(22-05-2016) Um nutrido grupo de ex-executivos de bancos de investimento internacionais desembarcaram na Economia, Banco Central, CNV, Anses, UIF, YPF, Banco Nación e até no Ministério de Desenvolvimento. JP Morgan é o que possui mais representantes. Também há do Deutsche, Morgan Stanley, Citi, Barclays, Merrill Lynch, Goldman Sachs e Chase.
Uma legião de pelo menos 27 financistas ocupa diferentes cargos estratégicos na estrutura do governo de Mauricio Macri, e a maioria trabalhou em Wall Street. Estão no Ministério da Fazenda e Finanças, Banco Central, Comissão Nacional de Valores, Anses, Unidade de Informação Financeira, YPF, Banco Nación, e até no Ministério de Desenvolvimento Social. É tão impactante este desembarque que surpreende aos próprios protagonistas do mercado financeiro internacional, que o festejam mas ao mesmo tempo lhes gera intriga o experimento. Wall Street está acostumado nos Estados Unidos a colocar em certos cargos chaves algum de seus representantes, para em seguida implantar uma extraordinária capacidade de lobby para conseguir condições que permitam ampliar seu fabuloso negócio sem interferências. A administração Macri foi além e entregou diretamente a gerência de vários organismos estatais ao mundo das finanças internacionais. Wall Street se instalou desse modo na Casa Rosada como não o fez em nenhum outro governo.
Nos governos de Carlos Menem e Fernando de la Rúa a banca internacional apoiou, esteve muito próximo dos funcionários e ganharam muito dinheiro. Mas com Macri diretamente assumiram o controle de áreas sensíveis para seu negócio. E não perderam tempo em começar a valorizar esse espaço privilegiado no poder. Projetaram operações de renegociações de dívida (Tesouro Nacional e Banco Central), colocação de bônus do Estado Nacional (títulos para pagar aos fundos abutres), provinciais (Buenos Aires, Mendoza, Neuquén) e de empresas (YPF), e especulação com as Lebac. Ademais já têm previsto avançar em outros negócios que hoje são negados pelo governo mas que estão na agenda, como a venda dos pacotes acionários de empresas privadas em mãos da Anses e a privatização parcial (Arsat) ou total de empresas públicas logo de asfixiá-las financeiramente afetando dessa maneira a qualidade do serviço, sendo Aerolíneas Argentinas o caso mais evidente.
A banca internacional liderada por JP Morgan e Deutsche Bank ficou com os negócios que se abriram na Argentina a partir do governo de Macri deslocando a bancos nacionais. Na mega emissão de bônus para pagar aos abutres financeiros locais quase não tiveram espaço para suas ofertas, que ficaram concentradas em entidades dos Estados Unidos e Europa. Essa colocação significou um lucro direto em comissões de 29,7 milhões de dólares para o Deutsche Bank, HSBC, JP Morgan, Santander, BBVA, Citigroup e UBS. Mas o filão para esses bancos foi ficar com os bônus a um preço mais baixo que a cotição inicial, que ao subir nos dois dias posteriores significou um lucro de uns 600 milhões de dólares, segundo consignou a agência de informação financeira Bloomberg. Argentina pagou caro, esses bancos internacionais ganharam fortunas e a banca local não pôde morder.
O JP Morgan é o que têm mais representação na gestão de governo. Em 6 de março passado se informou neste mesmo espaço a presença de quatro ex-executivos dessa entidade (Alfonso Prat Gay, Luis Caputo, Vladimir Werning e Demian Reidel) em cargos relevantes (“JP ao poder”), situação que já de por sí era impactante. Mas a suspeita de que não eram os únicos derivou numa paciente búsca em organogramas de dependências estatais, tarefa nada simples porque em vários não está publicado, em outros não informam os nomes de todos os funcionários a cargo, quando o fazem não detalham os curriculum vitae e a maioria não responde a requerimentos de informação solicitados por este jornal.
