Damasco (Prensa Latina) A 57 meses de iniciada a crise na Síria, ainda não se avista uma saída ao conflito, apesar da intensa ofensiva antiterrorista e dos esforços internacionais para encontrar uma solução política que detenha o derramamento de sangue.
Na arena militar, 2015 permitiu a renovação das energias das forças armadas, as quais, no último terço do ano, iniciaram uma grande ofensiva terrestre, com a ajuda da aviação militar russa e o apoio das milícias libanesas do Hezbollah.
Até finais de setembro, só se percebiam alguns avanços discretos nas mais de 400 frentes de combate em que se organizaram as tropas governamentais e, inclusive, os grupos jihadistas ficaram em vantagem em alguns pontos do país.
As derrotas infligidas ao exército em Jirs Al-Shougur, na província de Idleb, em março; a tomada da cidade histórica de Palmira, em Homs, em maio; e o avanço dos grupos wahhabitas no nordeste da província de Alepo, no primeiro semestre, obrigou que os militares reformulassem suas estratégias.
A isto se uniram a situação de caos nos povoados de Al-Foa e Kafraya, em Idleb; o persistente assédio ao aeroporto militar de Kweres, em Alepo; e a proliferação de grupos armados na zona montanhosa de Qalamoun, a oeste desta capital.
O aumento do contingente e das armas nas milícias populares dos Grupos de Defesa Nacional (GDN), além da incorporação das milícias libanesas do Hezbollah nas zonas de combate, provocaram uma virada significativa, principalmente nas zonas do centro e do ocidente do país.
Para o exército sírio, o mais importante era fechar as vias de fornecimento dos grupos extremistas armados, fundamentalmente pelo sul, na fronteira com a Jordânia; ao norte, através dos limites fronteiriços com a Turquia, e no ocidente, pelas montanhas do Qalamoun, divisão natural com o Líbano.
A presença das milícias libanesas do Hezbollah foi decisiva nos operativos antiterroristas que provocaram a eliminação dos grupos wahhabitas em Qalamoun, que foram empurrados até a cidade de Zabadani, onde se deu a batalha final em meados de agosto.
Fechar as vias de abastecimento de armas, munições e outros elementos logísticos procedentes do Líbano permitiu reduzir a capacidade combativa dos grupos terroristas nesta zona, que terminaram sendo dizimados, em suas zonas de operações.
Isto permitiu, ademais, que as unidades conjuntas do exército sírio, as milícias do Hezbollah e os GDN, deslocassem o grosso de seus efetivos para alvos do nordeste do país, gerando uma mudança nos mapas estratégicos das tropas.
COLABORAÇÃO MILITAR RUSSA
No dia 30 de setembro, a pedido das autoridades de Damasco, o governo da Rússia autorizou a participação das Forças Aeroespaciais desse país nas operações contra os grupos terroristas que atuam na Síria desde 2011.
Até o momento, aviões de combate de uma coalizão internacional, liderada pelos Estados Unidos, bombardeavam zonas do norte e leste do país levantino, sem a autorização de seu governo e com resultados questionáveis.
Em pouco mais de um ano, esta coalizão integrada por Estados Unidos, Austrália, Bélgica, Canadá, Dinamarca, França, Jordânia, Países Baixos e Reino Unido, com apoio do Bahrein, Jordânia, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos, executaram mais de 7.870 supostos bombardeios no território da Síria e do Iraque.
Segundo cifras oferecidas pelo Departamento de Defesa norte-americano, o custo desta operação militar supera os 4,75 bilhões de dólares -uma média de US$11 milhões diários-, sem resultados palpáveis.
A presença dos aviões militares russos teve um impacto diferente, freando bruscamente a atividade dos grupos armados, que começaram a sentir o efeito dos bombardeios, e iniciaram o recuo de importantes localizações que mantinham ocupadas.
A libertação do aeroporto militar em Kweres, em Alepo, constituiu um dos mais contundentes golpes à moral combativa dos grupos extremistas, e abriu um flanco para a cidade de Raqqa, o mais importante bastião do Daesh, que chegou a proclamá-la a capital de seu califado na Síria.
Por sua vez, a aviação russa deu um golpe certeiro contra uma das principais fontes de renda do Daesh, ao destruir milhares de caminhões-cisternas utilizados para transportar para a Turquia o petróleo roubado do patrimônio sírio nas zonas ocupadas. Em menos de três meses de operações conjuntas entre a aviação militar russa e síria, e com pouco mais de dois mil voos de combate, os grupos wahhabitas Daesh, Frente Al-Nusra e outros grupos armados perderam quase 40 por cento de sua infraestrutura e tiveram que passar à defensiva em várias regiões do país.
A PARCIALIDADE DO OCIDENTE E DE ALGUNS PAÍSES DO GOLFO
Apesar da grande ofensiva antiterrorista desencadeada pelas forças armadas, com apoio aéreo russo, a presença dos grupos extremistas seguem constituindo um perigo para a estabilidade da Síria, da região e, inclusive, do mundo.
Para muitos especialistas, a única forma de aniquilar estes grupos armados é cortando suas principais vias de fornecimento, algo ao que se negam muitas potências ocidentais, que alimentaram a crise desde o início.
O discurso público dos grandes círculos de poder ocidentais, muitas vezes não correspondem com suas ações, pois, por um lado, pedem que se enfrente o perigo do terrorismo no mundo e, por outro, desembolsam bilionárias cifras em dinheiro, que se convertem em armas e munições para os grupos jihadistas.
Na região, os governos de Israel, Turquia, Arábia Saudita e Qatar seguem focados em derrubar o presidente sírio Bashar Al-Assad, não escondem suas intenções de seguir colaborando com os wahhabistas.
Ao mesmo tempo, os Estados Unidos, o principal instigador da crise, envia seus aviões -e inclusive uma reduzida força terrestre que já está instalada no norte de Alepo-, para combater o Daesh, mas segue armando os terroristas que ironicamente chama de "opositores moderados", sob o manto da Agência Central de Inteligência (CIA).
Os sírios, conscientes destes perigosos vaivens, seguem lutando com valentia no terreno, confiantes em que 2016 possa ser o ano da vitória que lhes permita manter sua soberania, independência e direito de resolver entre eles suas principais diferenças.
*Correspondente da Prensa Latina na Síria.
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