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quinta-feira, 12 de junho de 2014

Representante da ONU no Iêmen: a democracia não pode ser trazida de fora

Sana, capital do Iêmen, foi, recentemente, alvo de um novo ataque dos terroristas da Al-Qaeda. A luta contra o terrorismo no Iêmen continua com êxitos e fracassos.

Não obstante, em comparação com outros países da “primavera árabe”, a situação no Iêmen não está má. O país evitou uma guerra civil que parecia inevitável. Os problemas políticos são resolvidos através do diálogo nacional, organizado pela ONU.

O Iêmen é talvez o único dos países em crise do Médio Oriente onde a ONU trabalhou de forma extremamente eficaz. Jamal Benomar, enviado especial do secretário-geral da ONU para o Iêmen, contou, numa entrevista exclusiva à Voz da Rússia, como foi possível conseguir isso e poderá a experiência iemenita ajudar na solução de situações de crise noutros países.

Voz da Rússia: Não obstante as dificuldades existentes, a situação no Iêmen é, hoje, visivelmente melhor do que em alguns outros países da “primavera árabe”. Talvez também porque, nesse país, a comunidade internacional trabalha de forma mais eficaz. Qual a razão do êxito?

Jamal Benomar: A experiência iemenita é, hoje, algo de exclusivo no mundo árabe. No país ocorre um processo de reconciliação nacional através do diálogo entre diferentes forças nacionais. Elas chegaram a acordo sobre os prazos do período de transição e sobre a divisão de poderes. Segundo esses acordos, só os iemenitas devem realizar essas reformas, sem qualquer ditado externo.

A ONU foi a única organização externa autorizada a participar nesse processo. Eu, pessoalmente, enquanto representante especial do secretário-geral da ONU para o Iêmen, participei nessas conversações que começaram em novembro de 2011, mas a minha missão foi apenas prestar assistência aos próprios iemenitas.

O importante é que essa assistência foi necessária. Os iemenitas compreenderam que devem evitar a guerra civil. Os líderes políticos revelaram coragem, souberam começar as conversações e chegar a acordo sobre um plano de normalização.

Como resultado, o Iêmen tornou-se, por enquanto, o único país onde as partes começaram o diálogo nacional e elaboraram um roteiro concreto para o período de transição. Além disso, e isto é importante, com prazos precisos. O período preparatório, por exemplo, durou seis meses. O processo de diálogo nacional em si demorou mais 10 meses.

Voz da Rússia: Qual o papel do Conselho de Segurança da ONU no processo de normalização no Iêmen?

Jamal Benomar: Uma das causas do êxito no Iêmen é a unanimidade no Conselho de Segurança. Os seus membros discordam sobre muitas questões, mas, quanto ao Iêmen, existiu consenso. Além disso, a ONU entrou a tempo, ou seja, no início da crise. A Rússia também desempenhou aí um importante papel positivo. Em outubro de 2011, foi aprovada a primeira resolução do CS sobre o Iêmen, seguida da segunda, e ambas bastante duras. O CS fala a uma só voz com o Iêmen.

Voz da Rússia: Para a estabilização no Iêmen contribuiu também o fato de terem sido dado garantias de segurança ao anterior dirigente e ao seu séquito. Ao contrário, por exemplo, da Líbia, onde o Ocidente emitiu imediatamente uma ordem de detenção de Kadhafi. Como foi possível que fosse aprovado esse esquema sensato?

Jamal Benomar: Esse tema foi discutido durante os 10 meses em que decorreu a conferência para o diálogo nacional. Além disso, no diálogo participou também o antigo partido dirigente.

Durante os períodos de transição, é sempre um tema importante e complexo a forma como tratamos com o passado. Foi acordado que era necessário investigar fatos concretos pelos quais as vítimas exigiam compensações. Era preciso decidir como ajudá-las.

A experiência do Iêmen mostrou que os conflitos podem ser realizados por via pacífica, que as partes do conflito podem chegar a acordo em conversações, que não se pode trazer a democracia do exterior artificialmente, que as próprias forças locais devem tomar uma decisão. E, finalmente, que a comunidade internacional pode desempenhar um papel eficaz.

Voz da Rússia: Essa abordagem pode ser útil para a solução de outros conflitos, por exemplo, na Síria?

Jamal Benomar: Não há receitas universais. Mas, em qualquer dos casos, o Iêmen é, sem dúvida, um exemplo de solução de um conflito por via pacífica e essa experiência deve ser estudada. A experiência do Iêmen é, por enquanto, uma exceção, mas útil para a solução de outros conflitos.

Voz da Rússia: O Iêmen precisa de dinheiro para a construção de um novo estado. Mas, como é sabido, os países ricos não cumpriram as promessas de ajuda material ao Iêmen.

Jamal Benomar: É verdade, em 2012, em Riad reuniu-se a conferência de “Amigos do Iêmen”, onde foi prometida ajuda. Mas, sinceramente, apenas foi concedido 35% do prometido. A situação econômica no Iêmen é muito difícil. Metade da população passa fome. Esperemos que os encontros seguintes dos “Amigos do Iêmen” ajudem a mudar alguma coisa. O Iêmen necessita muito de ajuda econômica.

Voz da Rússia: O terrorismo é outro problema do Iêmen. E é precisamente nesta esfera que os avanços positivos não são muito visíveis, não obstante as operações aéreas periódicas com a utilização de drones americanos. O que é preciso para melhor a situação?

Jamal Benomar: O grupo Al-Qaeda na Península Arábica constitui um grande problema para o Iêmen. Isso ameaça a segurança de toda a região e, sem exagero, de todo o mundo. Em 2011, por exemplo, os terroristas da Al-Qaeda conquistaram várias províncias do Iêmen. O novo presidente, Abd Rabbuh Mansur Hadi, teve mesmo de organizar uma operação militar para os expulsar de lá.

Não obstante, o problema da Al-Qaeda no Iêmen continua a existir. Até na capital Sana ocorrem periodicamente explosões, assassinatos. Para lutar contra o terrorismo é preciso não só esperar ajuda externa, mas também tomar medidas para o melhoramento da situação econômica e social. E para isso é necessário elaborar um plano nacional para livrar o Iêmen do terrorismo.

Voz da Rússia

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