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domingo, 15 de março de 2015

A muito “inaudita” semântica do Império

Maduro discursa na Assembleia Nacional
O governo dos EUA (PIB US$ 17,5 trilhões) declara que a situação na Venezuela (PIB US$ 438,28 bilhões):

(...) constitui ameaça inusual e extraordinária contra a segurança nacional e a política exterior dos EUA.

A tal “ameaça”, diz a Casa Branca, requer:

(...) que se declare uma emergência nacional, para enfrentar aquela ameaça.

“Por que”, perguntam os venezuelanos, inclusive a oposição patrocinada pelos EUA, “vocês acham que seríamos ameaça inusual e extraordinária, que requer que vocês nos declarem emergência nacional?

“Não achamos, nem por um instante, que vocês sejam ameaça inusual e extraordinária que exige que declaremos emergência nacional” – é a resposta:

Funcionários em Washington disseram que declarar a Venezuela ameaça à segurança nacional foi mera formalidade.

“Formalidade”? perguntam os venezuelanos. “Por que seria formalidade nos ver como ameaça inusual e extraordinária à segurança nacional de vocês? A coisa não faz sentido. E depois, inventarão o quê? Nos matarão também por simples formalidade?”

Chávez é pranteado por seu povo
“É formalidade necessária para podermos aplicar sanções a alguns dos funcionários do governo de vocês”, explica um alto funcionário dos EUA, que pede que seu nome não seja divulgado. “A lei exige que nós declaremos vocês ameaça inusual e extraordinária à segurança nacional, o que exige que nós declaremos emergência nacional”.

“Mas não somos ameaça alguma. O senhor mesmo acaba de dizer. Assim sendo, porque os EUA sancionariam nossos funcionários, se, como o senhor acaba de dizer, os EUA não têm qualquer base real para qualquer sanção? Sobre que base legal os EUA estão agindo? Por que as sanções?”.

“Porque a situação na Venezuela... constitui ameaça inusual e extraordinária à segurança nacional e à política exterior dos EUA o que exige que declaremos emergência nacional para lidar com aquela ameaça”.

“É como declarar guerra contra nós. Nada disso faz sentido algum”.

“Ora... É apenas uma formalidade.”

---

Seria o caso de declarar que o que acima se lê é a “mais inusual” imbecilidade que o governo dos EUA poderia produzir. Mas não. Há coisa pior.

O presidente Maduro da Venezuela respondeu na Assembleia Nacional:

A agressão e a ameaça do governo dos EUA é a maior ameaça que a República Bolivariana da Venezuela, nosso país, jamais recebeu – disse o presidente; foi aplaudido. [...] Vamos cerrar fileira como um só corpo de homens e mulheres. Nós queremos paz.

O presidente venezuelano falou de intervenções militares passadas na América Latina e avisou que os EUA estão preparando invasão e bloqueio naval contra a Venezuela.

Em nome de direitos humanos, estão-se preparando para invadir a Venezuela– disse ele.

Miriam Kornblith viajou para a Venezuela sob circunstâncias suspeitas e para se reunir com figuras da oposição
Durante os últimos 125 anos, foram pelo menos 56 intervenções dos EUA na América do Sul (veja quadro abaixo, em inglês) por operações militares ou de inteligência. Esse país eternamente invasor e interventor é o mesmo que acaba de declarar que a Venezuela seriaameaça inusual e extraordinária à segurança e à política exterior dos EUA que exige que se declare uma emergência nacional.

Histórico de algumas intervenções diretas dos EUA na AL
Location
Period
Type of Force
Comments on U.S. Role
Argentina
1890
Troops
Buenos Aires interests protected
Chile
1891
Troops
Marines clash with nationalist rebels
Haiti
1891
Troops
Black workers revolt on U.S.-claimed Navassa Island defeated
Nicaragua
1894
Troops
Month-long occupation of Bluefields
Panama
1895
Naval, troops
Marines land in Colombian province
Nicaragua
1896
Troops
Marines land in port of Corinto
Cuba
1898-
Naval, troops
Seized from Spain, U.S. still holds Navy base at Guantanamo
Puerto Rico
1898-
Naval, troops
Seized from Spain, occupation continues
Nicaragua
1898
Troops
Marines land at port of San Juan del Sur
Nicaragua
1899
Troops
Marines land at port of Bluefields
Honduras
1903
Troops
Marines intervene in revolution
Dominican Republic
1903-04
Troops
U.S. interests protected in Revolution
Cuba
1906-09
Troops
Marines land in democratic election
Nicaragua
1907
Troops
"Dollar Diplomacy" protectorate set up
Honduras
1907
Troops
Marines land during war with Nicaragua
Panama
1908
Troops
Marines intervene in election contest
Nicaragua
1910
Troops
Marines land in Bluefields and Corinto
Honduras
1911
Troops
U.S. interests protected in civil war
Cuba
1912
Troops
U.S. interests protected in Havana
Panama
1912
Troops
Marines land during heated election
Honduras
1912
Troops
Marines protect U.S. economic interests
Nicaragua
1912-33
Troops, bombing
20-year occupation, fought guerrillas
Mexico
1913
Naval
Americans evacuated during revolution
Dominican Republic
1914
Naval
Fight with rebels over Santo Domingo
Mexico
1914-18
Naval, troops
Series of interventions against nationalists
Haiti
1914-34
Troops, bombing
19-year occupation after revolts
Dominican Republic
1916-24
Troops
8-year Marine occupation
Cuba
1917-33
Troops
Military occupation, economic protectorate
Panama
1918-20
Troops
"Police duty" during unrest after elections
Honduras
1919
Troops
Marines land during election campaign
Guatemala
1920
Troops
2-week intervention against unionists
Costa Rica
1921
Troops

