Sejamos honestos: os norte-americanos adoram terrorismo. É uma boa desculpa para espionar a rede dos outros, para ler e-mails alheios, para ouvir as conversas telefônicas e roubar informações preciosas para suas grandes corporações. É isso que temos visto nos últimos poucos meses, graças aos documentos vazados para o jornalista Gleen Greenwald por Edward Snowden, ex-prestador de serviços da NSA, a Agência Nacional de Segurança dos EUA. Sob a desculpa de lutar contra o terrorismo, os americanos tem vigiado outros países. Isso sempre aconteceu, mas desde 11 de setembro de 2001 a espionagem da NSA mostrou-se mais escancarada, mirando até mesmo aliados e amigos.
Os EUA e a Índia adoram alardear a sua parceria na luta contra o terrorismo. Nos últimos 12 anos, os dois países fecharam vários acordos e pactos, emitiram inúmeras declarações sobre sua luta conjunta contra os terroristas. Mas os documentos da NSA revelam uma imagem bem diferente: evidenciam que os americanos tem espionado políticos e diplomatas indianos, além de embaixadas e os programas espacial e nuclear do país. Por quê? Como isso ajuda no combate ao terrorismo? O fato é que os americanos estão mais interessados em expandir os seus negócios e a sua influência estratégica na Índia do que em unir seus esforços com os indianos na luta contra o terrorismo. Eles precisam saber o que os políticos indianos estão falando. Isso porque seus planos de ganhar dinheiro na Índia tem enfrentado vários problemas no Parlamento recentemente.
Em 2012, depois que o governo da Índia decidiu permitir a entrada do investimento estrangeiro direto no suculento mercado de varejo do país, houve uma forte oposição de muitos partidos políticos, incluindo alguns aliados da coalizão governamental. O governo quase entrou em colapso. O mercado de varejo indiano é mais do que apetitoso para os americanos: estima-se que movimente cerca de US$ 400 bilhões, com mais de 12 milhões de pequenos comerciantes empregando 40 milhões de pessoas. Depois da China, é o segundo maior mercado de varejo do mundo. Não é a toa que os americanos estão há muito tempo de olho gordo nesse filé.
No ano passado, quando parecia que o projeto de lei que permitia a entrada de investimento estrangeiro direto não passaria no Parlamento, a então secretária de Estado norte-americana Hillary Clinton voou para Kolkata (capital do estado indiano de Bengala Ocidental) para encontrar-se com a ministra-chefe do estado, que tornara-se o principal empecilho à aprovação da polêmica proposta. Mais ainda: a gigante de varejo americana Wal-Mart gastou mais de US$ 10 milhões durante dois anos para fazer lobby para abrir o mercado indiano. Os pequenos comerciantes e partidos políticos se opuseram fortemente ao projeto, alegando que as grandes cadeias de varejo podem destruir milhões de empregos. Com o acesso a todos os telefones, emails e textos de políticos, pode-se imaginar como a NSA foi capaz de ouvir todas as estratégias e planejamentos dos partidos indianos envolvidos nas negociações. Por isso, não é de se surpreender que o projeto de lei – que acreditava-se que seria derrubado no Parlamento – acabou passando no último minuto.
O segundo setor mirado pela Agência Nacional de Segurança norte-americana foi o nuclear. Aqui, de novo, bilhões de dólares estavam em jogo. De novo, o interesse das multinacionais americanas estava na mesa. E, de novo, havia oposição aos interesses americanos por parte de partidos políticos e da sociedade civil organizada.
Em 2008, a Índia e EUA assinaram o Acordo Nuclear Civil, que permitiu às firmas estadunidenses fornecer tecnologia (reatores), peças sobressalentes e combustível para a Índia. O valor do acordo nuclear foi avaliado em US$ 15 bilhões em negócios para as corporações americanas – principalmente a General Eletric e a Westinghouse -, além de um grande número de empregos criados nos EUA. Mas as coisas azedaram quando a Índia aprovou, em 2010, o Ato de Responsabilidade Civil para Danos Nucleares, depois de muita pressão da oposição, de grupos ambientalistas e da opinião pública em geral.
Os americanos ficaram horrorizados pelo fato de que a legislação previa que fornecedores estrangeiros fossem responsabilizados civilmente por qualquer acidente resultado de suas falhas e de defeitos dos equipamentos fornecidos por eles.
Sob pressão do lobby nuclear, o governo dos EUA pressionou o governo indiano que, por sua vez, tentou apagar a cláusula de responsabilidade da legislação. Mas com a mídia e ativistas sociais no seu pescoço, o governo indiano não conseguiu, pelo menos até agora, sumir com a cláusula que incomoda os americanos. Os EUA não fizeram nenhum investimento na Índia até agora no setor nuclear, mesmo com as empresas russas e francesas já tendo começado a trabalhar no país. Novamente, não é nenhuma surpresa que a NSA usava o programa PRISM – que facilita uma extensiva e profunda vigilância sobre comunicações ao vivo e sobre dados armazenados – para interceptar e recolher informações sobre a política nuclear da Índia. Tudo isso para ajudar empresas como a General Eletric.
O terceiro setor que está sob o vigilante radar da Agência de Segurança Nacional dos EUA é o programa espacial indiano, que lançou o seu primeiro foguete em 1963: trata-se de um programa somente para fins “pacíficos”. Hoje, a Índia também usa o desenvolvimento espacial para conquistar uma posição geostratégica mais forte na região e no mundo. A Organização de Pesquisa Espacial Indiana (ISRO) planeja uma missão humana espacial em 2016. O programa espacial indiano tem sido levado a cabo com a ajuda dos russos ou com teconologia própria.
Como os EUA recusam-se a dividir tecnologia com a Índia, não exploram esse imenso mercado. Hoje, por causa do tamanho apetitoso do mercado espacial indiano e das reduções dos contratos do Pentágono, a indústria de defesa dos EUA tenta entrar nesse lucrativo nicho. A Boeing, por exemplo, tem tentado desesperadamente assinar contratos com a agência espacial indiana em projetos ligados à sua missão humana ao espaço. Novamente, não é nenhuma surpresa que o escritório da ISRO no prédio da embaixada indiana em Washington D.C. tenha sido espionada com disposivitos eletrônicos poderosos, como revelaram os documentos secretos da NSA vazados por Edward Snowden.
Toda a espionagem que a NSA tem feito na Índia tem implicações para os negócios e a economia dos EUA. E o que os incomoda mais é a resistência a seus planos por parte de partido políticos e da sociedade civil. Como eles acreditam no lema “se você não está conosco, você é contra nós”, tendem a tratar um país amistoso como a Índia como um inimigo. Um dos documentos secretos da NSA, em uma seção chamada “Amigos, inimigos ou problemas?”, traz uma lista de países que os EUA monitoram de perto, classificados como “desafios” pelos EUA. A lista começa com o Brasil e termina no Egito. A Índia está em terceiro lugar.
Não importa se você é um amigo, inimigo ou um problema para os EUA: a Agência Nacional de Segurança acredita na espionagem sobre todos nós.
Shobhan Saxena é correspondente do jornal indiano The Hindu na América do Sul. Tem escrito uma série artigos sobre espionagem da NSA sobre a Índia em parceria com o jornalista Gleen Greenwald.
Plano Brasil
sábado, 19 de outubro de 2013
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Amigos, inimigos ou problemas? Por que a NSA nos vigia?
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