Por Iuri Gomes
Introdução:
A marinha Soviética (Военно-морской флот – ВМФ ou Voyenno-Morskoy Flot – VMF) com uma nova doutrina de expansão em meados dos anos 60, liderada pelo renomado Almirante Sergey Gorshkov fez crescer sua frota de submarinos para nada menos que 340 embarcações nucleares e convencionais contra 137 unidades do seu maior inimigo os Estados Unidos.
Com isso, parte do grupo estratégico nuclear soviético concentrava-se nos 34 SSBN classe Yankee (projeto 667A.) que utilizavam os mísseis nucleares R-27 ( (SS-N-6 ‘Serb‘) que possuíam alcance limitado de 3000 km. Porém, essa classe de navio demonstrou ser demasiadamente ruidosa devido ao atraso tecnológico que a indústria naval soviética possuía na época. Diante disso VMF foi um dos grandes apoiadores para um novo SSBN que possuísse uma arma com maior alcance. Surgiria aí a classe Yankee que se estabeleceu como lançadores de mísseis médios.
Em 1973, paralelamente em construção com a classe Yankee, a nova classe de SSBN chamada Delta I (Projeto 667B Murena, versão melhorada e alongada da classe Yankee) foi introduzida à marinha, no qual sua principal arma, os mísseis R-27(SS-N-6 Serb) se tornaram de fato, o primeiro míssil balístico intercontinental lançado de submarino (SLBM) pelos soviéticos, com alcance de 7800 km. O R-29 possuía maior dimensão que o R-27, dessa forma, para acomodar os novos e maiores mísseis foi instalado uma “corcova” atrás da vela de cada um dos 18 Deltas I construídos até 1978, onde ficavam alojados 12 SLBM. Em 1975 foi incorporada a versão Delta II (projeto 667BD Murena M), que comparada à versão anterior, possuía maiores dimensões para acomodação de 16 SLBM, mas somente quatro foram construídos para que a produção se concentrasse na mais nova versão de SSBN, o Delta III (projeto 667BDR, Kalmar) que entrou em serviço em 1976 e tinha como principal arma os mais novos e avançados mísseis SS-N-18, uma variante modernizada do SS-N-8. Ademais foram construídos 14 submarinos Delta III, o primeiro SSBN Soviético capaz de lançar em uma única salva os 16 SLBM do tipo R-29R, que por sua vez, foi também o primeiro sistema de mísseis soviéticos lançados do mar levando de 3 a 7 veículos de reentrada independentes (MIRVs) com alcance de 6,500 a 8000 km, dependendo do número de MIRV.
Eis que na década de 80 surge na VMF um SSBN muito mais capaz que seus antecessores; o Delta IV (667BDRM Delfin) mesmo parecendo externamente com Delta II, o novo submarino possuía um projeto muito mais avançado em todos os conceitos técnicos e tecnológicos, onde pela primeira vez os engenheiros soviéticos conseguiram se igualar em furtividade aos ocidentais em todos os projetos de submarinos deste período. Este submarino é hoje a espinha dorsal de SSBNs da marinha russa, sofrendo constantes modernizações, ele mantem e manterá um dos pilares da tríade nuclear russa por um bom tempo.
Versões da Classe Delta
Origem:
No início da década de 70, a marinha soviética percebeu que seus SSBN precisavam ser mais furtivos, pois eram ameaçados constantemente pelos SSN (submarinos nucleares de ataque) da OTAN, no entanto, a indústria naval soviética só conseguiu aperfeiçoar sua construção de submarinos em meados dos anos 70 e criar uma série de belonaves muito silenciosas mesmo para os padrões ocidentais. Dessa forma, Gorshkov apoiou dois novos projetos de SSBNs, o imponente Typhoon (projeto 941) para lançar o míssil 3M65/SS-N-20 “Sturgeon”, de combustível sólido já descrito no Plano Brasil (Clique aqui para ler a matéria) e o Delta IV (projeto 667 BDRM) para lançar o míssil de combustível líquido R-29RM/SS-N-23 “Shtil”. Durante o desenvolvimento do projeto 667BDRM foram implantadas melhorias em relação à redução de nível de ruídos; os sistema e equipamentos encontram-se isolados a partir do casco de pressão e seu sistema anti-hidroacústico foi bastante melhorado em relação ao seu projeto anterior 667BDR.
– Propulsão
O design do submarino é semelhante com a classe Delta III, constituído de casco duplo com mísseis adotados no casco interno. Como no Delta III, os hidroplanos são posicionados na parte da frente da vela, podendo ficar na horizontal para facilitar no rompimento das grossas camadas de gelo do ártico.
O SSBN projeto 667 BDRM possui dois reatores nucleares de água pressurizadas VM-4 de 180 MW, possui também duas turbinas do tipo GT3A-365 com potência de cerca de 30 MW que são transmitidas por dois eixos de hélices de sete pás de passos fixos. Seu sistema de propulsão permite uma velocidade de 24 nós (43 km/h) a uma profundidade operacional de 320 metros, mas possui a capacidade de mergulho de 400 metros. Em condições normais, o submarino pode permanecer em incursões de 80 dias.
