Funciona feito relógio. Os preços do petróleo estão outra vez em alta, como essa coluna previu que estariam, no início do ano. E a crescente possibilidade de Brexit põe em roda vida os centros de decisão da União Europeia (UE).
Assim sendo, é hora de a Think-tank-elândia dos EUA – da qual faz parte Stratfor, da CIA – renovar a ofensiva de 'noticiário', misturando "análises" de um iminente colapso econômico da Rússia com conclamações a favor de mais pressão pela OTAN contra as fronteiras ocidentais russas.
Há fortes argumentos a favor da noção de que Moscou não precisa de montanhas de investimento ocidental; é possível criar crédito na Rússia. Sobretudo, no ocidente há pouco dinheiro para investimento produtivo; o que abunda é dinheiro ferozmente especulativo. É caso, sempre mais, de dinheiro e crédito tipo fiat – que Moscou não precisa ir até o ocidente, para encontrar.
Desde que a Rússia invista capital para aumentar a produção de bem, o mesmo mecanismo faz aumentar a oferta de dinheiro. Assim sendo, no fim, a inflação será desprezível. Poucos russos ainda se surpreendem com Elvira Nabiullina presidenta do Banco Central e sua política de elevar juros para diminuir o crescimento no investimento, o que pode levar a estrangular a Rússia. Não por acaso, Nabiullina é sempre muito elogiada pela Think-tank-elândia dos EUA e pela City de Londres.
Quanto a que crédito a Rússia usaria para pagar pela indispensável tecnologia importada, a resposta óbvia é "exportações de energia" – sobretudo agora, com o preço do petróleo voltando a subir. E aqui intervém a tentação de redirecionar as exportações de petróleo e gás natural, da União Europeia para China e Ásia –, e a União Europeia que lide como puder com aquela sua eternamente inconsistente "política de energia", que consiste, principalmente, em sempre pôr a culpa na Gazprom.
É mito que alguma redução no investimento externo hoje venha a comprometer grandes projetos na Rússia – inclusive no front de energia; a China vai aumentar seu investimento na infraestrutura russa com muitos projetos conectados às Novas Rotas da Seda e sobretudo à integração geral da Eurásia, como até a Think-tank-elândia dos EUA admite.
A Rússia também pode substituir muitas importações além de tecnologia, construindo suas próprias fábricas, seguindo modelo bem-sucedido dos chineses que permitiu que Pequim se tornasse potência industrial maior que EUA ou a UE.
Nada mais difícil do que encontrar trabalho da Think-tank-elândia dos EUA que examine o colapso econômico dos EUA – onde o desemprego real talvez já tenha chegado a 23%. A inflação também pode ser muito mais alta, porque as estatísticas do Bureau of Labor deixam de fora da cesta básica as mercadorias consumidas pelas classes superiores, cujos preços estão em rápido aumento, e os substitui por itens de consumo popular, sempre mais baratos. Assim, o crescimento da inflação é artificialmente reduzido para cerca da metade dos valores reais no período analisado. Simultaneamente, a – periclitante – classe média do "sonho norte-americano" vai sendo sangrada, o que explica muito do sucesso de Donald Trump.
Chega-se assim a um conjuntura geopolítica na qual os EUA estão sendo esfacelados, politicamente, enquanto a UE é inundada por uma espécie de neoinvasão dos visigodos. E o que já se viu pode ser só o prelúdio. Os políticos que tomam decisões na UE estão tão perdidos no espaço que não podem controlar das fronteiras da "Fortaleza Europa" (e têm de firmar acordo macabro com o Sultão Erdogan); mas, ao mesmo tempo, nada disso impede que a mesma UE esteja sendo arrastada para uma guerra (fria) contra a Rússia.Aqui se vê/lê (ing.) boa explicação para a contradição.
Invocar o artigo 5º, contra um hacker solitário
E lá na Rússia? O que quer o povo russo? Pesquisa do Levada Center realizada há quatro meses ainda oferece excelentes pistas.
52% dos pesquisados preferem economia controlada pelo estado, contra 26% que preferem o turbocapitalismo ocidental e 22% que preferem permanecer com o modelo econômico atual. Principal preocupação entre os russos é a recessão. Ao mesmo tempo, quase 75% apoiam que o Kremlin não faça qualquer concessão ao eixo dos Atlanticistas – assumindo que alguma concessão gerasse afrouxamento das sanções.
Nessa conjuntura entra o St. Petersburg International Economic Forum, que, claro, foi boicotado pela Washington oficial. O que, aliás, não impediu que o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, tenha ido a Moscou para discutir face a face com o presidente Putin o atual impasse UE-Rússia. Ainda que o assunto "sanções per se" não tenha "surgido", os dois lados sabem que é indispensável encontrar uma saída de estilo asiático, com saída honrosa para todos, do atual "relacionamento gélido".
Também é mito que se Moscou vier a fazer "concessões" na Ucrânia e na Síria a atitude seria vista como possibilitadora de mais investimentos ocidentais na Rússia. Esses assuntos são decididos em Washington, não em Bruxelas. O que interessa ao governo dos EUA – e interessa aos dois partidos – é principalmente a OTAN, não a UE.
O que enfurece o governo dos EUA em Washington é que um possível Brexit muito menos que acelerar a desintegração em câmera-lenta da UE (a qual afinal, se desintegrará, de um modo ou de outro), é que reduz seriamente a influência da Grã-Bretanha como cavalo de Troia a favor dos interesses dos EUA em Bruxelas. E que também abrirá uma brecha para que Moscou explore o torvelinho político e tente minar a OTAN de dentro para fora.
Aconteça o que acontecer post-Brexit, a OTAN continuará a inchar junto às fronteiras da Rússia – e além. Considerem o anúncio no início da semana, de que a OTAN considerará também algum ataque de ciberguerra como motivo para invocar o artigo 5º – que fala da "defesa coletiva".
A OTAN decidiu sobre esse upgrade depois de ter 'anunciado' que "hackers russos" teriam atacaram o servidor de e-mails subterrâneo de Hillary Clinton. Na verdade, foi obra deGuccifer 2.0, hacker solitário, que entregou montanha de documentos a Wikileaks; o material, a ser publicado em breve, traz notícias esmagadoramente importantes para a candidata oficial da OTAN à presidência dos EUA.
Imaginem um cenário no qual a OTAN realmente tenha coragem para invocar o Artigo 5º e atacar a Rússia, a qual, na sequência, neutralizará a OTAN com armas eletrônicas de seu próprio arsenal. Pois isso também seria objeto de reengenharia, para ser apresentado como "agressão russa". Até aí, nenhuma novidade.
A Think-tank-elândia dos EUA, o consenso do governo de Washington, os generais da OTAN, todos esses continuarão a só acreditar na própria húbris. Existiria "agressão russa", 'porque' a Rússia estaria 'em colapso'. E a única solução 'é esmagar os russos' com nossa força militar. Boa-sorte na empreitada.
Pepe Escobar, SputnikNews
Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu
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