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quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

EUA e UE estão em Kiev, mas serão os ucranianos a decidir o seu futuro

O comportamento do antigo ministro das Relações Exteriores da Alemanha Guido Westerwelle e da sua atual homóloga da União Europeia Catherine Ashton, que estão de visita a Kiev, parecem no mínimo muito estranhas quando comparado com o habitual comportamento em diplomacia internacional. Em vez de um encontro com os representantes oficiais do governo ucraniano, eles se juntaram às fileiras dos manifestantes antigovernamentais e até os encorajaram a continuar os protestos contra o governo eleito de forma legítima e democrática.

Dois senadores norte-americanos, John McCain e Chris Murphy também inflamavam a multidão, aconselhando-a a não desistir e a exigir uma integração na União Europeia: “A Ucrânia fará a Europa melhor e a Europa fará uma melhor Ucrânia”.

O que têm os senadores americanos a ver com a entrada de um país europeu na UE é um mistério, a menos que nos recordemos que alguns norte-americanos pensam que a Guerra Fria ainda não acabou e que a Rússia continua a ser o inimigo número um que deve ser destruído custe o que custar. Na realidade, se torna evidente que, no episódio da possível entrada da Ucrânia na União Europeia, para muitos políticos norte-americanos e para alguns Estados-membros da UE não tem muita importância se o povo ucraniano estará a favor disso ou contra. O que importa é rodear a Rússia com zonas-tampão e simultaneamente travá-la no seu caminho para a estabilização.

Nesse aspeto, alguns jornalistas que escrevem sobre esse tema também contribuem para difundir desinformação sobre o que se passa na realidade. Em primeiro lugar eles não escrevem que as pessoas que ocupam as praças são apenas uma parte da população e nem sequer representam a sua maioria. A maioria dos habitantes do país ocupa a posição oposta e apoia as decisões do governo.

Também vale a pena referir que os manifestantes são sobretudo movidos pelos sentimentos de protesto contra a crise econômica do país e não por um acordo qualquer com Bruxelas. Já aqueles que exigem a inclusão da Ucrânia na União Europeia alimentam a ilusão de que, com a entrada na Europa, todas as dificuldades econômicas e problemas quotidianos irão desaparecer por milagre de um dia para o outro.

Infelizmente isso não é possível. Na realidade nós, os europeus, não temos hoje nem a capacidade econômica, nem a vontade, de nos ocuparmos dos problemas da Ucrânia, e gastar com ela as somas colossais que a União Europeia não conseguiu dar nem aos gregos, nem aos portugueses.

Esse não é de longe o único mal-entendido. Os erros e desentendimentos surgiram há meses e por parte de todos os intervenientes: da Alemanha e Polônia por um lado, e da Rússia e da própria Ucrânia por outro.

Na Alemanha o partido dos democratas-cristãos desenvolve, já há muito tempo, as suas relações com a oposição ucraniana, especialmente com o político-boxeador Vitali Klitschko. Ele é constantemente recebido na Europa, o seu partido é financiado e recebe promessas de apoio. Na prática a CDU não pode garantir um apoio a Klitschko porque isso iria ameaçar as relações entre a Alemanha e a Rússia, que até agora foram bastante positivas. Não é por acaso que durante a crise atual a chanceler Angela Merkel tem sido muito mais cautelosa que o antigo ministro das Relações Exteriores.

A Polônia, com as suas atávicas fobias anti-russas, sempre tentou pressionar Bruxelas a se imiscuir nos assuntos internos dos países da antiga URSS. Permanentemente receosa do “urso russo”, e provavelmente inspirada por políticos estadunidenses que ainda não esqueceram a Guerra Fria, a Polônia tenta manipular a Europa, sem pensar nem nas vantagens, nem nas consequências, do seu comportamento patológico.

Contudo, os erros mais graves e negativos pelas suas consequências estão sendo cometidos em Kiev e em Moscou. Segundo parece, Yanukovich nunca tencionou verdadeiramente se associar à União Europeia, se dando perfeitamente conta das consequências políticas, econômicas e sociais que daí adviriam para o seu país atrasado. A economia da Ucrânia ainda é tão frágil que uma suavização das barreiras alfandegárias, mesmo que gradual e moderada, iria resultar na falência de muitas empresas locais. Já para não falar nas novas taxas que iriam ser inevitavelmente introduzidas na fronteira com a Rússia, a qual teria de se proteger de um fluxo de importações europeias através da Ucrânia.

Além disso, algumas das leis que a UE iria impor seriam recebidas negativamente tanto pelo Parlamento, como pela maioria da população da Ucrânia. Não se trata só do processo da ex-premiê ucraniana Yulia Tymoshenko (neste caso seria interessante receber da parte de alguns líderes europeus dados que permitam afirmar que a sentença do tribunal ucraniano teve um caráter político e não meramente criminal).

Provavelmente, o início das negociações com Bruxelas foi pensado por Yanukovich com o objetivo tático de demonstrar a Moscou que, se ela começasse a fazer uma maior chantagem econômica, isso iria empurrar a Ucrânia para uma via alternativa, a qual com toda a certeza não seria do agrado do Kremlin.

Então e qual foi o erro russo? Depois de um período idílico depois da eleição de Yanukovich, a Gazprom começou a exigir um aumento dos preços do gás completamente inaceitável para as enfraquecidas finanças ucranianas, ou então que lhe fosse entregue a propriedade de toda a rede de distribuição de gás da Ucrânia.

Foi nessa situação que Yanukovich tentou jogar todas as cartas que tinha na mão. Foi assim que ele provocou toda esta confusão em que agora está metido juntamente com o seu governo. O erro da Rússia foi a tentativa de forçar a mão com objetivos de curto prazo, esquecendo o sentido das proporções. Em vez disso, ela deveria ter usado o soft power, o que criaria muito menos problemas a todos e resultaria numa eficácia mais segura e duradoura das relações bilaterais.

Voz da Rússia

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