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quarta-feira, 27 de novembro de 2013

O dilema iraniano de Israel

Os EUA estão preparados para conceber uma República Islâmica totalmente reintegrada na comunidade de nações, com igualdade de direitos


A era da alienação traumatizada ficou para trás. Os Estados Unidos e o Irã embarcaram em uma nova fase de sua relação. Ela é marcada por negociações bilaterais, apertos de mão, sorrisos, bandeiras lado a lado e compromissos significativos, incluindo a aquiescência dos EUA a um “programa de enriquecimento mutuamente definido” para o Irã em qualquer acordo de longo prazo e o comprometimento iraniano de que, “sob circunstância alguma”, o país “jamais buscará o desenvolvimento de qualquer arma nuclear”.

O acordo provisório de seis meses entre as maiores potências e o Irã, renovável por mais seis meses até que se obtenha um acordo definitivo (por um período a ser definido), congela o programa nuclear iraniano onde ele está — um ponto tecnologicamente avançado à beira da militarização. Mas ele recoloca em marcha a relação entre Washington e Teerã e pode, desta forma, redesenhar o mapa estratégico do Oriente Médio.

Isto explica a rejeição de Israel, sua insistência em que um acordo que detenha a escalada torna a região mais perigosa. Israel é a potência por excelência do Oriente Médio, porque o status quo cimenta seu domínio nuclear armado. Qualquer mudança é suspeita, incluindo rebeliões populares árabes contra o despotismo. O avanço americano-iraniano é grande, quase tão grande quanto seria a paz entre Israel e os palestinos.

Assim como os EUA tiveram que se adaptar a um mundo em que seu poder é sem igual, mas não mais determinante, Israel terá de fazer o mesmo. Com uma liderança esclarecida, isto poderá fortalecer o Estado judeu, trazendo segurança à nação via integração na região, em vez de fazê-lo pela dominação. Por enquanto, Israel ainda tem caminho a percorrer para chegar a essa forma de pensar. Seu prisma dominante é o militar. É importante que o presidente Obama tenha estabelecido um indicador, como fez com esse acordo, que possa impulsionar nova reflexão estratégica em Israel. (Um Israel já alarmado pelo isolamento não está a ponto de embarcar num ataque militar tipo Sansão ao Irã).

Vamos ser claros. Este é o melhor acordo que se poderia conseguir. Nada, nem mesmo o bombardeio contínuo por Israel, pode reverter o know-how nuclear que o Irã possui. O objetivo deve ser cercar a capacidade adquirida para que seu uso seja apenas pacífico.

Essa meta deverá ser alcançada com a limitação no atual nível da capacidade iraniana de enriquecimento de urânio de baixa qualidade, a eliminação ou diluição dos estoques de urânio enriquecido a 20%, pela interrupção da instalação de novas centrífugas, pelo interrompimento da construção do reator de água pesada de Arak e pela intensificação das inspeções internacionais. Em troca, o Irã recebe alívio de sanções avaliadas em em US$ 6/7 bilhões. O país começa a retornar ao mundo, que é onde a vasta maioria de sua jovem população deseja que ele esteja e onde o Ocidente tem interesse em vê-lo, porque o contato produz moderação e o isolamento impulsiona o extremismo. Como disse Obama, “em última análise, só a diplomacia pode tornar possível uma solução duradoura para o desafio proposto pelo programa nuclear do Irã”.

A divergência estratégica entre os EUA e Israel não é meramente tática. O admirável John Kerry, cujo compromisso com essa empreitada diplomática tem sido exemplar, não foi totalmente franco sobre esse ponto.

Os EUA reconheceram que qualquer acordo durável precisa conceder ao Irã um programa de enriquecimento limitado de urânio. O entendimento diz que, sob um eventual acordo de longo prazo, um programa nuclear iraniano “será tratado da mesma forma que o de qualquer outro país sem ambições militares e signatário do Tratado de Não Proliferação” — pondo presumivelmente o Irã na mesma categoria de Japão ou Alemanha, outros signatários do TNP com programas de enriquecimento. Israel, ao contrário, deseja um Irã com enriquecimento zero e desmantelamento do programa nuclear ao estilo do que ocorreu na Líbia.

Os EUA estão preparados para conceber uma República Islâmica totalmente reintegrada na comunidade de nações, com igualdade de direitos. Mas isto ainda está muito longe. O Irã não poderá se livrar rapidamente das suspeitas que suas ações e palavras levantaram. Nem se deveria permiti-lo. Mas Obama e Kerry estão prontos para acolher a reabilitação iraniana.

Não é o caso de Israel sob Benjamin Netanyahu, que quer manter o Irã para baixo. “Empurrem-no para baixo, é tudo o que ouço quando escuto Netanyahu falar”, um empresário iraniano educado em Stanford e Harvard disse-me. Ele tem uma forte crença de que trazer o Irã para mais perto do mundo é essencial, detesta o atual regime e se sente afrontado pelo desprezo israelense em relação às aspirações nacionais iranianas.

A diplomacia envolve compromisso; o risco é inerente a ela. O Irã será testado. Ninguém sabe o resultado. As coisas podem desandar, mas pelo menos há esperança. Talvez seja essa a maior ameaça para Netanyahu. Ele nunca desejou testar os palestinos de forma séria — sua boa-fé, o fim das humilhações da ocupação, o poder da justiça e a paz. Ele tem preferido dominar, prefere os palestinos para baixo e sob pressão.

Obama e Kerry convidaram Netanyahu a pensar de novo — e não só sobre o Irã. Nada, a julgar pela retórica israelense, poderia ser mais desconcertante. Nada é mais necessário. Alusões baratas a 1938 são um modelo pobre para Israel no século XXI.


(*) ROGER COHENé colunista do “The New York Times”

O Globo / Plano Brasil

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