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sábado, 2 de setembro de 2017

O xis da questão no 'impasse' afegão, por MK Bhadrakumar

MK Bhadrakumar, Indian Punchline

Traduzido pelo coletivo da vila vudu

A agência Associated Press distribuiu matéria exclusiva sobre o intenso diálogo político hoje em curso entre o governo afegão e os Talibã, nas coxias, inobstante o 'impasse' que pareça haver e do qual tanto se fala. Que os contatos estão ocorrendo é segredo amplamente conhecido, mas a matéria da AP é específica quanto à alta frequência dos encontros e revela que são contatos de muito alto nível. Não há razão para que se duvide do que diz a AP, que cita fontes de autoridade.
Assim sendo, há aqui dois aspectos – o momento em que ocorre o 'vazamento' e o conteúdo do vazamento. Curioso, quanto ao timing, é que o 'vazamento' aparecer apenas dez dias depois do discurso do presidente Donald Trump dos EUA, no qual delineou os passos adiante no Afeganistão. Para dizer o mínimo, o vazamento obriga a ver com mais realismo e moderação a recém proclamada nova estratégia dos EUA e lhe dá 'rosto humano'. Sem dúvida o nível de conforto no Paquistão deve subir alguns semitons, no mínimo.

Muito obviamente, alguma fonte bem informada com acesso a documento 'Top Secret' de restrição máxima partilhou a informação com a AP. Só pode ser fonte afegã de alto nível próxima da liderança em Cabul, ou alguma potência estrangeira (como os EUA) que tem interesse máximo em conhecer em tempo real tudo o que seu regime vassalo em Cabul ande fazendo.

A matéria da AP 'expõe' ostensivamente dois oficiais chaves no cenário de Cabul – o chefe da inteligência do Afeganistão Massoum Stanikzai e o Conselheiro para Segurança Nacional Mohammed Haneef Atmar. Ora... São as duas mais importantes figuras que comandam todo o aparelho da inteligência afegã. São ambos auxiliares nos quais o presidente Ashraf Ghani confia. Essas elites em Cabul têm origem nas tribos pashtuns da Confederação Ghilzai – à qual pertence também Gulbuddin Hekmatyar – que também tem as mãos postas nas alavancas do poder. E ambos, Stanikzai e Atmar são prestigiados pelos EUA e pela OTAN. (Ambos foram treinados na Grã-Bretanha – embora Atmar tenha esteja na inteligência afegã desde a era soviética.) Chama a atenção o quanto a matéria da AP dedica-se a garantir que a imagem desses dois espiões-mestres não seja arranhada.

Claro, a linha crucial fica para o fim da matéria da AP, para que os Talibã deixem de exigir uma 'folga' da ocupação norte-americana no país deles como pré-condição para qualquer acordo. A observação é atribuída a uma figura antiga dos Talibã, Abdul Hakim Mujahed, anjo decaído que agora pertence àquele clã exótico dos que os norte-americanos chamam de 'Talibã Moderados'. As palavras de Mujahed – como, antes, na matéria da AP, as observações de Anatol Lieven – servem à finalidade de destacar que os Talibã são, na realidade, gente pragmática que conhece a arte do possível em negociações, gente com a qual a comunidade internacional pode fazer negócios.

O comentário de Lieven também é muito significativo – a saber, que "elites existentes" na estrutura de poder em Cabul serão amaldiçoadas por partilharem o poder com os Talibã, ou por entrar em acordo com os Talibã. Quem seriam essas elites que se intrometeriam na trilha da reconciliação com os Talibã?

Fato é que tudo isso deveria ser objeto de exame e reflexão para os políticos indianos e o 'comentariato' do establishment em Nova Delhi. Para começar, todo esse assunto de contraterrorismo contra os Talibã é pura conversa fiada. A Índia não deve levar excessivamente a sério a 'notícia' de que os EUA estão interessados em lutar contra os Talibã, os quais não há esforço de imaginação que consiga converter em algum tipo de 'ameaça' à 'segurança da pátria' norte-americana. No cerne disso tudo, o que está acontecendo no Afeganistão é uma luta fratricida, na qual várias potências estrangeiras se envolveram em nome de interesses exclusivos delas próprias.

Em segundo lugar, pressupor que Trump estaria convidando a Índia a participar do fim da guerra afegã é, no mínimo, risível. O que diz Lieven, sobre motivos políticos que os generais de Trump teriam para levantar a bola para a Índia (a saber, para cutucar os Talibã e o Paquistão) não deve ser levado a sério em Delhi. 

Infelizmente, alguns analistas indianos apressaram-se a oferecer a 'interpretação' segundo a qual a estratégia afegã de Trump seria "fator que mudaria todo o jogo para a Ásia e uma oportunidade para a Índia." Nada mais fantasioso que tais 'conclusões', que só podem levar a Índia à posição de abanadora de rabo como os demais poodles dos norte-americanos na região.


Dito bem simplificadamente: Trump quer que a Índia ponha mais dinheiro sobre a mesa – é isso, nada mais, nada menos. No esquema Trump do mundo não há papel militar para a Índia no Afeganistão. Os norte-americanos sabem muito bem que sem que o Paquistão embarque no trem dos EUA, jamais será possível qualquer acordo durável no Afeganistão. De fato, o ministro de Relações Exteriores do Paquistão Asif Khawaja já reconheceu precisamente isso no que disse à Comissão do Senado, em Islamabad no domingo.

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