UMA GUERRA MUNDIAL SE INICIA. ROMPA O SILÊNCIO. - Noticia Final

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sexta-feira, 1 de abril de 2016

UMA GUERRA MUNDIAL SE INICIA. ROMPA O SILÊNCIO.


Tenho filmado nas Ilhas Marshall, a Norte da Austrália, no meio do Oceano Pacífico. Sempre que conto a alguém onde estive, pergunta-se: “Onde fica isso?”. Se dou uma pista mencionando “Biquini”, diz-se: “Você quer dizer o traje de banho?”.

Poucos têm consciência de que o traje de banho biquini foi assim chamado para celebrar as explosões nucleares que destruíram a Ilha Biquini. 66 dispositivos nucleares foram explodidos pelos Estados Unidos nas Ilhas Marshall entre 1946 e 1958 – o equivalente a 1,6 bombas de Hiroshima por dia durante doze anos.

Biquini está em silêncio hoje em dia, transformada e contaminada. Palmeiras crescem com estranho aspecto de grades. Nada se movimenta. Não há pássaros. As lápides no antigo cemitério são focos ativas de radiação. O contador Geiger aplicado aos meus sapatos registava “perigo”.


De pé na praia, via cair a água verde-esmeralda do Pacífico desvaecendo-se em um vasto buraco negro. Era a cratera deixada pela bomba de hidrogênio à qual denominaram “Bravo”. A explosão envenenou as pessoas e o meio ambiente por centenas de quilômetros, talvez para sempre.

Na viagem de retorno, parei no aeroporto de Honolulu e notei uma revista norte-americana chamada Women’s Health (Saúde da Mulher). Na capa havia uma mulher sorridente trajando biquíni, sob o título: “Você Também Pode Ter um Corpo de Biquíni”. Poucos dias antes, nas Ilhas Marshall eu havia entrevistado mulheres que tinham “corpos de biquíni” muito diferentes: cada uma delas havia sofrido da tiroide e de outros tipos de câncer possivelmente mortais.

Ao contrário da mulher sorridente na revista, todas elas eram pobres: vítimas e cobaias de uma super-potência destruidora, hoje mais perigosa que nunca.

Conto esta experiência como advertência e a fim de interromper um diversionismo que temos consumido tantos entre nós. O criador da propaganda moderna, Edward Bernays, descreveu o fenômeno como “a manipulação consciente e inteligente dos hábitos e das opiniões” de sociedades democráticas. Chamou isto de “governo invisível”.

Quantas pessoas estão conscientes de que começou uma guerra mundial? No momento, é uma guerra de propaganda, de mentiras e de diversionismo, mas isto pode mudar instantaneamente com a primeira ordem errada, ou com o primeiro míssil.

Em 2009 o presidente Obama apresentou-se a uma multidão em atitude de adoração no centro de Praga, coração da Europa. Comprometeu-se a tornar “o mundo livre de armas nucleares”. O povo aplaudia e alguns até choraram. Uma torrente de bobagens inundou a mídia. Em seguida, foi concedido a Obama o Prêmio Nobel da Paz.

Era tudo falso. Ele estava mentindo.

A administração de Obama construiu mais armas nucleares, mais ogivas nucleares, mais sistemas de entrega de cargas nucleares, mais fábricas nucleares. Só os gastos com ogivas nucleares durante o governo de Obama ultrapassaram os de qualquer outro presidente norte-americano. O custo ao longo de trinta anos é de mais de 1 trilhão de dólares.

Está sendo planejada uma mini-bomba nuclear, conhecida como B61 Modelo 12. Nunca houve qualquer coisa como isso. O general James Cartwright, antigo vice-presidente daJoint Chiefs of Staff [comando das Forças Armadas dos Estados Unidos], declarou: “Tornar a arma nuclear menor [utilizando-a] é mais viável.

Nos últimos 18 meses, a maior acumulação de forças militares desde a Segunda Guerra Mundial – liderada pelos Estados Unidos – está sendo observada por toda a fronteira ocidental da Rússia. Nunca, desde que Hitler invadiu a União Soviética, tropas estrangeiras apresentaram uma ameaça tão concreta à Rússia.

A Ucrânia – outrora parte da União Soviética – tornou-se um parque de diversões da CIA. Tendo orquestrado um golpe em Kiev, Washington efetivamente controla um regime que é vizinho e hostil à Rússia: um regime deteriorado por nazistas, literalmente. Eminentes figuras parlamentares na Ucrânia são descendentes políticos dos notórios OUN e UPA fascistas. Eles louvam Hitler abertamente, e clamam pela perseguição e expulsão da minoria que fala russo.

Isto raramente é noticiado no Ocidente, ou é distorcido para esconder a verdade.

