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segunda-feira, 24 de novembro de 2014

“É oficial: EUA é o maior Estado terrorista do mundo e se orgulha disso”


Avram Noam Chomsky

Essa deveria ser o título da história principal do “The New York Times” de 15 de outubro, que foi intitulada mais polidamente de “Estudo da CIA sobre Ajuda Secreta Alimenta Ceticismo a Respeito de Ajuda aos Rebeldes Sírios”.

O artigo tratava de uma análise da CIA das recentes operações secretas dos Estados Unidos para determinar sua eficácia. A Casa Branca concluiu que, infelizmente, os sucessos eram tão raros que um repensar da política era necessário.

O presidente Barack Obama foi citado no artigo como tendo dito que pediu à CIA que realizasse a análise, para descobrir casos de “financiamento e fornecimento de armas a uma insurreição em um país que tenham funcionado. E ela não conseguiu encontrar nenhum”. Assim, Obama exibiu relutância em prosseguir com esses esforços.

O primeiro parágrafo do artigo do “Times” cita três exemplos de “ajuda secreta”: Angola, Nicarágua e Cuba. Na verdade, cada caso foi uma grande operação terrorista conduzida pelos Estados Unidos.

Angola foi invadida pela África do Sul, que, segundo Washington, estava se defendendo de um dos “grupos terroristas mais notórios” do mundo –o Congresso Nacional Africano de Nelson Mandela. Isso foi em 1988.

Na época, o governo Reagan estava virtualmente sozinho em seu apoio ao regime do apartheid, até mesmo violando as sanções do Congresso ao aumentar o comércio com seu aliado sul-africano.

Enquanto isso, Washington se juntava à África do Sul no fornecimento de apoio crucial ao exército terrorista Unita, de Jonas Savimbi, em Angola. Washington continuou fazendo isso mesmo depois de Savimbi ter sido esmagadoramente derrotado em uma eleição livre cuidadosamente monitorada e da África do Sul ter retirado seu apoio. Savimbi era um “monstro cuja sede por poder levou uma miséria terrível ao seu povo”, nas palavras de Marrack Goulding, o embaixador britânico em Angola.

As consequências foram horrendas. Uma investigação da ONU em 1989 estimou que os ataques sul-africanos levaram a 1,5 milhão de mortes nos países vizinhos, sem contar o que estava acontecendo dentro da própria África do Sul. Forças cubanas finalmente derrotaram os agressores sul-africanos e os levaram a se retirar da Namíbia ilegalmente ocupada. Os Estados Unidos continuaram apoiando sozinhos o monstro Savimbi.

Em Cuba, após o fracasso da invasão na Baía dos Porcos em 1961, o presidente John F. Kennedy lançou uma campanha assassina e destrutiva para levar “os terrores da Terra” a Cuba –as palavras de um associado próximo de Kennedy, o historiador Arthur Schlesinger, em sua biografia semioficial de Robert Kennedy, que foi encarregado pela condução da guerra terrorista.

As atrocidades contra Cuba foram severas. Os planos eram para que o terrorismo culminasse em um levante em outubro de 1962, que levaria a uma invasão americana. Agora, estudos acadêmicos reconhecem que esse foi um dos motivos para o premiê russo Nikita Khruschov ter instalado mísseis em Cuba, iniciando uma crise que chegou perigosamente perto de uma guerra nuclear. O secretário de Defesa americano, Robert McNamara, reconheceu posteriormente que se ele fosse um líder cubano, ele “esperaria uma invasão americana”.

Os ataques terroristas americanos contra Cuba continuaram por mais de 30 anos. O custo para os cubanos foi severo, é claro. Os relatos das vítimas, pouco ouvidos nos Estados Unidos, foram relatados em detalhes pela primeira vez em um estudo de autoria do acadêmico canadense Keith Bolender, “Voices From the Other Side: an Oral History of Terrorism Against Cuba”, em 2010.

O preço da longa guerra terrorista foi ampliado por um embargo esmagador, que continua até hoje, em desafio ao mundo. Em 28 de outubro, a ONU, pela 23ª vez, endossou a “necessidade de encerrar o bloqueio econômico, comercial e financeiro imposto pelos Estados Unidos contra Cuba”. A votação foi de 188 a 2 (Estados Unidos e Israel), com abstenção de três dependências dos Estados Unidos no Pacífico.

Atualmente há alguma oposição ao embargo nos altos escalões nos Estados Unidos, como relata a “ABC News”, porque “não é mais útil” (citando o novo livro de Hillary Clinton, “Hard Choices”). O acadêmico francês Salim Lamrani analisa os custos amargos para os cubanos em seu livro de 2013, “The Economic War Against Cuba”.

A Nicarágua nem precisaria ser mencionada. A guerra terrorista do presidente Ronald Reagan foi condenada pelo Tribunal Internacional de Justiça, que ordenou aos Estados Unidos que encerrassem seu “uso ilegal de força” e que pagasse indenizações substanciais.

Washington respondeu com uma escalada da guerra e vetando uma resolução do Conselho de Segurança da ONU de 1986 exigindo que todos os Estados –isto é, os Estados Unidos– cumprissem a lei internacional.

Outro exemplo de terrorismo será comemorado em 16 de novembro, o 25º aniversário do assassinato de seus padres jesuítas em San Salvador, por uma unidade terrorista do exército salvadorenho, armado e treinado pelos Estados Unidos. Por ordem do alto comando militar, os soldados invadiram a universidade jesuíta para assassinar os padres e quaisquer testemunhas –incluindo a empregada deles e a filha dela.

Esse evento culminou as guerras terroristas americanas na América Central nos anos 80, apesar dos efeitos ainda estarem nas primeiras páginas dos jornais de hoje, nas reportagens sobre os “imigrantes ilegais”, fugindo em parte pelas consequências daquela carnificina, e sendo deportados dos Estados Unidos para sobreviverem, se puderem, nas ruínas de seus países de origem.

Washington também desponta como campeão mundial da geração de terror. O ex-analista da CIA, Paul Pillar, alerta sobre o “impacto gerador de ressentimento dos ataques americanos” na Síria, que podem induzir ainda mais as organizações jihadistas Jabhat al-Nusra e o Estado Islâmico a “repararem sua ruptura no ano passado e fazerem campanha em conjunto contra a intervenção americana, ao retratá-la como uma guerra contra o Islã”.

Essa já é uma consequência familiar das operações americanas, que ajudaram a espalhar o jihadismo de um canto do Afeganistão para grande parte do mundo.

A manifestação atual mais temível do jihadismo é o Estado Islâmico (EI), que estabeleceu seu califado assassino em grandes áreas do Iraque e da Síria.

“Eu acho que os Estados Unidos são um dos principais criadores dessa organização”, relata o ex-analista da CIA, Graham Fuller, um proeminente comentarista sobre a região. “Os Estados Unidos não planejaram a formação do EI”, ele acrescenta, “mas suas intervenções destrutivas no Oriente Médio e a Guerra no Iraque foram as causas básicas do nascimento do EI”.

A isso nós podemos acrescentar a maior campanha terrorista do mundo: o projeto global de Obama de assassinato de “terroristas”. O “impacto gerador de ressentimento” desses ataques com drones e forças especiais também já é bem conhecido, de modo que não exige comentário adicional.

Trata-se de um retrospecto para ser contemplado com certo espanto.

Plano Brasil

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