Toni Cartalucci, New Eastern Outlook, NEO
Traduzido pelo coletivo da vila vudu
Foram vários mortos e muitos feridos nos ataques terroristas coordenados contra a capital do Irã, Teerã. Tiros e bombas no Parlamento iraniano e no mausoléu do Aiatolá Khomeini.
Segundo a Reuters, o chamado "Estado Islâmico" reivindicou a autoria do ataque, desencadeado apenas poucos dias depois de outro ataque terrorista, aquele em Londres. O Estado Islâmico também reivindicou autoria da violência em Londres, apesar de já haver provas de que os três suspeitos de envolvimento já serem conhecidos da segurança e das agências de inteligência britânicas, há muito tempo. Simplesmente teriam sido deixados à vontade para organizar os ataques e atacar.
É muito menos provável que o governo de Teerã acoberte terroristas – Teerã há anos luta contra o terrorismo nas fronteiras do país e na Síria, numa guerra viciosa, que já se arrasta há seis anos alimentada por armas, dinheiro e mercenários dos EUA, da Europa e do Golfo Persa.
Violência armada contra Teerã sempre foi o objetivo confesso de políticos norte-americanos
Os recentes ataques terroristas em Teerã são a manifestação literal da política externa dos EUA. A criação de uma força 'representante' dos EUA para fazer guerra contra o Irã e criar um paraíso seguro para os norte-americanos em terras iranianas é política há muito tempo declarada dos norte-americanos. O atual caos que consome Síria e Iraque – e em menos extensão o sudeste da Turquia – é resultado direto da tentativa dos EUA para criar uma base de operações a partir da qual lançar sua guerra 'por procuração' contra o Irã.
Num documento de 2009 da Brookings Institution, intitulado Which Path to Persia? Options for a New American Strategy toward Iran [Qual o caminho para a Pérsia? Opções para uma nova estratégia norte-americana para o Irã], aquele think-tank já considerava a possibilidade de usar a organização Mujahedin-e Khalq (MEK), então listada pelo Departamento de Estado como organização estrangeira terrorista, como 'representante local' dos EUA para instigar uma insurgência armada ampla, não diferente da que hoje se vê acontecer na Síria.
O relatório dizia explicitamente:
Os EUA podem também tentar promover grupos da oposição iraniana, provendo o necessário apoio, para convertê-los em insurgências e mesmo ajudá-los a derrotar militarmente as forças do regime dos clérigos. Os EUA podem trabalhar com grupos como o Conselho Nacional de Resistência do Irã [ing. National council of resistance of Iran (NCRI) que tem base no Irã e sua ala armada os Mujahedin-e Khalq (MEK), auxiliando os seus milhares de membros os quais, sob o regime de Saddam Husayn foram armados e conduziram operações de guerrilha e terroristas contra o regime dos clérigos. Embora o NCRI esteja hoje desarmado, como se supõe, essa situação pode ser rapidamente modificada.
Os políticos da Brookings admitiram, nesse relatório, que o MEK foi responsável por mortes de militares, políticos e civis norte-americanos e iranianos, em ações indiscutivelmente terroristas. Apesar disso, e de admitir que o MEK continuava a ser organização terrorista, os analistas da Brookings recomendavam que fossem tirados da lista do Departamento de Estado dos EUA de Organizações Terroristas Estrangeiras, para que pudessem ser apoiado e participar de ações para mudança armada de regime.
A partir dessas recomendações e de lobbying intenso, o Departamento de Estado dos EUA acabaria por excluir o MEK daquela lista em 2012, e o grupo receberia abertamente significativo apoio dos EUA. Entre esses apoiadores estavam vários membros da campanha eleitoral do hoje presidente Donald Trump – incluindo Rudy Giuliani, Newt Gingrich e John Bolton.
Mas apesar de todos esses esforços, os terroristas do MEK não conseguiram, nem naquele momento nem hoje, alcançar o pretensioso objetivo de desencadear insurreição ampla contra o governo de Teerã, o que exigiu que se usassem outros grupos armados. O documento de 2009 da Brookings fazia referência a outros candidatos, numa seção intitulada "Possíveis agentes locais étnicos", e listava grupos árabes e curdos como candidatos possíveis a agentes 'locais' dos EUA numa guerra à distância dos EUA contra Teerã.
Numa sessão intitulada "Conseguir um conduíte e um paraíso seguro", Brookings escreve:
Igualmente importante (e com a mesma dificuldade potencial) será encontrar país vizinho disposto a servir como conduíte para a ajuda dos EUA para o grupo insurgente, e para prover um paraíso seguro onde o grupo possa treinar, planejar, organizar, recuperar-se e se reabastecer.
