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segunda-feira, 13 de agosto de 2018

UE caiu na armadilha de Washington, para a guerra comercial anti-China, por F. William Engdahl

F. William Engdahl, New Eastern Outlook, NEO

Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu

Embora muitos na União Europeia (UE) tenham respirado aliviados ante o aparente sucesso das recentes conversações sobre tarifas comerciais entre Juncker, presidente da Comissão da UE, e o governo Trump, na realidade parece que Washington conseguiu arrastar ardilosamente a UE, especialmente a Alemanha, a fechar a porta contra qualquer possível colaboração com a China para o desenvolvimento comercial e econômico. 
Apesar de haver problemas com a política econômica da China, os recentes desenvolvimentos sugerem que se criou algum consenso na UE para dar as costas aos monumentais potenciais do espaço econômico eurasiano com centro na China, a favor de uma aliança com EUA e com o Japão – ambos países hostis ao desenvolvimento da China. É desdobramento que pode ferir gravemente o desenvolvimento da economia da UE.


Durante semanas antes das recentes conversas Washington-UE, Pequim procurou criar uma frente unida, começando por objeções formais legais na OMC, além de outros modos de contestar as tarifas unilateralmente impostas pelos EUA a produtos chineses e da UE. Antes da reunião de 16 de julho entre Pequim e UE, funcionários chineses mantiveram conversações com vários de seus contrapartes na UE. Ao que se sabe, estavam dispostos a fazer concessões no sentido de abrir o mercado interno chinês a empresas da UE, em troca de ação conjunta unificada contra Washington. A agência oficial de notícias Xinhua disse que China e Europa, "devem-se dar as mãos para resistir contra o protecionismo. China e países europeus são parceiros naturais", disse o órgão oficial do governo chinês. "Todos esses creem firmemente que o livre comércio é motor poderoso para o crescimento econômico global."

Um dos objetivos estratégicos da Iniciativa Cinturão e Estrada (ICE), chamada também Rota Econômica da Seda, é criar uma rede de infraestrutura de transportes que, no futuro, ligue diretamente a China aos grandes mercados europeus. Até agora, Bruxelas resistiu, e estados individuais, principalmente nas regiões orientais da UE, como Hungria, Grécia ou República Tcheca, abriram-se para os investimentos chineses em infraestrutura. Depois que Trump aplicou tarifas unilaterais contra produtos de alumínio e aço de países da UE, em semanas recentes, ao mesmo tempo em que Washington iniciou uma série pesada de sanções tarifárias e ameaças de que outras sanções viriam contra a China, acabaram-se quaisquer aberturas que a China tivesse obtido para acordos mais amplos com a Alemanha e com a União Europeia como bloco. 

A evidência de que Washington atirava ao mesmo tempo contra China e UE alimentou esperanças (ingênuas) em Pequim de que seria possível alguma cooperação íntima com a UE, contra Washington.


Verdadeiro alvo é a alta tecnologia chinesa


Enquanto o presidente dos EUA tuitava caudal infinito de mensagens sobre o tamanho do déficit comercial entre EUA e China, e posta ameaças de que imporá novas tarifas sobre mais $200 bilhões de importações chinesas, a verdadeira estratégia dos EUA estava sendo desenvolvida com precisão milimétrica no gabinete do Representante Comercial dos EUA [ing. US Trade Representative] Robert Lighthizer. Lighthizer, experiente negociador para questões de comércio, veterano do governo Reagan, supervisionou a elaboração do "Section 301 Report into China's Acts, Policies, and Practices Related to Technology Transfer, Intellectual Property, and Innovation" (ing.).

O grupo de Lighthizer atacou diretamente os dez setores industriais listados no documento "Made in China: 2025". Não é guerra em torno de dólares comerciais, mas guerra pelo controle global das tecnologias dominantes.

A China, compreensivelmente, visa a atualizar sua base tecnológica com vistas a alcançar patamares de estado da arte global; e Washington, apoiada nas gigantes norte-americanas de tecnologias, quer impedir essa atualização e a correspondência concorrência. A guerra de tarifas é o artifício usado para destruir um concorrente potencial.

Fato interessante a considerar é o contraste entre (i) o articuladíssimo trabalho produzido pelo grupo Lighthizer contra a China e (ii) a fragilidade patética das declarações, acusações e 'provas' coletadas pelos setores da chamada 'comunidade de inteligência dos EUA' sobre uma suposta 'interferência' dos russos nas eleições de 2016, aparentemente a favor de Trump. As acusações chaves que levaram às severas sanções financeiras contra a Rússia e empresas russas foram baseadas num muito dúbio e vago 'dossiê' entregue ao senador John McCain por um agente do MI6 britânico, cujos motivos permanecem absolutamente nebulosos. 

A batalha da inteligência dos EUA contra Trump é completamente diferente da batalha Trump-China. A batalha contra a China é resultado de um consenso estratégico de todas as instituições dos EUA. Não é coisa da minúscula política doméstica dos EUA. Impedir a China de alcançar status industrial comparável ao dos EUA é projeto crucialmente decisivo para os EUA profundos.

O documento "China 2025" lista dez setores tecnológicos chaves como prioritários, incluindo inteligência artificial e computação quântica; máquinas ferramentas e robótica; equipamento aeroespacial e aeronáutico; navegação (embarque e desembarque) de alta tecnologia; equipamento ferroviário de alta performance; veículos movidos por outras formas de energia; equipamento agrícola; novos materiais; biofarma (incluindo organismos geneticamente modificados) e produtos médicos avançados.

O New York Council on Foreign Affairs, em relatório recente sobre "China: 2025", alertava que "a intenção da China com 'Made in China 2025' não é alcançar o patamar de economias de alta tecnologias como Alemanha, EUA, Coreia do Sul e Japão: o objetivo do projeto é deslocar e substituir todas essas economias."

