que se sacramentarão apenas os primeiros movimentos dessa competição. Desnecessário dizer que as ‘'elites'’ ocidentais – ainda que estagnadas e à beira da bancarrota – não cederão, senão depois de muita luta, qualquer dos seus privilégios.
Por Pepe Escobar – Asia Times Online

Traduzido pelo Coletivo de Tradutores da Vila Vudu

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