Cairo (Prensa Latina) O inesperado aluvião de ofertas de ajuda para a reconstrução de Gaza constitui uma evidência tangível de uma virada perceptível na opinião pública mundial em relação ao conflito palestino-israelense.
O conclave seguiu a sinais provenientes da comunidade internacional que resultam desfavoráveis a Israel, entre eles a decisão do governo sueco de reconhecer a Palestina como Estado independente e a votação no Parlamento britânico que pede que se adote uma decisão similar.
Apesar da reação de porta-vozes oficiais em Tel Aviv, que qualificaram o premiê sueco, Stefan Lofven, de "ignorante e apressado", e a ameaça de que o reconhecimento diplomático só servirá para "dar expectativas desmedidas aos palestinos", o passo tem um significado político substancial.
Mais ainda em momentos em que o presidente palestino tem manifestado a intenção de prosseguir a campanha diplomática para conseguir o reconhecimento da ONU a Palestina como membro de pleno direito.
Na segunda-feira passada, o secretário geral da ONU, Ban Ki moon, sempre muito contido em suas alusões a Israel, advertiu ao governo do premiê Binyamin Netanyahu contra a continuação das "provocações em Jerusalém" por parte de judeus extremistas.
Nesse mesmo dia tinham-se reportado choques entre polícias das forças ocupantes e fiéis muçulmanos que trataram de impedir o ultraje por judeus extremistas à mesquita de Al Aqsa, um dos três lugares mais sagrados do Islã junto aos templos de Meca e Medina, na Arábia Saudita.
Um dos fatos subjacentes na conferência mundial de doadores celebrada nesta capital é que as propostas de ajuda a Gaza não consideraram o estigma que pesa sobre o movimento Hamas na forma de sua inclusão em uma lista de grupos terroristas, capitalizado por Israel para justificar suas frequentes agressões.
Esse novo quadro é uma das consequências das sete semanas de ataques contra Gaza que deixaram um tétrico saldo de quase 2.200 civis mortos, em sua maioria mulheres e crianças, mais de 11 mil feridos e mutilados e 100 mil pessoas sem teto.
Em termos políticos se sobressai o enunciado ante o conclave do presidente palestino Mahmoud Abbas, sobre o inaceitável que resulta ter que reconstruir Gaza a cada dois anos devido à violência exercida de maneira indiscriminada por sucessivos gabinetes israelenses.
A referência de Abbas alude a que entre fins de 2008 e princípios de 2009, a fins de 2012, e em julho e agosto passados, Israel, que possui a arma atômica, atacou Gaza com um saldo geral de 3.670 civis mortos, em sua maioria mulheres, crianças e idosos, e 18 mil feridos e mutilados.
A princípios deste ano o presidente palestino tinha confiado ao líder do Hamas no exílio, Jaled Meshaal, que se fracassar a nova rodada de negociações com Israel, como ocorreu, já sabia "o que fazer e o que dizer".
Nas duas primeiras ocasiões os gabinetes israelenses foram com sucesso ao que tem dado em se chamar "a indústria do holocausto", as menções aos sofrimentos inferidos pela Alemanha nazista aos judeus na II Guerra Mundial como justificativa para o genocídio e a limpeza étnica dos palestinos.
Tudo indica que o atual gabinete israelense contou com essa impunidade, somada ao complexo de culpa de alguns países europeus, em particular Alemanha, para evitar o custo político de uma nova operação em massa contra a população da faixa, um dos territórios mais pobres e superpovoados do mundo, segundo dados da ONU.
Mas o cálculo tem resultado frustrado, como demonstram as veladas críticas de seu aliado estratégico, Estados Unidos, vertidas durante a entrevista entre o presidente norte-americano, Barack Obama, e Netanyahu, no mês passado na Casa Branca.
Isso apesar de a história demonstrar que os presidentes pertencentes ao partido Democrata norte-americano são os mais tolerantes com os desaguisados israelenses.
Mas o caso da atual administração norte-americana, e em particular com o mandatário, com o qual Netanyahu teve várias rusgas e ao que em uma ocasião culpou de "ignorar" as causas do conflito palestino-israelense, parece ser a exceção que confirma regra.
O secretário de Estado norte-americano, John Kerry, também não saiu ileso de seus esforços para manter as práticas, pois um ministro israelense chamou-o de messiânico, acusou-o de ter mania com o diferendo palestino-israelense e desejou que lhe outorgassem o prêmio Nobel da Paz "de uma vez para que fique tranquilo".
Os 50 dias de bombardeios contra Gaza desataram uma tormenta mundial com personalidades tomando partido e setores de poder econômico judeu ameaçando com represálias como é o caso dos atores espanhóis Penélope Cruz e seu marido, Javier Bardem, assinantes de uma carta de protesto.
Ambos foram ameaçados pelo produtor Ryan Kavanaugh por rubricar a missiva que pediu a intervenção da União Europeia para deter a agressão israelense contra a faixa e sua população inerme.
Mas um dos ataques mais contundentes proveio do partido trabalhista israelense, cujo líder, Yitzhak Herzog, qualificou de fracassada a política exterior de Tel Aviv e exigiu "uma diplomacia que vá para além do ataque".
O deputado considerou que o reconhecimento sueco a Palestina e o voto favorável na Câmara de Comuns britânica a uma decisão similar são consequências dessa conduta errônea.
Advertiu que "um vento frio começa a soprar contra Israel de todos os cantos do planeta, mas eles (o governo) não querem fazer frente a esta dura realidade e estão convertendo a diplomacia em uma tormenta", advertiu.
Ou o que é o mesmo: os falcões da ultradireita israelense encerraram-se em um sino pneumático dentro da qual vivem na negação, em espera de tempos melhores, que talvez nesta ocasião não cheguem.
Prensa Latina
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