O que Washington está fazendo agora, ante o mais impressionante crescimento do primeiro grande desafio no campo da tecnologia industrial desde a 2ª Guerra Mundial é, em certo sentido, ação completamente sem precedentes – razão pela qual é tão frequentemente mal compreendida. Alemanha e Japão não configuraram verdadeiros desafios à hegemonia dos EUA como superpotência. Graças à OTAN e outros meios, aqueles países foram contidos na posição de estados vassalos dependentes de Washington, como Zbigniew Brzezinski os apresenta em seus escritos. Mas a China de hoje, muito evidentemente, não se vê como estado vassalo dependente de Washington. 

Além disso, o fato de a China estar atraindo para sua órbita praticamente toda a Eurásia, incluindo Rússia, Irã, Organização das Nações do Sudeste Asiático [ing. ASEAN] e potencialmente também a Índia, para relações de cooperação econômica mais íntimas, faz de "China: 2025" prioridade existencial, questão de vida ou morte, o suficiente para que Washington e Wall Street arrisquem tudo para tentar fazer a semente gorar antes de brotar. Problema, aí, é que o plano do 'ocidente' pode dar em nada. Fazer a modernização tecnológica da própria indústria é campo legítimo de ação para qualquer país, mesmo que seja país gigante, como a China.


EUA e UE vs "China 2025"


O medo de ser sobrepujado por uma China em ascensão é a mensagem que Washington e seus think-tanks privados estratégicos como o CFRdesenvolveram para construir uma frente unida global para enfrentar a China. Num certo nível, está dando resultados. 

A tática de negociação de Washington é, claramente, sancionar e ameaçar seus mais antigos aliados da UE na OTAN, para uni-los numa frente econômica anti-China. É uma variante do método clássico de porrete e cenoura. Depois das ameaças do presidente dos EUA de impor sanções ao aço e ao alumínio da UE, Washington pôs-se a falar da possibilidade de acrescentar carros europeus à lista das sanções. A indústria automobilística é o coração da indústria alemã. Trump até tuitou que a UE, no comércio, se tornara inimiga dos EUA. Depois das conversações, quando Trump chegou a tuitar que havia "amor" entre EUA e UE, Washington claramente já havia conseguido o que queria: a UE concordou com não se alistar ao lado da China contra a guerra econômica de Washington, mas com Washington contra a China. Geopolítica de equilíbrio de poder britânica clássica.

O conselheiro econômico de Trump Larry Kudlow confirmou a trama, em entrevista posterior ao programa Fox Business, onde disse que "Estamos nos unindo à União Europeia para um acordo com eles, de modo que teremos uma frente unida contra a China." Kudlow acrescentou que quando o [acordo] NAFTA estiver finalizado, EUA, Europa, Canadá, México e Japão estarão unidos aos EUA, deixando a China isolada: "a China está cada vez mais isolada, com economia fraca."

O governo alemão agiu prontamente. Dia 1º de agosto anunciou que bloqueará a compra planejada por investidores chineses da Leifeld Metal Spinning AG, empresa alemã de alta tecnologia. O Ministério da Economia da Alemanha também está revisando a compra proposta, pelos chineses, de um fornecedor da indústria aeroespacial, Cotesa. É considerável mudança de política. No início desse ano, quando a fabricante chinesa de carros Geely anunciou que comprara 9% da alemã Daimler, e outra empresa chinesa comprou a fábrica alemã de maquinário para fabricar ferramentas, Kuka, o governo alemão recusou-se a intervir.


Ampliam-se os laços Alemanha-Japão


Ao ligar mais firmemente a Alemanha e a UE numa coalisão anti-China, em vez de aceitar as ofertas dos chineses e colaborar numa frente unida contra a guerra de tarifas dos EUA, agressiva, mas não ilegal, a UE assinou um acordo amplo de livre comércio com o Japão que, implicitamente visa a construir aliados asiáticos que façam oposição à China.

Pouco depois, o ministro de Relações Exteriores da Alemanha Heiko Maas anunciou que Berlim iniciara um "diálogo estratégico" com o Japão para criar uma "firme aliança" para uma não especificada "nova ordem internacional".

Em maio, o primeiro-ministro da China Li Keqiang foi a Tóquio para convencer o Japão a cooperar com a China contra as sanções comerciais impostas pelos EUA e convidou o Japão a integrar-se à Iniciativa Cinturão e Estrada, a nova Rota Econômica da Seda. A resposta do Japão foi fria e clara, com o subsequente acordo de livre comércio com a UE. Desde 2017 o governo Trump vem estimulando, discretamente, um renascimento do "Quad" Asiático – Japão, Índia, Austrália e EUA –, como contra-ataque implícito à crescente influência econômica da China. O "Quad" começou há uma década, com o primeiro-ministro Abe, para tentar fazer frente à crescente influência da China na região do Pacífico Asiático.

As gigantescas placas tectônicas da geopolítica global estão em movimento e ainda não se vê com clareza se daí resultará uma deriva continental ou colisões severas. Tanto China como Rússia muito apreciariam um reaquecimento de relações com a UE, por razões óbvias – precisamente o que Washington não tem qualquer interesse em permitir que aconteça. 


Ao revelar o grande plano de infraestrutura global em 2013 e em seguida, dois anos depois, o plano "Made in China: 2025", a China deu aos adversários, especialmente em Washington, a chance de jogar com os medos de aliados potenciais – Japão por um lado e União Europeia, por outro. Agora, a China precisará de diplomacia econômica sofisticada e aberta, para impedir que as crescentes diferenças entre UE e Eurásia convertam-se em fendas profundas. Se acontecer, perdem todos: União Europeia, China e Rússia.

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