Em Latvia, na Lituânia e na Estônia – vizinhas à Rússia – os militares estadunidenses estão instalando tropas de combate, tanques, armas pesadas. Esta provocação extrema da segunda potência nuclear do mundo é recebida com silêncio no Ocidente.

O que torna a perspectiva da guerra nuclear ainda mais perigosa é uma campanha paralela contra a China.

É raro o dia em que a China não seja elevada ao status de “ameaça”. Segundo o almirante Harry Harris, o comandante estadunidense do Pacífico, a China está “construindo uma grande muralha de areia no Mar da China Meridional”.

Ele se refere às pistas de aterrissagem que a China está construindo nas Ilhas Spratly, as quais são objeto de disputa com as Filipinas – uma disputa sem precedentes até que Washington pressionou e subornou o governo em Manila, e o Pentágono lançou uma campanha de propaganda chamada “liberdade de navegação”.

O que significa realmente isso? Significa liberdade para navios de guerra norte-americanos patrulharem e dominarem as águas costeiras da China. Tente imaginar a reação norte-americana se navios de guerra chineses fizessem o mesmo ao longo da costa da Califórnia.

Fiz um filme chamado “A Guerra que Você Não Vê” (The War You Don’t See), no qual entrevistei notáveis jornalistas nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha: repórteres tais como Dan Rather da CBS, Rageh Omar da BBC, David Rose do Observer.

Todos eles disseram que se jornalistas tivessem feito sua tarefa e questionado a propaganda que Saddam Hussein possuía armas de destruição em massa; que se as mentiras de George W. Bush e Tony Blair não tivessem sido maximizadas e ecoadas por jornalistas, a invasão de 2003 do Iraque poderia não ter acontecido e centenas de milhares de homens, mulheres e crianças hoje estariam vivos.

A propaganda que prepara o terreno para uma guerra contra a Rússia e/ou a China em princípio não é diferente. Que eu saiba, nenhum jornalista nos mídia predominante ocidental – um equivalente a Dan Rather, digamos – pergunta porque a China está construindo pistas de aterrissagem no Mar da China Meridional.

A resposta deve ser claramente óbvia. Os Estados Unidos estão cercando a China com uma rede de bases, com mísseis balísticos, grupos de batalha, bombardeiros armados com ogivas nucleares.

O arco letal estende-se da Austrália às ilhas do Pacífico, às Marianas e às Marshalls e Guam, até as Filipinas, Tailândia, Okinawa, Coreia e através da Eurásia ao Afeganistão e a Índia. Os Estados Unidos têm amarrado uma corda no pescoço da China. Isto não é notícia. Silêncio da mídia; guerra da mídia.

Em 2015, em alto segredo os EUA e a Austrália encenaram o maior exercício militar aéreo e marítimo da história recente, conhecido como Talisman Sabre. O objetivo era ensaiar o Plano de Batalha Aéreo-Marítimo, bloqueando rotas marítimas – tais como os Estreitos de Malaca e os Estreitos Lombok – que bloqueia o acesso da China a petróleo, ao gás e a outras matérias-primas vitais do Oriente Médio e da África.

No circo conhecido como campanha presidencial norte-americana, Donald Trump está sendo apresentado como lunático, fascista. Ele certamente é odioso; mas também é uma figura odiada pela mídia. Isto, por si só, deveria gerar cepticismo em nós.

As visões de Trump sobre migração são grotescas, mas não mais grotescas que as de David Cameron. Não é Trump o Grande Deportador dos Estados Unidos, mas o vencedor do Prêmio Nobel da Paz, Barack Obama.

Segundo um prestigiado comentarista progressista, Trump está “desencadeando as forças sombrias da violência” nos Estados Unidos. Desencadeando-as?

Este é o país onde criancinhas atiram contra suas mães e a polícia trava uma guerra assassina contra norte-americanos negros. Este é o país que atacou e procurou derrubar mais de 50 governos, muitos deles democráticos, e bombardeou desde a Ásia até o Oriente Médio causando morte e privações de milhões de pessoas.

Nenhum país pode igualar este registo sistêmico de violência. A maior parte das guerras dos Estados Unidos (quase todas elas contra países indefesos) foram lançadas não por presidentes republicanos, mais sim por democratas progressistas: Truman, Kennedy, Johnson, Carter, Clinton, Obama.

Em 1947, uma série de diretivas do Conselho de Segurança Nacional dos EUA descreveu o objetivo supremo da política externa norte-americana como “um mundo feito substancialmente sobre a própria imagem [dos Estados Unidos]”. Esta ideologia era o norte-americanismo messiânico. Éramos todos norte-americanos. Se não, heréticos seriam convertidos, subvertidos, subornados, enlameados ou esmagados.

