A guerra de sanções entre o Ocidente e a Rússia deixou de ser unilateral. Moscou deu os primeiros “tiros” de resposta e deu a entender claramente sua disposição de continuar no mesmo âmbito. O princípio bíblico de “a qualquer que te dá na face direita, volta-lhe também a outra” não é muito aplicável às relações interestatais. Portanto, tudo o que está acontecendo pode ser chamado de bastante lógico, esperado, e até mesmo inevitável.
Mas essa lógica e inevitabilidade do que está acontecendo não o torna menos triste. Dizem que obuses não caem duas vezes no mesmo lugar. Será mesmo? Agosto de 1914. AEuropa, inesperadamente para si mesma, encontra-se em estado de guerra total. Agosto de 2014. A Europa, inesperadamente para si mesma, mais uma vez encontra-se em estado de guerra, embora apenas econômica.
Concordo que guerra econômica e guerra no sentido direto da palavra são duas coisas completamente diferentes. Mas, pensando bem, estes dois tipos de guerra diferem apenas no grau de destrutividade.
O gabinete de ministros russo assegura: o embargo de importação de alimentos de países que impuseram sanções contra a Rússia, será exclusivamente benéfico para a nossaeconomia e os nossos consumidores comuns. Estou disposto a dar ao nosso governo credibilidade por tempo limitado nesta questão. E quanto à tese de que a Rússia está muito dependente de alimentos importados, eu concordo em 100%. Mas isso não muda o principal. A troca de golpes de sanções é mutuamente prejudicial e mutuamente contraproducente. Essa troca de golpes introduz um elemento substancial de caos nos mecanismos bem lubricados de relações econômicas. Ela estraga as relações entre os povos, faz as vidas de pessoas comuns menos confortáveis e menos previsíveis.
Por isso eu não quero que “a grande guerra de sanções de 2014” dure tanto quanto aquela guerra total que começou em 1914. Nós – todas as partes no conflito atual – devemos aprender com os erros do passado. Nós não devemos pisar o mesmo arado de novo. Estamos todos bem cientes de que, mais cedo ou mais tarde, o conflito atual entre a Rússia e o Ocidente acabará em compromisso. Então para quê prolongar um processo que é desagradável para todos os participantes? Porquê deixar o compromisso para amanhã ou o dia seguinte, se é possível consegui-lo hoje?
Eu suspeito que com esta tese concordaria a maioria das figuras políticas na Rússia e na UE, e até mesmo alguns políticos em Washington. Mas depois tudo se deparará com “pequenos detalhes” que realmente não são nada pequenos – as condições desse compromisso. A natureza humana é tal que cada uma das partes do conflito anseia um compromisso principalmente em seus próprios termos. E isso, em caso de posições diametralmente opostas das partes, adia o alcançamento de um acordo – às vezes por um longo tempo, e às vezes indefinidamente.
A Rússia não desiste. Estamos acostumados a privação e dificuldades. Estamos acostumados a autossacrifícios em nome daquilo que acreditamos ser certo. Acho que o Ocidente tão pouco vai desistir. No passado, os Estados Unidos e a Europa Ocidental já realizaram um turno de Guerra Fria contra o nosso país. E não devemos nos iludir: se não houver outras opções, o Ocidente irá para o segundo turno de olhos abertos.
Em quê então eu baseio o meu otimismo? No senso comum. Na relutância em repetir erros e cálculos incorretos do passado. No senso de autopreservação. Na curiosidade intelectual. Em que os altos princípios morais habitualmente declarados pelos políticos ocidentais não são palavras vazias pelo menos para alguns deles.
A Europa deve tentar compreender – precisamente compreender e não aceitar – a lógica da posição russa. Até agora, a UE se recusa categoricamente a fazê-lo. Os políticos europeus nem sequer tentaram abandonar seus preconceitos e analisar imparcialmente as causas da grave como nunca crise política na Ucrânia. Uma análise séria foi substituída pelo seguimento cego dos passos da posição norte-americana.
Isto levou a uma situação que é completamente anormal mesmo do ponto de vista não político, mas moral. Em pleno coração da Europa, o exército de um Estado moderno, ignorando completamente as vítimas entre a população civil, está conduzindo uma operação militar em grande escala contra os seus próprios cidadãos, que não tem sentido absolutamente nenhum, seja qual for o ponto de vista para ela.
Você diria: algo parecido foi observado no curso da guerra civil na Iugoslávia no final do século XX. Sim, foi observado. Mas na altura o decorrer dos eventos trágicos era do conhecimento de quase todos na Europa. Hoje isso não é assim. A população civil de Donbass esta sendo impiedosamente destruída. E os cidadãos comuns da Europa não sabem praticamente nada sobre isso. Sua imprensa e seus políticos estão tentando “não enfatizar isso”.
Será que tal estado de coisas coincide com valores europeus? Duvido fortemente. Este é um abuso dos ideais europeus, o seu completo desrespeito, seu oposto completo. Esta situação é intolerável. Esta situação deve ser corrigida – e corrigida pelos próprios políticos europeus. Quando você faz uma injustiça gritante e isso não lhe custa nada, é uma coisa. Quando você faz uma injustiça gritante e paga caro por ela, é outra coisa completamente diferente.
Será que se realizarão estas minhas esperanças? Não faço a menor ideia. A presença de uma potencial saída do impasse não quer dizer que esta saída será necessariamente utilizada. É muito provável a versão oposta – a saída por algum tempo será “emparedada”, camuflada ou mesmo esquecida.
A dura resposta russa às sanções ocidentais é uma potencial fonte de muitos problemas. Mas é também uma fonte potencial de muitas soluções positivas e de mudanças. O conflito entre o Ocidente e a Rússia por causa da Ucrânia foi longe demais. Este conflito já não pode ser parado com soluções simples. Está na hora de procurar complexas.
Voz da Rússia
Leia mais: http://portuguese.ruvr.ru/news/2014_08_12/O-que-quer-conseguir-a-R-ssia-com-san-es-4333/
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