MK Bhadrakumar, Indian Punchline
Os desenvolvimentos na Turquia estão passando por virada dramática. Tudo indica que o governo turco já tem comprovação definitiva de que a tentativa de golpe militar contra o governo de Erdoğan foi orquestrada pelos EUA (Anadolu).
O ministro da Justiça Bekir Bozdag disse abertamente, em entrevista televisionada, que
"Os EUA sabem que Fethullah Gülen (o clérigo que vive na Pennsylvania) promoveu esse golpe. O Sr. Obama sabe disso tão bem quanto do próprio nome. E estou convencido de que a inteligência dos EUA também tem pleno conhecimento."
Bozdag é conhecido como um dos associados políticos mais próximos do presidente Recep Erdoğan. Semih Idiz, bem informado comentarista político turco escreveu que
"Essa certeza [o que Bozdag disse pela TV] inclui o presidente Recep Tayyip Erdoğan. Implica que, sim, Washington sabia o que estava sendo urdido e não alertou Ancara. A mídia islamista governista chegou a dizer que os EUA, com esse golpe, tentavam assassinar Erdoğan."
A violência do atentado e o voto de confiança de Erdoğan atraíram a solidariedade dos dois principais partidos de oposição na Turquia – o partido Kemalista CHP (Partido Republicano) e o partido nacionalista MHP (Partido do Movimento Nacionalista). O partido governante AKP (Partido Justiça e Desenvolvimento), CHP e MHP puseram de lado as diferenças políticas e declararam apoio à exigência que Ankara encaminhou a Washington, de que extraditasse o clérigo islamista Fetullah Gülen. Sem dúvida, essa grande reconciliação pode ter implicações adiante, para a fraturada paisagem política turca (VOA).
O líder do MHP Davlut Bahceli manifestou-se publicamente sobre uma possível conspiração, provavelmente com raízes fundas nos EUA, para criar condições de guerra civil na Turquia. Bahceli disse também que o golpe foi concebido a partir da base aérea Incirlik usada pelas forças dos EUA, sob supervisão do comandante norte-americano no Afeganistão. Dois generais turcos que servem no Afeganistão foram presos pela inteligência turca no aeroporto de Dubai.
Bahceli apresentou uma moção ao Parlamento, na qual requer que se esclareçam os "rumores" de que a CIA estaria por trás do complô. Haverá novidade importante, se o governo revelar os detalhes que já conhece. A mídia turca noticiou que Ankara alertou as autoridades no Paquistão sobre as escolas de elite dirigidas pela organização de Gülen naquele país (sobre isso, ver o relatório de Deutsche Welle Secular Pakistanis resist Turkey's 'authoritarian demands [Paquistaneses seculares resistem contra demandas 'autoritárias' da Turquia]).
O governo Obama dificilmente extraditará Gülen, dado o papel chave que tem em operações de inteligência dos EUA na região da Ásia Central; e a Turquia fez, com o pedido, um teste crucial para aferir a boa vontade e a sinceridade dos EUA como aliados. Significativamente, o New York Times publicou artigo no fim-de-semana, assinado por Gülen, no qual pede que Washington não o extradite. Para Gülen:
"O objetivo dele [de Erdoğan]: Garantir minha extradição, apesar de não haver prova crível e nenhuma possibilidade de julgamento justo. A tentação de dar ao Sr. Erdoğan tudo que ele deseja é compreensível. Mas os EUA devem resistir."
Washington sabe, provavelmente, que um impasse com Ankara pode tornar-se inevitável em futuro muito próximo, em torno da questão Gülen. O Departamento de Estado dos EUA já recomendou que familiares e dependentes do pessoal diplomático que opera na Turquia deixem o país. Outro comunicado aconselhava cidadãos norte-americanos a "reconsiderar planos de viagem à Turquia nesse momento" (aqui).
Nesse quadro, torna-se extremamente significativa a notícia de que o presidente Erdoğan viajará a São Petersburgo, Rússia, para encontrar-se com o presidente Vladimir Putin, dia 9 de agosto.
Será a primeira viagem de Erdoğan ao exterior, e ele está sinalizando claramente que restaurar laços de amizade com a Rússia é sua mais alta prioridade. Claro, Erdoğan vai em busca também de cooperação próxima entre agências de inteligência de Turquia e Rússia. Hoje, o importante colunista turco Murat Yetkin escreveu:
"A questão que paira no ar é se a Rússia, cujos serviços de inteligência foram acusados pelo Partido Democrata dos EUA de interceptar suas comunicações eletrônicas, entregará a Erdoğan provas materiais que liguem Gülen aos conspiradores. Com certeza, está havendo muita troca de informações, como revelado por Çavuşoğlu, que disse que a Turquia alertara vários países, inclusive a república centro-asiática do Quirguistão, sobre possível tentativa de golpe naquele país, organizado por Gülenistas infiltrados no aparelho do Estado, mediante a rede de escolas. Moscou já fechou toda a rede de escolas de Gülen na Rússia, acusadas de cooperarem com a CIA."
A reunião entre Putin e Erdoğan promete ser momento de definição para as relações da Rússia com o ocidente, na era pós guerra fria. Se um grande país da OTAN, como a Turquia, atravessa a 'linha vermelha' e estabelece laços com a Rússia no presente momento, será desafio estratégico direto contra a estratégia de 'contenção' dos EUA, contra a Rússia. Pode se converter em tropeço mais dramaticamente maior e mais importante, nas estratégias regionais dos EUA, que a Revolução Islâmica do Irã, em 1979, porque enfraquece todo o sistema da aliança ocidental.
A Europa, principalmente, esperará sem respirar pelo destino do 'negócio' de um para lá, um para cá, com a Turquia por causa do fluxo de refugiados. Erdoğan disse à TV alemã, na 3ª-feira, que a Europa não é interlocutora 'sincera'. É questão terrivelmente controversa na Europa, dadas as sombras do terrorismo que se alongam sobre o continente. E a chanceler alemã está sob crescente pressão popular para que renuncie (BBC, AFP).
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