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domingo, 11 de outubro de 2015

O Arco do Caos, morto no berço

Russian military aircraft at Syria's Hmeimim airfield
A campanha da Rússia contra os terroristas na Síria belisca bem no traseiro da grande estratégia dos EUA.

A partir dos anos 1980s, as ideias do geoestrategista polonês-norte-americano e ex-conselheiro de segurança nacional dos EUA Zbigniew Brzezinski sempre aparecem na linha de frente da aplicação da política externa dos EUA em todo o mundo. Seja no caso, já admitido, de os EUA criarem e armarem os Mujahedeen (os quais adiante se desdobraram em Al Qaeda e nos Talibã), ou na obsessão de separar a Ucrânia da Rússia (que adiante se desdobrou nos eventeos da EuroMaidan), as ideias de Brzezinski sempre estão presentes onde haja desestabilização, a mesma que, hoje, já se estende por continentes e décadas.

O legado mais duradouro que Brzezinski jamais ofereceu ao mundo, contudo, é sua destrutiva teoria dos “Balcãs Eurasianos”, exposta no livro O Grande Tabuleiro de Xadrez: primado dos EUA e imperativos estratégicos, de 1997.

Ali, Brzezinski postula que, para garantir indefinidamente o poder norte-americano sobre o espaço global, os EUA devem explorar o grande arco de terra que vai do Norte da África até a Ásia Central, que está maduro para lutas sectárias e de divisionismo étnico.
O berço desse conceito sempre foi o Oriente Médio. Agora, com a Rússia trabalhando para resolver o caos que os EUA criaram ali, e tentando devolver a estabilidade à região, parece que, afinal, Moscou começa a reverter a grande estratégia de Washington.

Examinemos rapidamente em que se deveriam converter os “Bálcãs Eurasianos”, como os planos para criar o caos armado para guerra deveriam funcionar, e o modo como a Rússia avançou, ainda a tempo de conter esse desatino.

Construir os “Bálcãs Eurasianos”

A ideia de Brzezinski sobre “Bálcãs Eurasianos” não brotou do nada. Como polonês furiosamente nacionalista, Brzezinski sempre foi agudamente consciente da política do líder polonês do período entre-guerras, marechal Jozef Pilsudski, e da política exterior destrutivamente inovadora do “Prometeísmo” que acompanhou aquele governo.

Essa ideia estipula que a União Soviética multiétnica e policonfessional poderia ser desmembrada, se se garantissem armas, treinamento e apoio político a revolucionários de identidades periféricas na União Soviética, para que lutassem numa grande futura “guerra de libertação” contra o governo central em Moscou. Conotação metafórica aqui era que aqueles doadores de armas e dinheiro e cobertura política seriam como neo-Prometeus, oferecendo aos homens o fogo que os libertaria do jugo de Zeus, o mais forte e mais temido dos deuses gregos.

Essa política fracassou, acabou por dar em nada, o que não impediu que Brzezinski continuasse a fantasiar sobre uma ressurreição da mesma política, décadas adiante. A influência da obsessão de Pilsudski com as identidades pode ser vista em Brzezinski, no final dos anos 1970s, na descrição que oferece do que seria um “Arco de Crises”, que

“se estende pelos litorais do Oceano Índico, com estruturas sociais e políticas frágeis, numa região de vital importância para nós, e ameaçada de fragmentação. O caos político daí resultante poderia ser preenchido por elementos hostis aos nossos valores e simpáticos aos nossos adversários”.

A expressão “estruturas sociais frágeis” é eufemismo para “vulnerável a conflitos de identidade” – Brzezinski sempre foi injustificavelmente obcecado pelo risco de a União Soviética vir a explorar os tais conflitos.

Poucos anos adiante, foi o próprio Brzezinski, por ironia, quem se tornaria conhecido – Brzezinski, não algum soviético! –, por se servir desse mesmo conceito, que ele levou ao ponto de mais extremo radicalismo, convencendo o presidente Jimmy Carter a armar os pais fundadores da Al-Qaeda, naquela sua guerra santa (armada, paga e comandada pelos EUA) contra a União Soviética, no Afeganistão.

O pensamento estratégico de Brzezinski sugeria que o momento militante a que o movimento chegara no Afeganistão poderia ser empurrado para a Ásia Central, mediante a orquestração externa de semelhantes levantes de islamistas, os quais levariam à subsequente retirada dos soviéticos de volta para Moscou; e à independência de todas as repúblicas de onde os soviéticos tivessem de retirar-se.

Encurralar o Caos

Inspirado no que para ele estava sendo o sucesso de seu conceito, que estaria contribuindo para o colapso da União Soviética em 1991, Brzezinski decidiu expandir essa sua perversão fratricida, aplicando-a também em outras regiões onde fosse possível identificar e inflar conflitos identitários, a saber: o Oriente Médio e o Norte da África.

Tomando a região dos Bálcãs, muito diversa em termos étnicos e de confissões religiosas, e com longa história de guerras intestinas, como mais um precedente temático (o evento mais recente acontecera no início dos anos 1990s e certamente estava fresco em sua memória), Brzezinski batizou como “Bálcãs Eurasianos”, a estratégia que concebera e acabava de arrematar.