Panama
1921
Troops

Honduras
1924-25
Troops
Landed twice during election strife
Panama
1925
Troops
Marines suppress general strike
El Salvador
1932
Naval
Warships sent during Faribundo Marti revolt
Uruguay
1947
Nuclear threat
Bombers deployed as show of strength
Puerto Rico
1950
Command operation
Independence rebellion crushed in Ponce
Guatemala
1954-?
Command operation, bombing, nuclear threat
CIA directs exile invasion and coup d'Etat after newly elected government nationalizes unused U.S.'s United Fruit Company lands; bombers based in Nicaragua; long-term result: 200,000 murdered
Panama
1958
Troops
Flag protests erupt into confrontation
Cuba
1961
Command operation
CIA-directed exile invasion fails
Cuba
1962
Nuclear threat, naval
Blockade during missile crisis; near-war with Soviet Union
Panama
1964
Troops
Panamanians shot for urging canal's return
Dominican Republic
1965-66
Troops, bombing
Marines land during election campaign
Guatemala
1966-67
Command operation
Green Berets intervene against rebels
Chile
1973
Command operation
CIA-backed coup ousts democratically elected Marxist president
El Salvador
1981-92
Command operation, troops
Advisors, overflights aid anti-rebel war, soldiers briefly involved in hostage clash; long-term result: 75,000 murdered and destruction of popular movement
Nicaragua
1981-90
Command operation, naval
CIA directs exile (Contra) invasions, plants harbor mines against revolution; result: 50,000 murdered
Honduras
1982-90
Troops
Maneuvers help build bases near borders
Grenada
1983-84
Troops, bombing
Invasion four years after revolution
Bolivia
1987
Troops
Army assists raids on cocaine region
Panama
1989
Troops, bombing
Nationalist government ousted by 27,000 soldiers, leaders arrested, 2000+ killed
Haiti
1994-95
Troops, naval
Blockade against military government; troops restore President Aristide to office three years after coup
Venezuela
2002
Command operation
Failed coup attempt to remove left-populist president Hugo Chavez
Haiti
2004-
Troops
Removal of democratically elected President Aristide; troops occupy country
Honduras
2009
Command operation
Support for coup that removed president Manuel Zelaya

Certamente, nada há de inusual em Maduro interpretar tal declaração como primeiro movimento de mais uma das tantas vezes repetidas intervenções dos EUA contra países da América Latina. Especialmente quando há funcionários dos EUA que viajam disfarçados pela Venezuela distribuindo dinheiro para partidos de oposição.

Maduro não é o único a ver nisso tudo mais uma ameaça de intervenção norte-americana. Todas as nações da América do Sul já condenaram a declaração dos EUA, inclusive políticos que os EUA financiam na Venezuela, todos ofendidos pelo gesto de Obama.

Manifestantes em Caracas em 11/3/2015
(clique na imagem para aumentar)

Mas para o proverbial sempre anônimo funcionário do governo dos EUA, os EUA é que seriam vítimas dos venezuelanos que protestaram "absurdamente":

Chama a atenção que o governo venezuelano se ponha a dizer as coisas mais inauditas sobre o governo dos EUA – que seria a 16ª ou 17ª tentativa de golpe que estaríamos fazendo contra eles? Que estamos invadindo alguma coisa? – disse o mesmo funcionário. – A vida média dessas acusações é o quê? Um dia? Dois dias? Até o mais tolo dos consumidores de mídia verá que não há invasão alguma.

Ah! Considerando o duplifalar dos EUA em todo esse affair, melhor todos tomarem muito cuidado com a parte de “não há invasão alguma”.

Redecastorphoto

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