Pepe Escobar: “A Casa de Saud pivotear-se-á para a China?” - Noticia Final

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domingo, 27 de outubro de 2013

Pepe Escobar: “A Casa de Saud pivotear-se-á para a China?”

Bandar Bush bin Sultanpor Kerry Waghorn

O esporte geopolítico favorito du jour é desconstruir as razões pelas quais a Casa de Saud – o casamento da monarquia hiperabsoluta e de fanáticos wahabistas – pirou completamente, com o inefável Bandar Bush na linha de frente.

Estão aterrorizados ante a possibilidade de que o Muro de Desconfiança, de 34 anos, entre Washington e Teerã, finalmente venha abaixo. Estão aterrorizados ante o risco de aqueles infiéis norte-americanos recusem-se a fazer a guerra para a “nossa” mudança de regime contra a Síria. Estão aterrorizados ante a crítica (leve) contra a repressão linha duríssima no Bahrain (que os sauditas invadiram, em 2011, por falar nisso). Detestam mortalmente o culto norte-americano àquela divindade – a democracia – que permitiu que os EUA abandonassem tiranos amigos na Tunísia e no Egito (a Líbia é diferente; o rei Abdullah queria Gaddafi detonado desde, no mínimo, 2002).

A Casa de Saud está tão doidamente furiosa com o governo Obama, que até “todas as opções” estão previstas “sobre a mesa”. O que obriga a perguntar: e se Riad estiver realmente sonhando com pivotear-se para a China?

O “socialismo com características de mercado” como Pequim autodescreveu-se precisa muitíssimo do petróleo saudita; afinal, a Casa de Saud já é o principal fornecedor da China. O rei Abdullah olha para o leste e o que vê é uma superpotência aspirante, abarrotada de dinheiro ilimitado, a qual jamais sonhará com intervir em assuntos internos dos sauditas, para nem falar de considerar ideias de Primavera Árabe.
Hu Jintao (então presidente da China) visita o Rei Abdullah da Arabia Saudita em 2009

Imaginem então o rei Abdullah moribundo sonhando com um eixo Riad-Pequim como seu legado – com o benefício extra embutido de deslocar o Irã, inimigo mortal, fazendo do Irã problema de segurança nacional dos chineses (embora Pequim, com certeza, toma a coisa como a proverbial situação de ganha-ganha, interessada em comprar ainda mais gás dos sauditas, enquanto continua comprando mais gás do Irã).

A Arábia Saudita produz cerca de 10% do total global, o que perfaz cerca de 90 milhões de barris de petróleo/dia. É o maior exportador do mundo, produtor decisivo, [Orig. swing producer] essencial na definição do preço do petróleo – o qual permanece muito alto, não só por causa da demanda chinesa e indiana, mas também por causa da especulação incansável.

Riad está atentamente observando a possibilidade de os EUA tornarem-se autossuficientes em energia, por causa da tecnologia do fracking – tecnologia suja, imunda, repugnante e geradora de poluição devastadora. Com certeza estão avaliando que mesmo com os EUA produzindo mais do que os sauditas – cerca de 12 milhões de barris/dia, incluindo etanol – mesmo assim os EUA têm de importar nada menos que 6,7 milhões de barris/dia em 2013. Os EUA continuarão a carecer de petróleo – petróleo saudita – no futuro previsível.
Petrodólar perde valor...

Se “todas as opções” estão mesmo “sobre a mesa”, a Casa de Saud pode estar considerando acertar um negócio de décadas com o chineses vorazes consumidores de energia, garantindo-lhes suprimento a preço combinado. Mas assumamos que a demanda – especialmente da Ásia – suba, como subirá: a Casa de Saud sabe que os EUA podem ver-se numa enrascada e manifestar, com gestos e espalhafato, o próprio desprazer.

Perdendo minha religião (do petrodólar)

A Casa de Saud também sabe muito bem que ela é a âncora que mantêm a OPEP ligada ao sistema do petrodólar. Sem a Arábia Saudita, o petrodólar já era.

