Apoio irrestrito dos EUA a Israel deixa diplomatas americanos de mãos atadas
Por Stephen M. Walt – Texto do Foreign Policy
Tradução, adaptação e edição – Nicholle Murmel
Tradução, adaptação e edição – Nicholle Murmel
Nota DefesaNet: o autor faz referência à reportagem de Jeffrey Goldberg, T”he Crisis in U.S.-Israel Relations Is Officially Here”, publicada pelo The Atlantic no dia 28 de outubro.
Diplomata americano teria anonimamente chamado o primeiro ministro israelense, Benjamin Netanyahu de covarde em artigo do The Atlantic, gerando "crise" nas relações EUA-Israel
Estive relutante em dizer algo sobre a tempestade em copo d’água das últimas semanas – entenda-se o faniquito de Israel acerca do “quem me chamou de covarde” – porque o faniquito em si é de pouca relevância estratégica.
Em 2006 e 2007, eu e John Mearsheimer argumentávamos que os Estados Unidos e Israel se beneficariam bem mais se mantivessem uma relação diplomática normal em vez de “especial” – especial no sentido de os EUA apoiarem Tel Aviv não importa o que eles façam.
De lá para cá, nada que contrariasse nosso argumento aconteceu, é por isso que mais e mais pessoas começaram a manifestar suas prórpias preocupaçãoes em torno do lobby israelense e sua influência danosa na política americana. Eu tenho pouco a acrescentar às análises prévias, por isso que não tenho escrito muito sobre esse assunto recentemente.
Ainda assim, esse último bafafá é interessante pelo que ele revela sobre as regras do jogo da política externa nos dois países. Não estamos falando de um deslocamento ideológico significativo nem nada do tipo. Em vez disso, o marco zero da confusão foi um atigo no Atlantic, que citava autoridades americanas dizendo coisas não muito agradáveis sobre o Primeiro Ministro israelense, Benjamin Netanyahu.
O parágrafo que abria o texto incluía uma descrião anônima de Netanyahu como “covarde”, no sentido de que o premiê teria aversão demais a tomar riscos e é receoso de ações militares contra o Irã. Foi só isso mesmo.
Infelizmente, essa birra menor sugere que estamos lidando não com uma potência madura nem uma nação-cliente grata, mas sim com um bando de crianças imaturas que andam precisando de supervisão de adultos. Ou mesmo ficar de castigo.
Para começar, se isso é uma “crise” nas relações EUA-Israel, - conforme alardeia a manchete do Atlantic – com certeza é uma crise bem curiosa.
Normalmente, o termo se refere à colisão de interesses contrários envolvendo perigos reais, como na Crise de Julho que levou à Primeira Guerra Mundial, ou a Crise dos Mísses de Cuba, em 1962. Mas há pouca ou nenhuma substância nessa escaramuça – Os Estados Unidos ainda dão ao rico e poderoso Estado de Israel bilhões de dólares em auxílio militar e econômico todo ano, ainda vedemos a Tel Aviv alguns dos aramentos mais sofisticados do arsenal americano, e autoridades do governo continuam a dar cobertura diplomática nas Nações Unidas e outros fóruns internacionais.
Washington ficou ao lado de Israel até mesmo quando Gaza foi bombardeada novamente há alguns meses, apesar das preocupações oficias acerca da coerência e do senso moral por trás das ações israelenses. E oficiais da Casa Branca agora estão apaziguando os ânimos e reafirmando a “efetiva parceria” entre os dois países e seus governantes.
Em vez de uma crise real tudo o que temos aqui são provas de que algumas autoridades americanas não pensam grande coisa de Benjamin Netanyahu, e ao menos uma dessas pessoas usou uma linguagem mais ácida para se expressar.
Eis uma “surpresa”: muitos politicos estadunidenses – entre eles Bill Clinton – não gostam muito de Netanyahu, e por motivos bastante óbvios. Ele é convencido, pretensioso, bombástico, tem pouco respeito por fatos (o que é bem comum entre líderes) e às vezes trata autoridades americanas com desprezo.
Caso você seja Barak Obama, John Kerry ou algum de seus assistentes, e venha trabalhando extra para tentar um acordo de paz que salve Israel da política suicida de assentamentos no território palestino, é de se esperar um tanto de irritação e desgosto quando você tem zero ajuda de Netanyahu e seus aliados.
Mas mesmo que a irritação dos EUA seja totalmente justificada, o que pode ter levado um funcionário de alto (ou médio) escalão a fazer esse tipo de comentário para jornalistas? O que a fonte anônima esperava conseguir? Ele ou ela esperava consolidar mais oposição ao acordo nuclear do Irã entre os diversos testas-de-ferro de Israel no senado americano? A explicação mais provável é que se trata de pirraça elevada a status duvidoso de notícia através da vulgaridade.
