A coisa ‘tá feia. Os chamados “dividendos da Guerra Fria” parecem passado longínquo. A secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, ao que se sabe, prepara-se para um confronto “cara a cara” [1] com seu contraparte russo, Sergey Lavrov, já iniciada a contagem regressiva para a conferência internacional patrocinada pela ONU, a acontecer em Genebra, no sábado. Clinton vai a São Petersburgo, a caminho de Genebra, para o confronto-cara-a-cara mãe de todos os confrontos-cara-a-cara da era pós-Guerra Fria.
Ótimo que Clinton tenha deixado serviço pronto – um “alvará” cômico – em Washington; antes de partir. Clinton decidiu, com muito aplomb, recomendar que o Congresso dos EUA conceda “alvará” [2] à China, na questão das sanções contra o Irã. Para essa sua “determinação”, Clinton considerou que a China “reduziu significativamente” as importações de petróleo iraniano. Só não se sabe como a secretária Clinton teria chegado a conclusão tão intrigante, que a teria levado à tal “determinação”. Mistério. Boca fechada.
O que importa anotar é que Washington está tirando o corpo, escapando como pode, de um confronto cara-a-cara com Pequim. A vida, às vezes, é muito simples: ninguém morde a mão que o alimenta. A última coisa que os EUA querem é guerra comercial com a China.
Os EUA insistiram o mais que puderam, com a China, sobre as sanções contra o Irã. Os mais altos funcionários do governo Obama, inclusive o Secretário de Tesouro, Timothy Geithner, viajaram a Pequim, tentando defender a causa. A China ignorou-os todos. Insistiu que só respeita sanções determinadas pela ONU. O ministro chinês das Relações Exteriores repetiu, ainda semana passada, que as compras de petróleo iraniano são “legítimas”.
E o que dizem os fatos? Dizem que, sim, nos primeiros meses do ano, as compras russas de petróleo iraniano diminuíram, por causa de uma disputa de preços (que, em seguida, foi resolvida).
Os fatos dizem também que as compras russas de petróleo iraniano, isso sim, aumentaram cerca de 40%, a partir de abril: chegam hoje a mais de meio milhão de barris/dia. Os especialistas preveem que as importações chinesas subirão ainda mais, nos meses de junho e julho.
Mas os EUA preferem fingir que não estão vendo. Nesse episódio bizarro, há boa lição, que a Índia bem faria se aprendesse.
Os especialistas indianos não têm motivo algum para rolar pelo chão em pânico, sofrendo preventivamente as penas do inferno, ante o risco de os EUA amaldiçoarem a Índia por causa da questão iraniana. Os EUA não podem dispensar o mercado indiano – sobretudo pelos altos lucros gerados pelas exportações de armas dos EUA para a Índia. Na Índia, os fabricantes norte-americanos de armas sequer participam de concorrências oficiais!
O fato de que há hoje um ex-secretário de Estado dos EUA acampado em Delhi para defender a causa de Wal-Mart mostra bem de que lado sopra o vento. Em que outro lugar do mundo a indústria Wal-Mart poderia sonhar com abocanhar um mercado de $430 bilhões e mantê-lo abocanhado até o final do século 21?
O “alvará” para que a Índia continue a importar petróleo iraniano (já anunciada em Washington na véspera do Diálogo Estratégico EUA-Índia) foi favor que Washington quis assegurar-se, ela mesma para ela mesma, no exclusivo interesse de Washington.
Gílson Sampaio
sábado, 30 de junho de 2012
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Sanções contra o Irã: EUA “concede alvará” à China
Sanções contra o Irã: EUA “concede alvará” à China
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