Para a guerra dos EUA na Síria, Turquia e Jordânia cumprem esse papel. Para o Irã, é claro que os esforços dos EUA terão de se focar em estabelecer conduítes e paraísos seguros a partir da província Baloquistão, a sudoeste do Paquistão, e das regiões dominadas pelos curdos, no norte do Iraque, leste da Síria e sudeste da Turquia – precisamente onde o atual levante está sendo instigado por intervenção dos EUA, tanto abertamente quanto cladestinamente.
Brookings notou em 2009 que:
Seria difícil encontrar ou construir uma insurgência com alta probabilidade de sucesso. Os atuais candidatos são fracos e divididos, e o regime iraniano é muito forte para os desafiantes internos e externos potenciais.
Um grupo não mencionado pela Brookings em 2009, mas que existe na própria região onde os EUA procuram criar um conduíte e paraíso seguro para guerra à distância com o Irã, é o Estado Islâmico. Apesar do muito que se diz que seria organização terrorista independente sustentada pelo mercado negro de petróleo, sequestros e impostos locais, a capacidade de combate do grupo, redes logísticas e alcance operacional demonstram que, sim, eles recebem rico patrocínio estatal.
O 'representante' perfeito, perfeitos conduíte e paraíso seguro
O Estado Islâmico, com tentáculos que vão até o Irã, o sul da Rússia e até a China ocidental era 'representante' possível e, mais que isso, seria a progressão inevitável e lógica da política dos EUA como exposta pela Brookings em 2009 e atentamente executada, como se pode ver, até hoje.
O Estado Islâmico é o perfeito 'representante à distância' [ou 'procurador'], como conduíte ideal e paraíso seguro para fazer a guerra dos EUA contra o Irã e até mais. Cercando cada área de que o Estado Islâmico se apossa, há as bases militares dos EUA, inclusive as que foram construídas ilegalmente no leste da Síria. Tão logo comece a guerra que os EUA planejam fazer contra o Irão, aqueles 'agentes' imediatamente – por coincidência! – logo se coordenarão contra Teerã, assim como estão sendo hoje coordenadas 'por coincidência' contra Damasco.
Usar terrorismo, extremistas e 'agentes/procuradores à distância' para pôr em prática políticas exteriores dos EUA, e usar extremistas objetos do mesmo tipo de doutrinação que o Estado Islâmico e a Al Qaeda foram táticas definitivamente comprovadas durante os anos 1980, quando os EUA, com ajuda de Arábia Saudita e Paquistão – usou a Al Qaeda para tentar expulsar as forças soviéticas do Afeganistão. Esse exemplo é até mencionado claramente pelos políticos da organização Brookings, como modelo a partir do qual se criar outra guerra 'por procuração' – agora contra o Irã.
Para os EUA, não há força mais bem situada para fazer as vezes da Al-Qaeda que seu sucessor o Estado Islâmico. Os políticos dos EUA demonstraram desejo de usar organizações terroristas conhecidas para fazer guerras por procuração, à distância, contra nações-estados que os EUA definam como alvos, o que já foi feito no Afeganistão, e já organizaram claramente o tabuleiro do jogo geopolítico em torno do Irã, para facilitar aquela velha agenda já exposta em 2009. Com terroristas agora matando pessoas em Teerã, impossível não ver que a mesma agenda continua a avançar.
O envolvimento do Irã no conflito sírio ilustra que Teerã sabe perfeitamente dessa conspiração e já cuida ativamente de se defender contra ela, dentro e além das próprias fronteiras. A Rússia também é alvo explicitado da guerra à distância, por procuração, na Síria, e o país também se envolveu na solução daquele conflito, para deter a guerra na Síria, antes de ela se expandir.
O papel da China, pequeno, mas crescente, está diretamente conectado à inevitabilidade de essa instabilidade espalhar-se e alcançar a província Xianjiang, no leste.
Por mais que atos terroristas na Europa, inclusive o recente ataque em Londres, sejam expostos como 'provas' de que o Ocidente 'também' estaria sendo convertido em alvo do Estado Islâmico, evidências mostram realidade bem diferente. Os ataques, muito mais provavelmente, têm o objetivo de gerar negabilidade plausível.
Na realidade, o Estado Islâmico – como antes dele a Al-Qaeda – depende de vastíssimo patrocínio de vários estados, hoje pago por EUA, Europa e seus aliados regionais no Golfo Persa. É patrocínio que todos esses podem, se quiserem – expor e encerrar. Simplesmente não o fazem, porque a ação desses grupos terroristas é importante para o projeto de hegemonia regional e global daqueles seus patrocinadores.
O documento da Brookings em 2009 é confissão datada e assinada de que o ocidente há muito tempo cogita de usar o terrorismo como ferramenta geopolítica. Enquanto as manchetes dos veículos da mídia-empresa ocidental insistem que nações como Irã, Rússia e China ameaçariam a estabilidade global, vai-se tornando cada dia mais claro que quem faz isso é o próprio ocidente, na luta insana por preservar a própria hegemonia global.
blogdoalok
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