Ainda assim, vamos dar um passo para trás e observar o significado de todo esse incidente. Há como fazer com que representantes seniores de uma grande potência se comportem? Conversa fiada pode tirar a diplomacia do rumo, e se houve algum propósito por trás dessa declaração, foi mal pensado.
Caso tenha sido apenas uma forma petulante de vingança verbal de um funcionário frustrado, então se trata de incompetência profissional. Autoridades de alto escalão são nomeadas para projetar os interesses nacionais no exterior, e isso significa manter as irritações pessoais para si até a hora de escrever suas memórias.
Além disso, a ideia de que Netanyahu é um covarde que não tem coragem de partir para cima do Irã parte do princípio de que Israel tinha, desde o começo, uma opção militar viável. Na verdade, a hostilidade do primeiro-ministro para com Teerã sempre foi um blefe.
Isso porque faltam a Tel Aviv meios militares para um ataque estrategicamente relevante à infrastrutura nuclear iraniana. Claro que a Força Aérea israelense poderia causar danos à planta nuclear, mas não há aeronaves nem capacidade de destruição dos bunkers para eliminar toda a capacidade de enriquecimento de combustível.
A situação atual com o Irã não é nem de perto como a invasão do reator de teste Osirak no Iraque em 1981, nem o ataque a um reator atômico na Síria em 2007, que envolveu bomberdeio de uma única área vulnerável.
Um ataque israelense pode atrasar o avançado programa atômico iraniano em alguns meses, talvez uma no, mas tabém encorajaria os líderes de Teerã a realmente iniciar os trabalhor para a construção de uma bomba. E é por isso que membros importantes da segurança nacional de Israel vieram a público com suas próprias preocupações acerca das ameaças vazias de Netanyahu.
Alguns “Doutores Fantásticos” de Tel Aviv podem ter acreditado em algum momento que um ataque instigaria os EUA a terminarem o serviço, mas os riscos eram gigantescos, e tanto Bush quanto Obama deixaram claro que não entrariam nessa aposta.
Resumindo, não atacar o Irã não foi demonstração de covardia do Primeiro Ministro israelense, mas uma decisão estratégica e de bom-senso. A retórica belicosa de Israel tinha a finalidade de desviar a atenção da questão mais grave dos assentamentos em território palestino, mantendo Terrã como “inimigo número um”, além de convencer Washington a impor sanções mais severas na esperança de conseguir um acordo melhor acerca do programa nuclear iraniano. Mas um ataque efetivo nunca foi uma possibilidade.
A fanfarronice de Netanyahu pode ter enganado jornalistas como Jeffrey Goldberg, do Atlantic – que já havia alardeado falsas possíveis ofensivas israelenses em outras ocasiões – mas observadores coerentes provavelmente não se deixaram levar por toda a tolice.
No fim das contas, esse pequeno incidente de comunicação confirma os efeitos nada saudáveis da “relação especial” em si. A triste verdade é que autoridades americanas ainda não podem manifestar abertamente o que pensam sobre o comportamento do governo de Israel, ou o que realmente pensam sobre a diplomacia entre Washington e Tel Aviv.
A menor das críticas gera abusos e, é claro, quem aspira a um alto cargo diplomático tem que fazer juras e repudiar publicamente qualquer crítica anterior a fim de ser nomeado - pergunte a Samantha Power e Chuck Hagel como o processo funciona. Ironicamente, são as lideranças americanas que são covardes diante dessas questões, não Netanyahu.
Toda a confusão causada pelo artigo do Atlantic nos lembra de que dois páises nunca têm os mesmos exatos interesses, não importa o que políticos americanos digam em seus discursos tendenciosos nas conferências anuais do American-Israeli Public Affairs Committee. Os EUA querem uma solução com dois Estados para o conflito Israel-Palestina, e um mecanismo de dissuasão significativo contra o Irã. O governo de Netanyahu se opõe nos dois casos, e esse abismo entre os parceiros deve se tornar mais aparente com o tempo.
Esse episódio mostra ainda o quanto as autoridades do alto escalão americano gostariam de pressionar Israel a mudar sua atitude. Uma potência madura que aspira à liderança global deveria fazer exatamente isso, mas os diplomatas são impedidos de dar esse passo óbvio por conta do resistente coágulo político representado pela AIPAC e outros grupos no lobby.