– Família R-29 no SSBN Delta IV
Em 1979 foi iniciado o projeto de um novo míssil SLBN (Míssil Intercontinental Lançado por Submarino), R-29RM (RSM-54) ou SS-N-23, pelo centro de engenharia Victor Makeev para ser utilizado no sistema lançamento modernizado D-9RM. A concepção do projeto consiste em míssil intercontinental capaz de atingir pequenos alvos terrestres. O R-29RM foi incorporado a Marinha Soviética em 1986 onde cada Delfin portava 16 mísseis. O R-29RM é uma modificação da versão anterior R-29R com melhorias significativas, onde foram diminuídos os custos em relação a um novo projeto. Dessa forma foi ampliada para 40 toneladas o peso de lançamento e seu alcance máximo para 8300 km, suas dimensões se mantiveram praticamente as mesmas de seu antecessor tendo 14,8 metros de comprimento e 1,9 metros de diâmetro. O corpo do míssil é feito de liga de magnésio-alumínio. O foguete é dividido em três estágios de combustível líquido onde os propulsores de dois estágios são “afogados” nos tanques de combustíveis. Na parte dianteira do foguete está alojado o sistema de controle que inclui sistema de correção celeste de trajetória de voô, sistema de guiamento por satélite, sistema de navegação pelas estrelas, 4-10 ogivas MIRVs e suas iscas. Entretanto, por conta do tratado Start-1, assinado entre EUA e URSS (atual Federação Russa) o número de ogivas nucleares transportada por mísseis intercontinentais é limitado em apenas quatros unidades.
Em 19 de novembro de 1998 foi realizado um teste com protótipo do míssil SS-NX-28(RSM-52 ) no qual houve uma falha a cerca de 200 metros da estação de lançamento terrestre ocorrendo uma explosão e posteriormente duas falhas consecutivas, desta forma optaram por abandonar o projeto.
R-29RMU- O novo Martelo do Delta IV
Em 1999, o centro de design VP Makeev recebeu ordem do governo russo para voltar a produção dos sistemas SS-N-23, com a expiração do tratado Start-1 ocorrida em 2009, o míssil pode transportar até dez ogivas nucleares.
O novo RSM-54 Sineva, conhecido no ocidente como (SS-N-23 Skiff) é a terceira geração de mísseis balísticos de combustível líquido a entrar em serviço VMF, seu comissionamento ocorreu em 2007 sendo considerado um dos projetos mais promissores da indústria militar russa. Esse novo sistema poderá se manter em estado de alerta até 2030. O primeiro submarino a ser modernizado com a nova arma foi o K-114 “Tula” em 2007, essa embarcação foi construída em 1987 no estaleiro de Severodvinsk na região de Arkhangelsk.
O alcance do R-29RMU não se sabe bem ao certo, mas se estima a uma distancia superior a 10000 km segundo a algumas fontes russas, mas um teste realizado em outubro de 2008 em um exercício, o míssil alcançou uma distância de 11.547 km, e diferentemente, o teste não foi realizado no campo de provas em Kura no extremo oriente russo e sim lançado do noroeste russo na península de Kola a parte equatorial do Oceano Pacífico.
Com a sequencia de falhas no míssil de combustível sólido (SLBN) R-30 (Bulava) no ano de 2009 a 2013 que hoje equipa os moderníssimos SSBN projeto 955(Borei), nesse período o projeto do R-29 ganhou maior fôlego para garantir o braço de SSBNs da frota russa. Dessa forma, uma modernização no sistema R-29RMU, surgiu em 2011 míssil R-29RMU2 “Lyner” com capacidade de levar até doze ogivas MIRVs e com avanços técnicos não divulgados pelo estado russo, mas testes realizados demonstraram que o sistema possui maior capacidade para superar o escudo de mísseis antibalísticos. “Em 2014 o ‘Lyner’ foi aceito por decreto da presidência russa para equipar os seis SSBN projeto 667BDRM” Delta IV”.Hoje, de fato, o sistema “Lyner” e “Bulava” são os mais capazes sistemas de SLBN em operação no mundo.
– Armas
O submarino possui quatro tubos de 533 mm que pode disparar grande variedade de torpedos e torpedos-mísseis de capacidade anti-submarino . A embarcação é capaz de lançar o míssil anti-navio SS-N-15 Starfish este podendo ser armado com uma ogiva nuclear de 200kt e possuindo um alcance de cerca de 45 quilômetros. O submarino pode transportar até 18 mísseis e torpedos.
– Eletrônica e comunicação
O Delta IV possui um sistema de gerenciamento de batalha que controla todas as atividades de combate, processamento de dados e comandos das armas como torpedo e torpedos-mísseis do tipo “Omnibus-BDRM”. O sistema de navegação de precisão dos mísseis que possui capacidade de navegação estelar em profundidade de periscópio é do tipo “Shlyuz4”. O submarino possui também duas boias flutuantes de antenas para “mensagens- rádio”, dados de alvo, navegação por satélites a grande profundidades . O Skat-BDRM é o sistema hidroacústico que equipa o Delfin. A suíte de sonar é montada na parte frontal do casco que opera em baixa e média frequência no modo de busca e ataque de forma passiva e ativa seu sonar de ataque do tipo RAT ROAR é operado em alta frequência. Seu sonar de baixa frequência e passiva é do tipo tubarão, e ainda, o Delta IV possui um sonar rebocado que opera em baixíssima frequência em modo passivo.
