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quinta-feira, 17 de março de 2016

Europa - fracasso total na Ucrânia, por Alexander Mercouris


Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu

15/3/2016, Alexander Mercouris, Rússia Insider

Esforços diplomáticos de líderes europeus cada dia mais frenéticos mostram desespero crescente ante a impossibilidade de superar a crise ucraniana, antes que o fracasso da política de sanções apareça escandalosamente óbvio.

Com a situação na Ucrânia em rápida deterioração – o governo está paralisado, por efeito da disputa pelo poder entre Poroshenko e Yatsenyuk –, os europeus começam a desesperar.

Também já dão sinais de frustração com os ucranianos, cuja intransigência só faz prolongar a crise. Mas fato é que os europeus não têm qualquer estratégia de retirada e veem-se hoje diante do mais absoluto fracasso.

A razão do desespero é que cresce na Europa a ira contra a política de sanções, e a clara consciência de que se vai fechando a janela diplomática para encontrar um modo para pôr fim às sanções sem completa humilhação e sem que a Europa tenha desperdiçado completamente toda sua força de alavancagem.

O problema é que os europeus comprometeram-se com manter as sanções até que estivessem implantadas as condições definidas pelo Tratado Minsk 2. Mas quando o fizeram, os europeus esqueceram-se de tomar a medida básica de precaução, de cuidar para que não só os russos se comprometessem com o Tratado, mas que os ucranianos também assumissem responsabilidades.


Dado que o Tratado Minsk 2 exige de fato que a maioria das medidas sejam tomadas pelos ucranianos, o fracasso daquele acordo não priva os europeus só do poder que tinham sobre os ucranianos. O fracasso de Minsk 2 também oferece aos ucranianos um incentivo perverso para que descumpram os compromissos que assumiram, porque, em o fazendo, acabam por obrigar os europeus a manter as sanções.

Entrementes, cresce a oposição à política das sanções, no norte e também no sul da Europa.

No norte da Europa, a oposição às sanções concentra-se em grupo pequeno mais muito poderoso de eleitores. No sul, pode-se dizer que é universal, ampla, total e irrestrita.

O sul da Europa jamais se interessou muito pela Ucrânia ou no conflito ucraniano e não apoia nem compreende o jogo geopolítico que ali se trava.

A cultura política do sul da Europa também torna os sul-europeus praticamente imunes às 'lições de moral' que EUA e norte-europeus tanto apreciam e que foram usadas para mobilizar apoios ao movimento "Maidan" na Ucrânia.

As ideias e discursos pró-neoconservadores absolutamente não têm no sul da Europa nem o peso nem a influência que têm no norte, e os sul-europeus absolutamente não são obsessivamente hostis à Rússia como muitos europeus do norte.

Os sul-europeus sentem que foram arrastados para uma política de sanções com a qual absolutamente não concordam, e que consideram contraproducente e irracional.

Renzi, da Itália, o mais poderoso líder sul-europeu, nem se dá ao trabalho de esconder o desagrado com as sanções, e muitos outros líderes sul-europeus privadamente concordam com ele.

Mas o sul da Europa não tem, só ele, força suficiente para mudar uma política definida pelos mais poderosos estados europeus – Alemanha e França.

Fato é contudo que as sanções já começam a ser questionadas cada dia mais também na Alemanha, por grandes parcelas da comunidade empresarial; e, na França, pelos produtores agrícolas.

Os agricultores franceses são poderoso lobby político, que nenhum governo francês pode ignorar, especialmente com eleições à vista.

Haverá eleições presidenciais na França em 2017, e o governo francês tem sido obrigado a garantir aos agricultores que está fazendo "tudo que pode" para conseguir pôr fim às contrassanções russas, que proíbem exportações para a União Europeia.

Mas, como o governo francês sabe perfeitamente, nada disso jamais acontecerá se, antes, não forem levantadas as sanções que a União Europeia impôs contra a Rússia.

Essa situação implica que o governo francês está fortemente inclinado a trabalhar pelo fim das sanções, o que, por sua vez, implica que está sob forte estímulo para conseguir pôr fim ao conflito ucraniano.

Ainda mais importante que a crescente oposição à política de sanções é o sentimento de que a janela de possibilidade para a ação da influência diplomática europeia vai-se fechando rapidamente.