Quando falam em público ou oficialmente para a imprensa, os diplomatas precisam fingir que a “relação especial” é uma maravilha, mesmo que seja óbvio até para quem acompanha casualmente que não é bem assim. Mas quando funcionários bem intencionados são bloqueados, insultados e forçados a praticar auto-censura repetidamente, a frustração é inevitável, e é inevitável também destilar um pouco dela em público. Não é nada útil nem profissional, mas é completamente humano.
Em 2006 e 2007, eu e John Mearsheimer argumentávamos que os Estados Unidos e Israel se beneficariam bem mais se mantivessem uma relação diplomática normal em vez de “especial” – especial no sentido de os EUA apoiarem Tel Aviv não importa o que eles façam.
De lá para cá, nada que contrariasse nosso argumento aconteceu, é por isso que mais e mais pessoas começaram a manifestar suas prórpias preocupaçãoes em torno do lobby israelense e sua influência danosa na política americana. Eu tenho pouco a acrescentar às análises prévias, por isso que não tenho escrito muito sobre esse assunto recentemente.
Ainda assim, esse último bafafá é interessante pelo que ele revela sobre as regras do jogo da política externa nos dois países. Não estamos falando de um deslocamento ideológico significativo nem nada do tipo. Em vez disso, o marco zero da confusão foi um atigo no Atlantic, que citava autoridades americanas dizendo coisas não muito agradáveis sobre o Primeiro Ministro israelense, Benjamin Netanyahu.
O parágrafo que abria o texto incluía uma descrião anônima de Netanyahu como “covarde”, no sentido de que o premiê teria aversão demais a tomar riscos e é receoso de ações militares contra o Irã. Foi só isso mesmo.
Infelizmente, essa birra menor sugere que estamos lidando não com uma potência madura nem uma nação-cliente grata, mas sim com um bando de crianças imaturas que andam precisando de supervisão de adultos. Ou mesmo ficar de castigo.
Para começar, se isso é uma “crise” nas relações EUA-Israel, - conforme alardeia a manchete do Atlantic – com certeza é uma crise bem curiosa.
Normalmente, o termo se refere à colisão de interesses contrários envolvendo perigos reais, como na Crise de Julho que levou à Primeira Guerra Mundial, ou a Crise dos Mísses de Cuba, em 1962. Mas há pouca ou nenhuma substância nessa escaramuça – Os Estados Unidos ainda dão ao rico e poderoso Estado de Israel bilhões de dólares em auxílio militar e econômico todo ano, ainda vedemos a Tel Aviv alguns dos aramentos mais sofisticados do arsenal americano, e autoridades do governo continuam a dar cobertura diplomática nas Nações Unidas e outros fóruns internacionais.
Washington ficou ao lado de Israel até mesmo quando Gaza foi bombardeada novamente há alguns meses, apesar das preocupações oficias acerca da coerência e do senso moral por trás das ações israelenses. E oficiais da Casa Branca agora estão apaziguando os ânimos e reafirmando a “efetiva parceria” entre os dois países e seus governantes.
Em vez de uma crise real tudo o que temos aqui são provas de que algumas autoridades americanas não pensam grande coisa de Benjamin Netanyahu, e ao menos uma dessas pessoas usou uma linguagem mais ácida para se expressar.
Eis uma “surpresa”: muitos politicos estadunidenses – entre eles Bill Clinton – não gostam muito de Netanyahu, e por motivos bastante óbvios. Ele é convencido, pretensioso, bombástico, tem pouco respeito por fatos (o que é bem comum entre líderes) e às vezes trata autoridades americanas com desprezo.
Caso você seja Barak Obama, John Kerry ou algum de seus assistentes, e venha trabalhando extra para tentar um acordo de paz que salve Israel da política suicida de assentamentos no território palestino, é de se esperar um tanto de irritação e desgosto quando você tem zero ajuda de Netanyahu e seus aliados.
Mas mesmo que a irritação dos EUA seja totalmente justificada, o que pode ter levado um funcionário de alto (ou médio) escalão a fazer esse tipo de comentário para jornalistas? O que a fonte anônima esperava conseguir? Ele ou ela esperava consolidar mais oposição ao acordo nuclear do Irã entre os diversos testas-de-ferro de Israel no senado americano? A explicação mais provável é que se trata de pirraça elevada a status duvidoso de notícia através da vulgaridade.
Ainda assim, vamos dar um passo para trás e observar o significado de todo esse incidente. Há como fazer com que representantes seniores de uma grande potência se comportem? Conversa fiada pode tirar a diplomacia do rumo, e se houve algum propósito por trás dessa declaração, foi mal pensado.
