Muqtada al-Sadr, em uma rara entrevista concedida a Patrick Cockburn em Najaf, fala de seu medo do Iraque se tornar uma nação a cada dia mais dividida em linhas sectárias.
O futuro do Iraque como país uno e independente está ameaçado pela hostilidade sectária que separa xiitas e sunitas, disse Muqtada al-Sadr, o líder religioso xiita cujas milícias – Exército Mahdi – combateram contra os exércitos dos EUA e da Grã-Bretanha, e que ainda é figura poderosa na política iraquiana. Al-Sadr alerta para o perigo de que “o povo iraquiano seja desintegrado, o governo seja desintegrado, o que tornará mais fácil que potências estrangeiras controlem o país”.
Em entrevista ao jornal The Independent, na cidade santa de Najaf, cerca de 160 quilômetros a sudoeste de Bagdá – a primeira entrevista presencial que dá a um jornal ocidental em mais de dez anos – al-Sadr mostrou-se pessimista quanto ao futuro próximo do Iraque: “O futuro próximo do Iraque é terrível”.
Disse que o que mais o preocupa é o sectarismo que já afeta os iraquianos no plano das ruas; para al-Sadr, “se o sectarismo se disseminar entre o povo, será difícil combatê-lo.” Acredita que a posição que assumiu, contra o sectarismo, já o fez perder apoios entre seus seguidores.
A posição moderada de al-Sadr é importantíssima nesse momento, quando aumentam os confrontos sectários no Iraque – cerca de 200 xiitas foram mortos, só na última semana.
Há 40 anos, Muqtada al-Sadr e líderes religiosos de sua família vêm demarcando as tendências políticas dentro da comunidade xiita no Iraque. A longa resistência contra o governo de Saddam Hussein e, depois dela, a resistência também contra a ocupação pelos EUA, tiveram impacto crucial.
Muqtada al-Sadr ainda é líder muito influente no Iraque, depois de uma carreira extraordinária, ao longo da qual escapou várias vezes de ser assassinado. E inúmeras vezes pareceu que o movimento político que ele comanda, o Movimento Sadrista [ou Saadrista], seria afinal esmagado.
Muqtada tinha 25 anos em 1999, quando seu pai, Mohammed Sadiq al-Sadr, reverenciado clérigo xiita, e dois filhos, irmãos de Muqtada, foram assassinados por esquadrões da morte a serviço de Saddam Hussein, em Najaf. Ele sobreviveu por pouco, e permaneceu em prisão domiciliar em Najaf até 2003, quando a invasão norte-americana pôs fim ao governo de Saddam. Muqtada e seus seguidores tornaram-se a força mais poderosa e influente em várias áreas xiitas do Iraque, primeiro como inimigos de Saddam, em seguida como força de resistência contra a ocupação norte-americana.
Em 2004, o Exército Mahdi, dos sadristas, manteve dois terríveis confrontos militares contra soldados dos EUA em Najaf e em Basra; sustentou longa guerra de guerrilhas contra o Exército Britânico, o qual acabou forçado a entregar o controle da cidade aos guerrilheiros de Muqtada.
Para a comunidade sunita, o Exército Mahdi sempre teve papel central na campanha de assassinatos sectários que atingiu o pico nos anos 2006-7. Muqtada al-Sadr diz que “não fomos nós; havia gente infiltrada no Exército Mahdi, e foram responsáveis pelos assassinatos.” – E acrescenta que, se houvesse guerrilheiros seus envolvidos no assassinato de sunitas, ele seria o primeiro a denunciá-los.
É verdade que, por longo tempo, nesse período, Muqtada al-Sadr não parecia ter pleno controle sobre as forças que agiam como se fosse em nome dele. Até que, afinal, conseguiu dobrá-las. Simultaneamente, o Exército Mahdi estava sendo arrancado de suas antigas fortalezas em Basra e em Sadr, pelo exército dos EUA e forças ressurgentes do governo iraquiano. Perguntado sobre o status presente do Exército Mahdi, Muqtada al-Sadr disse: “Ainda está lá, mas congelado, porque parece que a ocupação acabou. Se a ocupação voltar, as milícias do Exército Mahdi também voltarão”.
Nos últimos cinco anos, Muqtada al-Sadr reconstruiu seu movimento, como um dos principais atores na política do Iraque, com plataforma que é uma mistura de religião xiita, populismo e nacionalismo iraquiano. Depois de exibir força significativa nas eleições gerais de 2010, o partido passou a integrar o atual governo, com seis ministros no Gabinete. Mas Muqtada al-Sadr é extremamente crítico contra o desempenho do primeiro-ministro Nouri al-Maliki nos seus dois mandatos; acusa o governo de ser sectário, corrupto e incompetente.
Falando de Maliki, cujas relações com Muqtada al-Sadr azedam cada dia mais, al-Sadr diz que “talvez não seja o único responsável pelo que está acontecendo no Iraque, mas é quem está no poder”. Perguntado se acha provável que Maliki permaneça como primeiro-ministro, disse: “Acho que se candidatará a um terceiro mandato, mas preferiria que não se candidate”.