Donald Trump é um sintoma disso, mas é também independente. Ele diz que a invasão ao Iraque foi um crime; não quer promover guerra contra Rússia e China. O perigo para nós, o resto, não é Trump, mas sim Hillary Clinton. Ela não é independente: corporifica a resiliência e a violência de um sistema cujo aclamado “excepcionalismo” é totalitário, com ocasional cara progressista.

Quando o dia da eleição presidencial estiver mais próximo, Clinton será aclamada como a primeira mulher presidente, pouco importando seus crimes e sua mentiras – assim como Barack foi saudado como o primeiro presidente negro e os progressistas engoliram suas bobagens sobre a “esperança”. E a verborreia prossegue agora.

Descrito pelo colunista do Guardian, Owen Jones, como “divertido, encantador, com uma serenidade que engana praticamente todos os outros políticos”, Obama pouco depois enviava drones para massacrar 150 pessoas na Somália. Ele mata pessoas habitualmente às terça-feiras, segundo o New York Times, quando lhe é entregue uma lista de candidatos à morte por drone. Tão frio.

Na campanha presidencial de 2008, Hillary Clinton ameaçou “destruir totalmente” as armas nucleares do Irã. Como secretária de Estado de Obama, ela participou na derrubada do governo democrático de Honduras. Sua contribuição para a destruição da Líbia em 2011 foi quase que festiva. Quando o líder líbio, coronel Gaddafi foi publicamente sodomizado com uma faca – homicídio possível pela logística norte-americana – Clinton alegrou-se com sua morte: “Nós chegamos, nós vimos, ele morreu”.

Uma das mais próximas aliadas de Clinton é Madeleine Albright, ex-secretária de Estado que atacou jovens por não apoiarem “Hillary”. Esta é a mesma Madeleine Albright que, de modo infame, celebrou na TV a morte de meio milhão de crianças iraquianas como tendo “valido a pena”.

Entre os maiores apoiantes de Clinton estão o lobby de Israel e as companhias de armas que alimentam a violência no Oriente Médio. Ela e seu esposo receberam uma fortuna de Wall Street. E ainda assim, ela está prestes a ser consagrada como a candidata das mulheres fim de despedir o perverso Trump, demônio oficial. Seus apoiantes incluem destacadas feministas: as comadres de Gloria Steinem nos EUA e de Anne Summers na Austrália.

Na geração anterior, um culto pós-moderno agora conhecido como “política da identidade” impediu muitas pessoas inteligentes, de orientação progressista, de investigar as causas e os indivíduos que eles apoiavam – tais como a falsidade de Obama e de Clinton; tais como falsos movimentos progressistas como o Syriza na Grécia, que traiu o povo daquele país e aliou-se aos seus inimigos.

O interesse próprio, uma espécie de “eu-ismo”, tornou-se o novo espírito da época entre privilegiados de sociedades ocidentais e marcou a morte de grandes movimentos coletivos contra a guerra, a injustiça social, a desigualdade, o racismo e o sexismo.

Hoje, o longo sono pode estar acabando. Os jovens estão se empolgando novamente. Aos poucos. Os milhares que, na Grã-Bretanha, apoiam Jeremy Corbyn como líder trabalhista, fazem parte deste despertar – como aqueles que se alinham em apoio ao senador Bernie Sanders.

Na semana passada na Grã-Bretanha, o mais próximo aliado de Jeremy Corbyn, seu tesoureiro-sombra John McDonnell mandou um governo trabalhista a liquidar dívidas de bancos piratas e, na prática, seguir adiante com a tão dita austeridade.

Nos EUA, Bernie Sanders prometeu apoiar Clinton se ou quando ela fosse nomeada. Também ele tem votado pela utilização da violência dos Estados Unidos contra países quando julgar que isso é “correto”. Ele diz que Obama tem feito “um grande trabalho”.

Na Austrália, há uma espécie de política mortuária na qual patéticos jogos parlamentares são disputados na mídia, enquanto refugiados e indígenas são perseguidos e a desigualdade aumenta, junto com o perigo de guerra. O governo de Malcolm Turnbull acaba de anunciar um chamado orçamento de defesa de 195 bilhões de dólares, um impulso à guerra. Não houve debate. Silêncio absoluto.

O que aconteceu à grande tradição de ação popular direta, não tolhida por partidos? Onde está a coragem, a imaginação e o compromisso exigidos para começar a longa travessia rumo a um mundo melhor, justo e pacífico? Onde estão os dissidentes na arte, nos filmes, no teatro, na literatura?

Onde estão aqueles que estilhaçarão o silêncio? Ou aguardaremos até que o primeiro míssil nuclear seja disparado?

Transcrição editada da palestra de John Pilger na University of Sydney, intitulada Começou uma Guerra Mundial.

Tradução de Edu Montesanti

Fonte: http://johnpilger.com/articles/a-world-war-has-begun-break-the-silence-

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