A Cúpula de Varsóvia e o blefe temerário da OTAN, por Alexander Mercouris - Noticia Final

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domingo, 10 de julho de 2016

A Cúpula de Varsóvia e o blefe temerário da OTAN, por Alexander Mercouris

Alexander Mercouris, The Duran

Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu

"Em 2009, o presidente Obama falou a uma multidão de adoradores no centro de Praga, coração da Europa. Jurou que se empenharia pessoalmente em "livrar o mundo de armas nucleares". Houve gritos e aplausos, algumas lágrimas. A mídia submergiu numa torrente de lugares-comuns. Obama, por causa disso, recebeu o prêmio Nobel da Paz. Tudo falso. Obama estava mentindo" ("A world war has begun. Break the silence" [Começou nova guerra mundial. Gritem. Quebrem o silêncio] John Pilger, 20/3/2016).
A decisão da OTAN, de alocar quatro batalhões supostamente rotativos na Polônia e nos Estados Bálticos é a pior decisão que se poderia imaginar. Mas temos de manter a calma. Não significa que a guerra esteja chegando.

Os quatro batalhões que a OTAN está alocando na Polônia e nos Bálcãs não pode ameaçar a Rússia. Circulam conversas alucinadas de que tanques alemães ter-se-iam aproximado de São Petersburgo pela primeira vez desde o final da 2ª Guerra Mundial. Estive recentemente naquela cidade. Qualquer ideia de que a OTAN conseguiria tomar ou mesmo ameaçar seriamente São Petersburgo, com apenas quatro batalhões, cerca de 3 mil homens –, quando o Grupamento Norte do Exército de Hitler, com 23 divisões e apoiado por exército finlandês de mais sete divisões nada conseguiu, é ideia simplesmente imbecil.
Não só a força que a OTAN está deslocando para a Polônia e os Bálticos é incapaz de ameaçar seriamente a Rússia, mas também, no evento de um ataque russo, aquela 'força' da OTAN seria insuficiente até para se autodefender. Até especialistas ocidentais, em veículos da mídia comercial ocidental já admitiram. Dizem que os soldados da OTAN visam a funcionar apenas como "cerca de arame" para deter ataque russo à Polônia e aos Estados Bálticos.

Não há ataque russo algum, em planejamento ou que tenha sido ameaçado contra Polônia ou Bálticos. Ninguém está dizendo que haveria sequer uma ínfima possibilidade de ataque desse tipo. Se os líderes da OTAN realmente temessem algum ataque desse tipo, teriam de alocar soldados nos Estados do Báltico, e em missão que seria efetivamente missão suicida, porque seriam imediatamente atropelados pelas forças militares que os russos podem pôr naquela região imediatamente. Nem os generais da OTAN são assim tão perfeitamente estúpidos.

Quanto à ideia de que as tropas naquele ponto visariam a reforçar a mensagem de que a OTAN cumprirá o compromisso gerado pelo Art. 5, de defender os Estados do Báltico, contra ataque russo... Bem, a OTAN, ali, está fazendo exatamente o oposto disso: está mostrando que o compromisso do Art. 5 não é tão sólido e firme quanto se quer fazer crer; e que nem russos nem a OTAN realmente acreditam que seja. E, se fosse sólido e firme, por que seria necessário "reforçá-lo"?

Tudo isso considerado, por que a OTAN está alocando essa força militar para a Polônia e os Estados Bálticos? Será talvez parte de plano maior para, com o tempo, reunir ali mais e mais forças para eventualmente ameaçar a Rússia?

Bem pouco provável! A realidade – como todos os analistas militares sérios sabem – é que os militares dos EUA, que são o núcleo duro da OTAN, está gravemente super distendido e não tem reservas para fazer novos deslocamentos ou alocações de pessoal nessa região, ao mesmo tempo em que as capacidades e comprometimentos dos aliados dos EUA na OTAN são hoje tão miseravelmente pobres que é duvidoso que possam ameaçar seriamente alguém. Se militares britânicos e franceses, lutando juntos, não conseguiram derrotar o exército de Gaddafi sem pedir socorro aos EUA em 2011 no curso da aventura líbia, é claro que não têm condições que lhes permitam atacar a Rússia. E tampouco seria o exército alemão, que hoje nada tem a ver com o que foi na 2ª Guerra Mundial.

A verdadeira razão por que a OTAN está alocando soldados na Polônia e nos Estados Bálticos nada tem a ver com qualquer das razões que circulam por aí. É que a OTAN anda à cata de algum modo para mostrar publicamente que mais uma vez considera a Rússia como inimiga; esses deslocamentos de soldados e armamentos, altamente provocativos e ilegais são o modo de fazer isso. A OTAN conta com que, desse modo, conseguirá mobilizar a opinião europeia a favor dessa sua mais recente campanha anti-Rússia.

É atitude ao mesmo tempo temerária e estúpida. Efetivamente rasga também outro acordo e viola a promessa que a OTAN fez à Rússia ao final da Guerra Fria, de que não instalaria militares ocidentais nos territórios do Pacto de Varsóvia. A OTAN diz ao povo e ao governo da Rússia – o país incomparavelmente mais poderoso da Europa –, que a OTAN os considera inimigos. E o faz de modo tão escandaloso, que qualquer analista militar sério – e os há na Rússia, em grande quantidade – imediatamente perceberá o blefe.

Quanto a mobilizar a opinião pública europeia a favor da campanha anti-Rússia da OTAN, o efeito é diametralmente oposto. Tudo que a conversa de guerra e de deslocamentos militares está conseguindo é alarmar a opinião pública ocidental, levando a mais e mais questões sobre o que a OTAN está tentando e para onde vai. 

Governantes de Itália e França, para tranquilizar os respectivos cidadãos, tiveram de declarar publicamente que não consideram a Rússia estado inimigo, o que só levará os mesmos cidadãos a perguntarem por que, se a Rússia não é inimiga, aqueles governos continuam a admitir que prossiga a perigosa movimentação de soldados e armamento. 

Na Alemanha, já há cisão visível entre Merkel – que apoia a política da OTAN, como disse claramente em discurso linha-dura ao Parlamento alemão – e os partidos de sua coalizão, os social-democratas (SPD) e a União Cristã-Democrata (CSU) partido da própria Merkel, partidos que se opõem à ação descabelada da OTAN na Europa.

Uma política que consiga assustar e provocar, mas é blefe, tudo ao mesmo tempo, claramente não é política construída com inteligência e ponderação. 

O Relatório da Comissão Chilcot sobre o modo como foi conduzida a guerra do Iraque já expôs, por esses dias, a absoluta falta de honestidade básica, de reflexão aprofundada e de planejamento consistente, naquela guerra. Em relação à Rússia – que é potência nuclear – a OTAN está agindo exatamente do mesmo modo.

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