É difícil saber o quanto os líderes europeus são bem informados sobre o estado da economia russa. Mas até o mais complacente deles já deve saber agora que a Rússia não desabará sob o 'peso' de sanções insanas, e que a política russa para a Ucrânia não será alterada por causa delas.

A expectativa de que as sanções empurrariam os oligarcas russos a derrubar Putin se não mudasse de rota – que, ao que parece, foi o que a inteligência alemã informou à chanceler Merkel que aconteceria, e motivo pelo qual aconselharam que ela seguisse a política de sanções – já se comprovou absolutamente errada.

Quanto à revolução popular na Rússia, com que tantos contaram contra Putin, já aparece ainda mais claramente como delírio até para o mais ensandecido líder europeu, com a popularidade do presidente Putin ultrapassando hoje os 80%.

É possível, inclusive, que os líderes europeus mais bem informados – dentre os quais, possivelmente, o ministro Steinmeier de Relações Exteriores da Alemanha – já conheçam a aterradora verdade de que a economia russa não apenas sobreviveu, como a recessão já está lá com os dias contados.

Tudo isso ajuda a ver com clareza o paradoxo das sanções. Enquanto para os russos o custo das sanções foi enfrentado diretamente e já está diminuindo a cada mês – com o efeito geral final comprovadamente benéfico –, para os europeus só aumentam as dificuldades tanto no plano econômico quanto no plano político.

Para os europeus, uma recuperação econômica – ou, pior ainda, um boom de crescimento – na Rússia enquanto as sanções permanecem oficialmente vigentes seria desastre gravemente humilhante.

Mostraria que a Rússia é fundamentalmente imune a sanções, expondo a falência completa de toda a política de sanções.

Também exporia líderes europeus como Angela Merkel e François Hollande a críticas por impor política de sanções que acabou por ferir mais a Europa e seus respectivos cidadãos, que a Rússia.

Empresários alemães e produtores agrícolas franceses que perderam negócios por causa das sanções ficariam – com muita razão – furiosos.

Também poria fim a ilusões que ainda restassem quanto aos europeus e o poder que tenham.

Em diplomacia, manter a aparência de poder é, no mínimo, tão importante quanto conservar o próprio poder. Estado ou grupo de estados que percam seus ares de grande potência expõem-se ao risco de não mais serem levados a sério.

Nesse caso, isso significa que os europeus têm de manter-se numa posição na qual possam pelo menos fingir que as sanções ainda pesariam contra a Rússia no momento em que forem canceladas, para correspondentemente poderem fingir que os russos estariam  cedendo algo em troca.

Obviamente os europeus não podem pretender que alguma coisa disso seria verdade, se levantarem as sanções quando a Rússia estiver em pleno boom de crescimento.

E foi precisamente porque os europeus têm de poder mostrar que os russos estariam cedendo algo em troca do fim das sanções, que eles conectaram (i) o fim das sanções e (ii) o cumprimento do que dispõe o Tratado Minsk 2.

A implementação bem-sucedida do Tratado Minsk II permitirá que os europeus finjam que o sucesso foi efeito de seus esforços. Então, poderão levantar as sanções e se declararem vitoriosos.

Dado que foram os russos quem redigiram o Tratado Minsk 2, a estratégia deve ter parecido de baixo risco. Afinal, sempre se poderia esperar que os russos quisessem implementar um tratado cujos termos eles mesmos redigiram.

O que os europeus não perceberam – provavelmente nem lhes passou pela cabeça – foi que o fracasso no cumprimento de Minsk 2 poderia começar não pelo lado russo, mas pelos próprios ucranianos protegés da Europa. Pois essa, precisamente, é a posição em que os europeus se autometeram e onde agora estão.

Nada disso se explica por o governo ucraniano estar preso, já feito refém de milícias de direita.

Isso se explica por que Minsk 2 contradiz o ethos e todas as metas da "revolução" da praça Maidan, cujo principal objetivo sempre foi criar uma Ucrânia unitária, monolíngue e monocultural, o mais distanciada e separada da Rússia que seja possível.