– Apocalypse (Behemoth-2)
Em agosto de 1991, em uma inusitada manobra de combate, o submarino K-407 Novomosk, último dos sete Delta IV, comandada pelo capitão Sergey Yegorov, disparou uma salva completa de dezesseis mísseis balísticos (R-29RM) de forma subaquática . Toda essa salva durou 3 minutos e 44 segundos, com intervalo de 14 segundos por lançamento, dessa forma foi expelido incríveis 650 toneladas de sua estrutura, essa operação de código “Behemoth-2” foi um ensaio para uma guerra nuclear total (conhecido também como “ensaio do Apocalipse”). Somente o primeiro e o ultimo míssil atingiram seus alvos na península de Kamchatka , pois os outros foram autodestruídos em voo.
Essa operação demonstrou ao mundo e a própria cúpula militar russa a capacidade de dissuasão do SSBN do projeto 667 BDRM em um cenário de guerra nuclear e confirmou a segurança de uma rápida salva de mísseis balísticos de forma subaquática. Até aquela data, nenhum submarino no mundo havia disparado todos seus SLBNs em uma única salva.
Abaixo temos dois videos sobre a Operação “Behemoth-2″
Operação na Marinha Russa
Ao todo foram construídos sete unidades do DELTA IV, porem, o K-64 foi convertido para BS-64, um submarino para propósitos especiais, tem por função ser a nave mãe de um mini-submarino que serve para pesquisa oceanográfica, busca e salvamento subaquática e coleta de informações.
A estrutura mínima de SSBN na marinha russa é de cerca de doze submarinos, hoje ela é composta por nove navios, seis DELTA IV na frota do “Mar do Norte” (K-51 Verkhoturye, K-84 Ekaterinburg, K-114 Tula, K-117 Bryansk, K-18 Karelia E K-407 Novomoskovsk) e três velhos Delta III na frota do oceano “Pacífico” ( K-223 Podolsk, K-433 Georgiy Pobedonosets Svyatoy e o K-44 Ryazan).
No início dessa década, a mídia ocidental e parte da própria mídia russa, mencionava erroneamente que os SSBN Borei iriam substituir os gigantescos SSBN projeto 941 “Typhoon” e SSBN 667BDRM “Delta IV”, mas desde os tempos soviéticos, a classe “Delfin” tinha por função realizar um ataque nuclear secundário em relação aos “Typhoon”, dessa forma, com a entrada em operação de seus mísseis “R-30 BULAVA” de combustível sólido, os navios da classe Borei irá substituir somente os imponentes “Typhoon”, e os Delta IV voltam a função secundária de ataque nuclear em relação aos SSBNs Borei.
A estimativa na Marinha Russa, é que em 2020 os oito navios da classe Borei se encontre prontos e ativos, três das embarcações se encontram prontos na versão projeto 955 que portam dezesseis mísseis SLBN R-30 “Bulava”, os outros cinco, serão uma versão modernizada Projeto 955A com capacidade de 20 mísseis “Bulava”. Dessa maneira nos anos posteriores a 2020, a VMF estará com uma força de quatro ou seis “Delta IV” armados com modernos mísseis “Sineva” e “Lyner” e oito unidades da classe Borei armados com mísseis Bulava. Os SSBNs “Delfin” demonstram ter muito folego para os desafios da próxima década ao lado dos SSBN Borei, garantindo assim a força nuclear submarina da Federação Russa.
Ficha Técnica:
Designação Soviética | 667BDRM Dolphin |
US-Designação | Delta IV |
O desenvolvimento começou | Setembro 1975 |
Design Bureau | Central Design Bureau para Marine Engineering “Rubin” |
Designer-chefe | SH Kovalev |
Builders | Nr. 402 Severodvinsk |
Construção e Outfit | Fevereiro 1981-1992 |
Tempo de serviço | Dezembro 1985- |
Número de navios | 7 |
Armamento | D-9 RM sistema de lançamento com 16 R-29 mísseis RM |
Tubos de torpedos 4-533mm | |
Usina Elétrica | 2 reatores de água pressurizada, de 90 MW cada 2 turbinas a vapor, 20.000 hp cada |
Hélices | 2 × 7 lâmina fixa-pitch |
Comprimento | 167 metros |
Viga | 12.3 metros |
Rascunho | 8,8 metros |
Deslocamento | 13.500 toneladas Surfaced 18.200 toneladas submerso |
Profundidade operacional | 320 metros (design) 400 metros (profundidade máxima) |
Velocidade | 13-14 knots Superfície 22-24 nós submerso |
Tripulação | 130 homens |
Resistência | 80 dias |
Plano Brasil
Nenhum comentário:
Postar um comentário