Muqtada al-Sadr disse que ele e outros líderes iraquianos já tentaram substituir Maliki no governo, mas ele permaneceu no cargo, por causa do apoio que recebe dos EUA e do Irã. “O mais surpreendente é que EUA e Irã decidam sobre o primeiro-ministro do Iraque” – diz ele. – “Maliki é forte porque é sustentado pelos EUA, Grã-Bretanha e Irã”.
Al-Sadr critica, sobretudo, o modo como o governo está lidando com a minoria sunita, que perdeu o poder em 2003; para ele, os sunitas estão sendo marginalizados, e suas demandas são ignoradas. Entende que o governo iraquiano deixou passar a oportunidade de fazer uma conciliação com os sunitas, cujas manifestações públicas começaram em dezembro passado para exigir mais direitos civis e o fim das perseguições.
“Minha opinião pessoal é que, agora, já é tarde demais para atender àquelas demandas [dos sunitas], depois que o governo – que os manifestantes veem como governo xiita – passou tanto tempo sem lhes dar atenção” – diz ele. Perguntado sobre como os xiitas comuns (a grande maioria dos mil mortos pelas bombas da al-Qaeda, já há um mês, são xiitas) reagiriam, Muqtada al-Sadr disse: “Eles têm de entender que não estão sendo atacados por sunitas. Estão sendo atacados por extremistas. Estão sendo atacados por potências de fora do Iraque”.
Para sl-Sadr, o problema no Iraque é que os iraquianos, como um todo, estão traumatizados por quase meio século ao longo do qual viveram “um ciclo constante de violência: Saddam, a ocupação norte-americana, a 1ª Guerra do Golfo, a 2ª Guerra do Golfo, depois a guerra da ocupação, depois a resistência – isso levou a uma mudança na psicologia dos iraquianos”.
Explicou que os iraquianos cometeram o erro de tentar resolver um problema, criando outro pior, como ter contado com os EUA para derrubar Saddam Hussein, o que gerou o problema da ocupação norte-americana. Compara os iraquianos a “alguém que descobre um rato em casa e procura um gato para matar o rato; depois, quer livrar-se do gato, e procura um cachorro. Depois, para livrar-se do cachorro, compra um elefante, quer dizer, voltou a pôr o rato dentro de casa”.
Perguntado sobre o melhor modo de os iraquianos lidarem com o rato, al-Sadr disse: “Usar, não gato nem cachorro, mas unidade nacional; rejeitar o sectarismo, abrir a cabeça, rejeitar o extremismo”.
Um dos principais temas da abordagem de al-Sadr é promover o Iraque como estado-nação independente, capaz de tomar decisões que visem aos seus próprios interesses. Dada a hostilidade crescente contra a ocupação por EUA e Grã-Bretanha, que os ocupantes sejam responsabilizados por muitos dos atuais tormentos do Iraque. Até que isso seja feito, nem ele nem ninguém de seu movimento se reunirão com funcionários norte-americanos ou britânicos. Mas al-Sadr também é hostil à intervenção pelo Irã, nos negócios iraquianos. Diz ele: “Recusamos todos os tipos de intervenção de forças externas, sejam contra ou a favor de interesses do Iraque. O destino dos iraquianos deve ser decidido exclusivamente pelos iraquianos”.
Vê-se uma mudança na posição de um homem que foi demonizado pelos EUA e Grã-Bretanha como joguete nas mãos do Irã. A força do movimento sadrista sob comando de Muqtada al-Sadr e de seu pai – e a capacidade de enfrentar inimigos poderosos e de sobreviver a derrotas terríveis – deve muito ao fato de ele combinar um revivalismo xiita com ativismo social e nacionalismo iraquiano.
Por que tantos membros do governo do Iraque são tão ineficazes e corruptos? Para al-Sadr, “porque competem entre eles para pôr as mãos na maior fatia do bolo, em vez de competirem para mais bem servir ao povo”.
Perguntado sobre por que o Governo Regional do Curdistão foi mais bem-sucedido em termos de segurança e de desenvolvimento econômico que o resto do Iraque, al-Sadr entende que houve menos roubo e corrupção entre os curdos; e talvez “porque eles amam a própria etnicidade e a região onde vivem”. Se o governo tentasse marginalizá-los, talvez exigissem a própria independência: “Massoud Barzani [presidente do Governo Regional do Curdistão] disse-me que: “se Maliki nos pressionar demais, exigiremos a independência”.
Ao final da entrevista, Muqtada al-Sadr perguntou-me se não tinha medo de entrevistá-lo; e se a entrevista levasse o governo britânico a considerar-me terrorista? Perguntou se o governo britânico ainda supunha que tivesse “libertado” o povo iraquiano. E comentou que talvez devesse processar o governo, pelas mortes causadas pela ocupação britânica.
Blog Anti nova Ordem mundial
quarta-feira, 4 de dezembro de 2013
Home
Unlabelled
Muqtada al-Sadr: “No Iraque, o Futuro Próximo é Terrível"
Muqtada al-Sadr: “No Iraque, o Futuro Próximo é Terrível"
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Author Details
Templatesyard is a blogger resources site is a provider of high quality blogger template with premium looking layout and robust design. The main mission of templatesyard is to provide the best quality blogger templates which are professionally designed and perfectlly seo optimized to deliver best result for your blog.
Nenhum comentário:
Postar um comentário