Caso tenha sido apenas uma forma petulante de vingança verbal de um funcionário frustrado, então se trata de incompetência profissional. Autoridades de alto escalão são nomeadas para projetar os interesses nacionais no exterior, e isso significa manter as irritações pessoais para si até a hora de escrever suas memórias.
Além disso, a ideia de que Netanyahu é um covarde que não tem coragem de partir para cima do Irã parte do princípio de que Israel tinha, desde o começo, uma opção militar viável. Na verdade, a hostilidade do primeiro-ministro para com Teerã sempre foi um blefe.
Isso porque faltam a Tel Aviv meios militares para um ataque estrategicamente relevante à infrastrutura nuclear iraniana. Claro que a Força Aérea israelense poderia causar danos à planta nuclear, mas não há aeronaves nem capacidade de destruição dos bunkers para eliminar toda a capacidade de enriquecimento de combustível.
A situação atual com o Irã não é nem de perto como a invasão do reator de teste Osirak no Iraque em 1981, nem o ataque a um reator atômico na Síria em 2007, que envolveu bomberdeio de uma única área vulnerável.
Um ataque israelense pode atrasar o avançado programa atômico iraniano em alguns meses, talvez uma no, mas tabém encorajaria os líderes de Teerã a realmente iniciar os trabalhor para a construção de uma bomba. E é por isso que membros importantes da segurança nacional de Israel vieram a público com suas próprias preocupações acerca das ameaças vazias de Netanyahu.
Alguns “Doutores Fantásticos” de Tel Aviv podem ter acreditado em algum momento que um ataque instigaria os EUA a terminarem o serviço, mas os riscos eram gigantescos, e tanto Bush quanto Obama deixaram claro que não entrariam nessa aposta.
Resumindo, não atacar o Irã não foi demonstração de covardia do Primeiro Ministro israelense, mas uma decisão estratégica e de bom-senso. A retórica belicosa de Israel tinha a finalidade de desviar a atenção da questão mais grave dos assentamentos em território palestino, mantendo Terrã como “inimigo número um”, além de convencer Washington a impor sanções mais severas na esperança de conseguir um acordo melhor acerca do programa nuclear iraniano. Mas um ataque efetivo nunca foi uma possibilidade.
A fanfarronice de Netanyahu pode ter enganado jornalistas como Jeffrey Goldberg, do Atlantic – que já havia alardeado falsas possíveis ofensivas israelenses em outras ocasiões – mas observadores coerentes provavelmente não se deixaram levar por toda a tolice.
No fim das contas, esse pequeno incidente de comunicação confirma os efeitos nada saudáveis da “relação especial” em si. A triste verdade é que autoridades americanas ainda não podem manifestar abertamente o que pensam sobre o comportamento do governo de Israel, ou o que realmente pensam sobre a diplomacia entre Washington e Tel Aviv.
A menor das críticas gera abusos e, é claro, quem aspira a um alto cargo diplomático tem que fazer juras e repudiar publicamente qualquer crítica anterior a fim de ser nomeado - pergunte a Samantha Power e Chuck Hagel como o processo funciona. Ironicamente, são as lideranças americanas que são covardes diante dessas questões, não Netanyahu.
Toda a confusão causada pelo artigo do Atlantic nos lembra de que dois páises nunca têm os mesmos exatos interesses, não importa o que políticos americanos digam em seus discursos tendenciosos nas conferências anuais do American-Israeli Public Affairs Committee. Os EUA querem uma solução com dois Estados para o conflito Israel-Palestina, e um mecanismo de dissuasão significativo contra o Irã. O governo de Netanyahu se opõe nos dois casos, e esse abismo entre os parceiros deve se tornar mais aparente com o tempo.
Esse episódio mostra ainda o quanto as autoridades do alto escalão americano gostariam de pressionar Israel a mudar sua atitude. Uma potência madura que aspira à liderança global deveria fazer exatamente isso, mas os diplomatas são impedidos de dar esse passo óbvio por conta do resistente coágulo político representado pela AIPAC e outros grupos no lobby.
Quando falam em público ou oficialmente para a imprensa, os diplomatas precisam fingir que a “relação especial” é uma maravilha, mesmo que seja óbvio até para quem acompanha casualmente que não é bem assim. Mas quando funcionários bem intencionados são bloqueados, insultados e forçados a praticar auto-censura repetidamente, a frustração é inevitável, e é inevitável também destilar um pouco dela em público. Não é nada útil nem profissional, mas é completamente humano.
Stephan M. Walt é professor de Relações Internacionais na Universidade de Harvard.
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