Discuti tudo isso em artigo que Rússia Insider publicou em janeiro de 2015, na véspera da batalha de Debaltsevo. Repito aqui o que escrevi lá:


"A verdade básica sobre a crise na Ucrânia e por que há guerra lá – verdade que muita gente especialmente no ocidente recusa-se a reconhecer – é que a facção que tomou o poder no golpe de fevereiro de 2014 é estruturalmente incapaz de negociar ou de fazer concessões aos que eles veem como adversários.

(...) Em resumo, o principal objetivo do golpe de fevereiro foi que a facção ucraniana que agora está no poder conseguisse implantar dominação absoluta sobre a sociedade ucraniana, porque esse é o único meio de dar verossimilhança à ideia de uma Ucrânia monolíngue e monocultural que se ponha para sempre bem longe da Rússia.

Dada a diversidade da sociedade ucraniana, aquele governo não pode fazer concessões aos adversários, porque qualquer concessão sempre porá em risco todo o projeto que é a razão da existência do próprio governo e única justificativa para que seja mantido no poder.

Por isso o governo golpista agiu em fevereiro para eliminar da vida política da Ucrânia a facção que governava antes do golpe; por isso também está empenhado em eliminar toda e qualquer oposição que resiste hoje no Donbass."

Tudo isso era válido em janeiro do ano passado e permanece válido hoje.

E continuará a ser assim, seja qual for o líder de Maidan que assuma o poder na Ucrânia. Não faz diferença quem governe, se Poroshenko, Tymosheko, Yatsenyuk, Kolomoisky, Tyagnibok, Paruby, Lyashko, Klitschko, Yarosh ou seja quem for. Nenhum político ucraniano que tenha vínculos com o golpe de Maidan é capaz de garantir as concessões que Minsk II exige. E é erro fundamental supor que, porque os políticos da Maidan ucraniana vivem engalfinhados entre eles, em disputas partidárias ou entre gangues, algum deles seja mais "moderado" que os demais, no que tenha a ver com essas questões.

Até agora, os europeus mantiveram os olhos fechados ante essa realidade. Hoje, ela lhe bate na cara.

Essa é a causa pela qual – diante da impenetrável intransigência dos ucranianos, mas querendo pôr fim ao conflito antes que sumam toda a credibilidade e poder de alavancagem que ainda têm – os ministros de Relações Exteriores da Alemanha, Steinmeier, e da França, Ayrault pelo que se diz, devem viajar a Kiev "completamente furiosos."

Os europeus meteram-se, eles mesmos, na mesma armadilha na qual Yanukovych também se viu apanhado durante os tumultos na praça Maidan.

Como os europeus, Yanukovych tentou negociar com líderes da praça Maidan [aqueles aos quais Victoria Nuland levou sanduíches], como se fossem seres racionais.

O que Yanukovych descobriu, por mais que supusesse que havia firmado um acordo, foi que os líderes de Maidan simplesmente renegaram qualquer compromisso, embolsaram as concessões e continuaram a agitar as ruas, para logo depois reaparecer com mais demandas.

Os líderes ucranianos da praça Maidan agiram sempre desse mesmo modo, ao longo de todo o conflito ucraniano.

Em abril de 2014, aceitaram fazer mudanças constitucionais que garantiriam maior autonomia às regiões da Ucrânia.

Renegaram aquele acordo e ao longo dos poucos meses seguintes fizeram o diabo para esmagar a oposição, pela força, nas regiões do leste da Ucrânia.

Depois que foram derrotados em agosto de 2014, concordaram com garantir status especial ao Donbass, com negociações para alcançar uma solução política (Minsk I).

Não honraram esses compromissos e em janeiro de 2015 novamente atacaram o Donbass.

Em fevereiro de 2015 – depois de terem sido derrotados outra vez – novamente aceitaram garantir status especial ao Donbass. Também aceitaram negociar diretamente com os líderes do Donbass, para definir com eles os termos das eleições locais e mudanças na Constituição da Ucrânia que se aplicariam em novas eleições a se realizar antes do final de dezembro de 2015 (Minsk 2).

Outra vez não honraram os compromissos. Em agosto de 2015 tentaram novamente atacar o Donbass. Dessa vez, os europeus os alertaram para que não insistissem.

Em outubro de 2015, na reunião de Paris, renovaram as promessas de cumprir o assinado no Tratado Minsk II, dessa vez seguindo um cronograma novo, preparado pelos franceses, que teria levado à garantia de status especial para o Donbass e a eleições nesse mês de março.