Essa, pode-se dizer é a fraude número 1 das relações internacionais. Praticamente todos e mais alguns precisam dos dólares norte-americanos, os quais são quase todos investidos em bônus do Tesouro dos EUA e outros papéis securitizados, e praticamente todos usados para comprar commodities denominadas em dólares dos EUA, como o petróleo. Como é doce ser comprado por você! Washington continua a produzir trilhões incontáveis de dólares em dívida norte-americana, que todos têm de comprar. A Casa de Saud, é claro, investe corretamente suas cascatas de dólares dos EUA, na dívida dos EUA. Imaginem, então, se a Casa de Saud decide livrar-se do petrodólar. Seria Apocalypse Now para a economia dos EUA.


Dollar Toilet Paper

Lenta, mas firmemente, os tempos estão mudando. O Irã, sob sanções em estilo declaração de guerra está mostrando o caminho, ao vender energia em outras moedas, aceitando ouro e até escambo (a Casa de Saud, aliás, está também aterrorizada ante a possibilidade de que, com a détente EUA-Irã, venha a haver muito mais petróleo e gás iranianos nos mercados ocidentais, o que diluirá os lucros sauditas).

A Rússia é agora a exportadora global número 1 de petróleo, e a China é a importadora número 1 de petróleo – importando mais da Arábia Saudita, que os EUA. Em 2020, a China estará importando vertiginosos 9,2 milhões de barris/dia. Assim sendo, obviamente não faz sentido algum que os BRICS Rússia e China continuem a usar o petrodólar: aí está um traço crucial da recente conclamação, de Pequim, para “desamericanizar” o mundo. E Riad sabe disso.

A Casa de Saud também considera duas outras tendências: já há anos, exporta a maior parte de seu petróleo, para a Ásia; e a China, inevitavelmente, tornou-se a principal exportadora – uma miríade de produtos manufaturados – para a Arábia Saudita, à frente dos EUA. Pequim, mais uma vez, está jogando jogo discreto, de longo prazo, investindo na infraestrutura saudita. Sabendo que a Arábia Saudita não pode exportar mais do que já exporta, de seu petróleo pesado, altamente sulfuroso – porque poucos países conseguem refiná-lo – a China está construindo um massivo novo complexo de refino/exportação. Vídeo a seguir:

Assim sendo, no longo prazo, o que temos é, na essência, um confronto EUA-China (com Rússia e Irã também pesando), pelo petrodólar.

A absoluta, total prioridade, da Casa de Saud – aconteça o que acontecer – é a autoperpetuação. Para continuar a ganhar rios de dinheiro – petrodólares ou quaisquer. Para poder manter contido, em xeque-mate, o Irã, inimigo mortal, aqueles “xiitas apóstatas”.

Mas... a ponto de pivotear-se para a China?

A rede de vender-comprar proteção à moda Máfia é tão doce! Por causa da religião do petrodólar, a Casa de Saud é, na essência, autoperpetuada pelo guarda-chuva do Pentágono e por aquelas toneladas de contratos de armas.

No momento, a paranoia da Casa de Saud reproduz-se em duas frentes, como vírus mortal. Estão aterrorizados ante o risco de a rede não durar, se o Irã volta ao jogo. E pior, imaginam eles, com capacidade nuclear.
Petroyuan?

E os sauditas suspeitam que o muito alardeado – e até hoje inexistente – pivoteamento dos EUA para a Ásia seja um nada discreto “dê adeus ao seu novo amiguinho”, no caso de a Arábia Saudita passar a ser parceiro preferido da China. O pivoteamento pode até ser interpretado, por uma Casa de Saud paranoica, como dupla ameaça: dirigido na direção da China, no longo prazo, mas também contra a Arábia Saudita, do tipo “e nem pense em mudar-se para o petroyuan”.

Até aqui, uma Casa de Saud devorada por viciosa batalha pela sucessão, além de furiosa, com medo e paralisada pelo carrossel geopolítico que não para de modificar-se, não dá qualquer sinal de que deixará escapar o monstrengo híbrido do “relacionamento especial” com os EUA. Está só dando um berreiro-chilique. Se e quando entrar em modo de “estou perdendo minha religião” (dos petrodólares), aí, sim, a ação começa para valer.

Redecastorphoto

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