Pichação na Acrópole protesta contra as medidas da chanceler alemã, Angela Merkel.
Plano de austeridade passa por crivo nesta quarta-feira; analistas esperam aprovação por margem pequena de votos
Cartazes espalhados por toda a cidade, a cada poste, avisam que Atenas vai parar pelas próximas 48 horas. Manifestações vão tomar conta da praça Omonia, norte da capital grega, e Syntagma, no centro, em protestos contra o pacote de austeridade do FMI (Fundo Monetário Internacional), que foi apresentado ontem ao parlamento e deve ir à votação nesta quarta-feira (07/11).
Desde ontem (05/11) as três linhas de metrô e os diversos trens de superfície, que atendem 1 milhão de passageiros por dia, estão suspensos em virtude da greve de parte dos funcionários do transporte público ateniense. Somente ônibus abarrotados continuam circulando pela cidade para suprir a demanda. A partir de hoje, funcionários do serviço público, estudantes, professores e jornalistas também aderem à greve geral, que vai paralisar o país.
Ao mesmo tempo, a presença policial em Atenas é massiva, com agentes de forças especiais circulando por áreas consideradas críticas, no centro histórico da capital grega. Como reflexo dos efeitos da crise e da imagem de violência dos protestos, a quantidade de turistas é pequena, apesar do bom tempo, com temperatura pelo menos 10 graus acima do frio que já chegou à Europa ocidental.
O elegante aeroporto Eleftherios Venizelos, construído para a Olimpíada de 2004, estava às moscas no último sábado. Restaurantes na área de Monastiraki, próxima à Acrópoles e à área dos protestos, ficaram vazios na noite de ontem e devem permanecer assim pelas próximas 48 horas.
Policiais fecham avenida no entorno do Parlamento.
Para jornalistas, funcionários públicos e estudantes ouvidos pelo Opera Mundi, o clima no país é de completa frustração. “Todo ano que passou é melhor que o próximo”, disse, com sorriso amarelo, um deles. “Talvez em 10 anos melhore alguma coisa”, continuou. Em pesquisa recente do Eurobarometer, 100% dos gregos consideraram a situação econômica péssima. O desemprego entre jovens de 18 a 25 anos está acima dos 50%.
O pacote do FMI, a ser votado pelos deputados gregos, prevê um desembolso de 13,5 bilhões de euros (cerca de R$ 35 bilhões) em troca de medidas de austeridade. Se aprovado, a Grécia se compromete a atender todas as demandas da troika, formada pelo BCE (Banco Central Europeu), Comissão Europeia e FMI.
O documento, com 54 páginas, (veja a íntegra aqui)ordena mudanças na constituição grega para facilitar o pagamento da dívida, a fusão de todos os planos de saúde em um único sistema estatal - com benefícios reduzidos, a fusão de departamentos de ensino das universidades gregas e, entre as medidas mais polêmicas, a privatização de empresas do setor elétrico.
Há pontos bastante específicos na cartilha do FMI, como a abertura de supermercados a produtos pré-embalados e congelados, como carnes, peixes, e queijos, além da flexibilização nos reajustes das mensalidades de escolas primárias e secundárias. Os cortes em benefícios sociais, informa o documento, devem chegar a 395 milhões de euros (cerca de R$ 1 bilhão) em 2013.
Aprovação apertada
Apesar de conter diversos pontos polêmicos, analistas acreditam que a cartilha do FMI deverá ser aprovada no Parlamento grego por uma margem pequena de votos. A bancada do primeiro-ministro Antonis Samaras, do partido de centro-direita Nova Democracia, não contará com os votos de uma sigla de sua frágil aliança, a Esquerda Democrática, o que pode acirrar a disputa.
A cartilha, chamada tecnicamente de terceiro memorando, passará por discussões nesta terça-feira no Parlamento. A votação deve ocorrer na quarta-feira à noite, no auge dos protestos marcados pela Associação de Servidores Públicos (Adedy, na sigla em grego) e pela Frente Militante dos Trabalhadores (Pame, na sigla em grego) na praça Syntagma, a poucos metros dali.
Cartaz da Pame (Frente Militante dos Trabalhadores da Grécia) em frente ao Parlamento.
Após reunião tensa, jornalistas gregos decidem manter greve por 72 horas
Categoria se une a trabalhadores do serviço público grego, que planejam protestos durante votação do pacote do FMIGritos furiosos cortavam a fumaça dos cigarros pelos corredores do Sindicato dos Jornalistas dos Diários de Atenas (Esiea, na sigla em grego). Reunidos e em crise escancarada, representantes dos principais veículos de comunicação do país partiram para a acusações sobre a condução da greve da categoria, que paralisou novamente as redações do país nesta segunda-feira (05/11).
Enquanto repórteres e editores pediam que a greve fosse mantida - por um dia, um mês ou até um ano -, alguns representantes argumentavam que Grécia precisa deles nas ruas para cobrir os protestos que vão tomar conta da capital nesta terça e quarta (06 e 07/11). O momento é crítico, já que o Parlamento grego pode aprovar na quarta o novo pacote do Fundo Monetário Internacional (FMI), imposto pelo Banco Central Europeu e pela Comissão Europeia para a economia do país.
Ao final do dia, a Federação Pan-Helênica de Sindicatos de Jornalistas (Poesy, na sigla em grego), emitiu uma nota sustentando a greve por mais 48 horas, com fim marcado para as 6h de quinta-feira. A Poesy demanda respostas do governo para o que classifica como “perseguição” contra jornalistas, especialmente em casos de funcionários da emissora estatal ERT (Rede Helênica de Notícias).
“A greve é a única coisa a se fazer. Outras formas de protesto se esgotaram faz tempo. Somos trabalhadores como quaisquer outros e temos de defender nossos direitos para ter um futuro digno. Mas com esse pacote, a Troika não vai nos dar uma vida digna”, disse ao Opera Mundi um dos editores da ERT, Sotiris Domatopoulos. “Nossa única chance é lutar agora. Pelo futuro de nossos filhos.”
O epicentro da crise entre os jornalistas é a mudança em seus planos de saúde. Hoje, o profissionais da área pagam uma mensalidade, descontada do salário, pelas vantagens de um serviço privado. Como parte do plano de austeridade, o governo grego pretende fundir o plano de saúde dos jornalistas com o serviço público de saúde, considerado de pior qualidade, sem qualquer compensação pelo dinheiro investido.
“Nosso plano, pelo qual eu paguei a vida inteira, é o melhor de todos. Por que precisamos agora, depois de tanto esforço, ir para o serviço público, que não é bom?”, afirmou ao Opera Mundi a ex-editora de assuntos internacionais da TV Mega, Seva Kammer. Desde 1999 fora das redações, Seva teme perder o auxílio saúde e, ainda, sofrer cortes em sua aposentadoria com um possível corte no piso salarial.
Atualmente, o piso salarial do jornalista grego, hoje, é de 850 euros (cerca de R$ 2,2 mil). Eles temem que o valor caia para 580 euros (R$ 1,5 mil), em paridade com o novo salário mínimo nacional. Para Seva, os jornalistas gregos precisam de “unidade” e “solidariedade” para atravessar a crise.
Esse não é o primeiro blecaute das redações gregas. Desde 2008, quando o país mergulhou na crise, já foram várias paralisações. A última aconteceu na quarta-feira passada e durou 24 horas. Não há sinais de recuo por parte do governo sobre o pacote a ser aprovado.
Opera Mundi
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