O saldo desse trabalho é o quadro que se publica acompanhando este artigo, onde se observa que além do JP Morgan existem ex-executivos de outros grandes bancos internacionais em dependências públicas. São da Goldman Sachs, Morgan Stanley, HSBC, Citi, Deutsche, Chase, Barclays, Merrill Lynch.
A banca nacional está representada somente pelo Galicia com um par de executivos que passaram a ocupar cargos no Banco Nación. O outro banco local privado de envergadura, o Macro, até agora não teve espaços para alguns de seus executivos, exclusão que se explica por questões políticas vinculadas ao ex-homem forte da entidade, Jorge Brito, banqueiro que cresceu com o alfonsinismo, se consolidou com o menemismo, avançou com o duhaldismo e se expandiu com o kirchnerismo, até ser um importante financista do massismo. Este recorrido, somado a diferenças políticas com seu sócio histórico (Delfín Ezequiel Carballo), teve como consequência o isolamento do Macro nestes meses do macrismo, e um golpe de timão na gerência do banco impulsado por Carballo em aliança com a Anses (o organismo estatal têm o 30,9 por cento das ações), deixando a Brito como presidente formal. O titular deo Fundo de Garantia de Sustentabilidade da Anses, Luis María Blaquier (ex-Goldman Sachs), será um dos diretores do Macro, e aliado de Carballo nessa manobra.
Quém é quém
Luis María Blaquier, sobrinho de Carlos, presidente de Ledesma, também formou parte do diretório do Grupo Clarín e é sócio do Grupo Pegasus, liderado por Mario Quintana, coordenador de gabinete econômico do governo. Blaquier trabalhou treze anos na Goldman Sachs. No mundo das finanças também se desempenhou na Alliance Capital Management. Matías Tamburini, do Deutsche Bank, o acompanha na gestão do estratégico FGS da Anses, que acumulou ativos por 719.708 milhões de pesos, em 31 de março deste ano. Outro dois financistas se somaram a sua equipe. Um é Sebastián Peña Mc Gough, como coordenador do cartão Argenta, administrada pelo FGS-Anses, proveniente do Banco de Investimentos MBA Lazard que em fevereiro de 2014 passou a denominar-se Banco Voii (em sua página web se explica que “é um nome simples que remete a ação de “ir”). Outro é Enrique Boilini que se encarrega do departamento Investimentos do FGS-Anses, com antecedentes trabalhistas no First Boston Corp e em Yellow Jersey Capital.
No Banco Central, além dos financistas que rodearam a Federico Sturzenegger em sua passagem pelo Banco Cidade que agora o acompanham na entidade monetária, se somou outro JP Morgan como diretor, Demian Reidel, quem também passou pela Goldman Sachs. Um cargo chave foi para um homem do Morgan Stanley, Agustín Collazo, que saltou dessa entidade a ter uma ativa participação na estratégica mesa de dinheiro do Banco Central. Na city comentam que o período de aprendizagem de Collazo para operar desde a bancada do BC resultou muito produtivo para as finanças de vários bancos. Outro diretor do BCRA é Horacio Tomás Liendo (neto), filho de quem foi secretário de Coordenação Legal, Técnica e Administrativa do Ministério de Economia durante a década dos noventa com Domingo Cavallo, e neto do general que comandou o Ministério do Trabalho na ditadura militar. Iniciou sua carreira profissional no estudio Marval, O’Farrell & Mairal e antes de entrar no diretório do BCRA trabalhava no Banco ICBC.
A Comissão Nacional de Valores é o organismo encarregado da regulação e controle dos diferentes atores do mercado bursátil. A manipulação dessa instituição requer manter critérios de independência e estar afastada dos interesses dos homens das finanças. Essa missão é um dos grandes desafíos de Marcos Ayerra na condução da CNV tendo em conta seu passado laboral no Chase Securities, entidade financeira que foi absorvida pelo JP Morgan. Um dos diretores que o acompanham na gestão, Carlos Hourbeigt, se enfrenta a igual missão ao vir de Copernico Capital Partners, empresa fundada em 1999 pelos financistas Ricardo Maxit e Mariano Caillet-Bois. Em Copernico, Hourbeigt foi “sênior portfólio manager & partner” de 2000 a 2007, para logo mudar-se ao Deutsche Bank.