Outra vez não cumpriram nada do prometido, nada. E já estamos em março e nada do que se comprometeram a fazer em outubro foi feito até hoje. E já chegam notícias de que os combates estão recomeçando no Donbass.

Não surpreende portanto que Steinmeier e Ayraut estejam "completamente furiosos."

Confrontados com a intransigência ucraniana, os europeus tentaram alcançar o que insistem em apresentar como "avanços", pedindo aos russos para que suavizassem os termos do Tratado Minsk II, de modo a, pelo menos, admitirem que as eleições no Donbass se realizam segundo as regras ucranianas no primeiro semestre do ano em curso.

O recente comentário de Juncker, de que a Ucrânia de modo algum seria integrada à OTAN ou à União Europeia nos próximos 20-25 anos (o que, na prática, significa que disse que a Ucrânia nunca será integrada àqueles organismos supranacionais), deve ser interpretado nesse contexto.

O comentário visou a fazer 'um afago' nos russos, divulgando publicamente o que já ficara acertado privadamente em fevereiro de 2015 em Moscou e Minsk, para tentar que os russos suavizem suas exigências no cumprimento do Tratado Minsk II.

Mas os russos não aceitaram a barganha. Como as declarações públicas das autoridades russas só fazem repetir: no que tenha a ver com Minsk II a Rússia continua implacável. Até agora, já rejeitaram todas as tentativas para que suavizassem Minsk II. A Rússia insiste na exigência de que se cumpram todos os itens já negociados e definidos.

É impossível evitar a sensação de que, insistindo sempre em garantir apoio cego ao movimento de Maidan, os europeus meteram-se, eles mesmos, numa arapuca.

Aumentar o apoio que dão à Ucrânia já é praticamente impossível, principalmente por causa da intransigência da Ucrânia e da crise política sempre crescente naquele país.

Retirar todo e qualquer apoio – que implicaria tomar, finalmente, posição pública firme contra Kiev, e exigir que façam tudo que se comprometeram a fazer no acordo Minsk II, integralmente, com ameaça de sanções no caso de infração – também é politicamente muito difícil; provavelmente é impossível enquanto Merkel for chanceler, porque ela investiu na Ucrânia quantidades gigantes do próprio capital político.

Mas a alternativa é total humilhação, que atinge diretamente os europeus. Já não há nem algum remoto vestígio de autoridade ou poder de alavancagem da Europa sobre o governo de Maidan.

Trata-se agora, provavelmente, só de alguns meses, antes de a recuperação econômica da Rússia expor o fracasso da política europeia de sanções – e também de toda a política ucraniana, ambas afinal expostas como blefe.

Isso, que afinal começa a ser compreendido nas capitais ocidentais já foi confirmado em circunstâncias as mais improváveis – em comentários do presidente Obama dos EUA, afinal de contas o autor, em pessoa, da política de sanções. Em recente entrevista que Obama concedeu à revista The Atlantic, lê-se o seguinte:

"Ucrânia é interesse central para os russos, mas não é interesse central para os EUA. Então, a Rússia sempre terá como manter dominação em escalada naquela região.

"O fato é que a Ucrânia, que não é país-OTAN, será sempre vulnerável à dominação militar pelos russos, não importa o que nós façamos" – disse Obama.

Perguntei a Obama se sua posição sobre a Ucrânia era posição realista ou fatalista.

"É realista" – disse ele. – "Mas é um exemplo de caso em temos de ser muito claros sobre onde estão nossos interesses centrais e por quais interesses estamos dispostos a ir à guerra."

Em outras palavras, a Ucrânia interessa aos russos mas não interessa ao ocidente, e os russos são quem tem, lá, as cartas mais altas ("dominação em escalada").

Isso, precisamente, temos repetido incansavelmente com Rússia Insider desde o início.

Foram necessários dois anos, uma guerra civil, milhares de mortos, um colapso econômico, uma crise de governo, um calote internacionaI agora já inevitável, e o fracasso iminente da política de sanções, para que os governantes ocidentais começassem a ver o que realmente acontece no mundo.

E já é tarde demais para evitar a humilhação que muito, muito claramente, já bate à porta da Europa.

Blog do Alok

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