Para resumir as ideias sobre essa questão, que expôs em O Grande Tabuleiro de Xadrez, Brzezinski acreditava que os planos para instigar conflitos caóticos no Norte da África-Ásia Central, se levados a cabo, poderiam impedir que se consolidasse uma grande aliança eurasiana entre Rússia, China e Irã, que teria potência para desafiar o domínio contemporâneo dos EUA e para esmagar a Doutrina Wolfowitz (“EUA como a única superpotência”), reduzindo tudo isso a cacos.

Os EUA conseguiriam safar-se ilesos desse futuro buraco negro de caos disseminado, porque suas bases principais estão na Europa e no Leste da Ásia. Assim, se o pior se tornasse muito pior, e o supercontinente fosse tomado por conflagração massiva, os dois oceanos serviriam como amortecedores, mantendo os EUA bem longe de qualquer risco real de vir a ser envolvido ou atingido.

Os EUA careciam só de uma faísca para incendiar as chamas das guerras fratricidas que eclodiriam, e o país esperava que viessem a engolfar Rússia, China e Irã. Então, em 2003, os EUA criaram a ‘faísca geopolítica’ necessária, com a Guerra do Iraque.

Ao se introduzirem diretamente no meio do arco de caos que lhes interessava criar, os EUA estavam na melhor posição possível para influenciar na direção de seus dois mais amplos objetivos. E não perderam um segundo.

Esse processo foi o que o jornalista Seymour Hersh expôs em artigo definitivo, de 2007, para a revista The New Yorker, “The Redirection” [O redirecionamento], em que detalha os meios de que os EUA se serviram.

Fosse semeando ódio sectário, ou tentando derrubar o governo sírio, Washington sempre teve um macabro estoque de truques que o tempo comprovou que (1) sim, existiam; e que (2) os EUA usariam todos eles.

O gatilho para romper todos os ‘diques’ de sangue no Oriente Médio, como fora tangencialmente planejado para a região do Norte da África e Ásia Central, foram as Revoluções Coloridas que aconteceram em todo o cenário da chamada “Primavera Árabe”.

Mas, na Síria, a ‘operação’ não funcionou como o esperado – porque os sírios aplicaram-se decididamente a defender a própria soberania. A valente defesa síria fez parar todos os planos dos EUA e os pôs em modo de espera por tempo indefinido.

A salvação chega com a Rússia

Foi quando entrou em cena a Rússia, que agora já se comprometeu diretamente não apenas com derrotar o terrorismo no Oriente Médio, mas, também – como resultado lógico e mais extenso –, com reverter a desestabilização que os EUA disseminaram. A Rússia apareceu para restaurar a ordem na Síria e no Iraque – exatamente o ápice do “Arco do Caos”.
Para derrubar de ponta cabeça a teoria dos “Bálcãs Eurasianos” de Brzezinki, é imperioso que os países-alvo do Oriente Médio – que “Zbig” definiu tão cuidadosamente como seu alvo e local de onde eclodiriam todos os tumultos – comprovem-se capazes de permanecer unidos e fortes contra qualquer desgraça que os EUA lancem sobre eles.

Se essa boa aliança se mantiver, o movimento pode ter efeito exemplar na estabilização dos pontos chaves do Arco do Caos, no Norte da África e na Ásia Central. Assim, se terá posto fim a décadas de caros projetos em que os EUA se empenham para criar o caos em toda a região afroeurasiana.

As facetas geopolíticas da grande estratégia dos EUA começam e terminam na Síria – e é por isso que agora, quando se disputa afinal diretamente a Síria, Brzezinski perdeu as estribeiras e a fleugma características e, literalmente, entrou em surto épico de discursos de ataques contra a Rússia.

Em artigo assinado para o Financial Times, Brzezinski sugeriu que “As presenças naval e aérea russas na Síria são vulnerável, isolalas geograficamente de território russo”. E podem ser “desarmadas” se insistirem em provocar os EUA.”

Nem o demônio conseguiria conceber situação mais tentadora para destruir toda a vida no planeta Terra, mas, só se todos os políticos norte-americanos enlouquecerem completamente e aceitarem as ideias de seu estrategista favorito. A Rússia já mostrou a que veio, com o show de mísseis cruzadores disparados do Mar Cáspio com precisão cirúrgica. A ideia de Brzezinski, de que alguma força russa estaria ‘geograficamente isolada’ na Síria, é cálculo estratégico do século 19.
Afinal, pela primeira vez em quase um século, o establishment nos EUA não dá qualquer sinal de entusiasmo nem de qualquer disposição para seguir os conselhos de Brzezinski. Parece, afinal, que os EUA começam a emitir sinais de que talvez ainda mantenham alguma capacidade para pensar construtivamente.

Andrew Korybko  Estudante de Mestrado na Universidade Federal de Relações Internacionais de Moscou (MGIMO),
publica artigos na Rede Voltaire entre outros.

Um comentário:

  1. Os USA ou outro país qualquer... Se querem brincar com a Rússia de guerra e quanto mais na base nuclear... E sinal que vão quer morrer antes ou depois... Pois tanto faz soltar bomba antes ou depois dos Russos. Pois na moral não vai sobrar ninguém pra apagar a luz.

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