O caso mais surpreendente é o de Gabriel Castelli porque, a diferença de seus colegas financistas, não descreveu o salto a função pública a uma área de economía, senão que assumiu o cargo de vice-ministro de Desenvolvimento Social. Ao divulgar-se sua nomeação grandes meios destacaram que esteve a frente de Cáritas, a principal instituição solidária da Igreja na Argentina, durante dois períodos (2006 a 2012).
Nos últimos três anos foi presidente da Comissão Justiça e Paz, que congrega a personalidades católicas laicas e depende da Conferência Episcopal. Esclareceram que também foi diretor externo do ICBC Bank e de Loma Negra, membro do comitê executivo de Farmacity (do Grupo Pagasus, liderado pelo mencionado Mario Quintana) e diretor financeiro do Grupo HSBC de 1997 a 2004. É uma originalidade de gestão do governo de Macri: o Ministério de Desenvolvimento Social está gerenciado por Carolina Stanley, filha de um ex-executivo do Citibank (Guillermo Stanley), e por um homem do mundo das finanças.
Relações carnais
“Wall Street a cargo da Argentina (outra vez)”, titulou um artigo a agência especializada em economia e finanças Bloomberg em 10 de março passado, quando a equipe econômica informou sobre um acordo com os fundos abutre em que se comprometeu a pagar em efetivo a sentença do juiz Thomas Griesa. Dois meses depois, o britânico Financial Times publicou “Argentina recupera sua relação com Wall Street”, artigo de seu enviado a Buenos Aires Benedict Mander onde repassa a nova relação do governo de Mauricio Macri com as finanças internacionais.
Os dois meios de comunicação com estreitos laços com bancos globais destacaram a presença no Palácio da Fazenda de ex-executivos do JP Morgan e Deutsche Bank. O ministro Alfonso Prat Gay se incorporou ao JP Morgan em 1994, quase ao mesmo tempo que o secretário de Finanças Luis Caputo. O sub-secretário de financiamento Santiago Bausili se somou a essa entidade um par de anos mais tarde, ao igual que Vladimir Werning, o economista que agora atua como Secretário de Política Economica. O caso de Werning é muito forte porque não houve tempo de espera em outra empresa: antes de assumir esse cargo na pasta da Fazenda e Finanças era o economista chefe para América latina do JP Morgan.
Bloomberg descreveu que “Wall Street volta a se mostrar à favor desta nova Argentina, e ao máximo. Desde sua vitória em novembro, o presidente Mauricio Macri, um homem de negócios, encheu sua administração com membros de setores exportadores, financeiros, economistas e executivos corporativos”. Para logo alertar que “não é o tipo de estratégia que um líder poderia considerar neste momento, digamos, nos Estados Unidos, Espanha ou Grécia, lugares onde a rejeição contra o financeiro chegou a um ponto alto nos últimos anos”.
O Financial Times também elogia a estratégia econômica do governo de Macri contrastando-a ao “intervencionismo” que predominou durante o kirchnerismo, ao mesmo tempo em que destaca o impactante desembarque na Casa Rosada de homens que trabalharam em Wall Street. Mas no final do artigo faz uma advertência através de uma declaração do diretor gerente do fundo Advanced Capital, Agustín Honig, quem recordou a crise de 2001 e que o presidente Fernando de la Rúa fugiu em helicóptero da Casa Rosada. “O governo de De la Rúa fez o que Wall Street disse que tinha que fazer no país, e explodiu”, afirmou. Então o jornalista conclui sua crônica planteando dúvidas acerca de se um gabinete com banqueiros pode estar capacitado para fazer frente a alguns dos problemas do mundo real que enfrentam, entre eles, o conflito sindical pela defesa de postos de trabalho, a resposta social pelo tarifaço e a inflação elevada de dois dígitos.
Fonte: pagina12.com.ar
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