Equipe responsável pelo avião Anequim sonha com voos mais altos para o monomotor e visa mostrá-lo em exposições. Aparelho atingiu máxima de 521 km/h
Jornal Estado de Minas
Márcia Maria Cruz
Anequim é como é chamada popularmente aquela que é considerada a mais veloz espécie de tubarão encontrada em toda a costa brasileira. Foi também o nome escolhido para batizar o CEA-311, avião monomotor concebido e construído por equipe de alunos e pesquisadores do Centro de Estudos Aeronáuticos (CEA) da Universidade Federal de Minas Gerais (FAE C1A).
E se no mar não há espécie que supere o anequim, no ar ele também vem se mostrando soberano. O monomotor quebrou recordes mundiais de velocidade em cinco modalidades, na categoria FAE C1A – da Federação Aeronáutica Internacional para aviões de 300 a 500 quilos –, e entrou para a história mundial da aviação. Por trás do bom desempenho está uma combinação de sucesso: uma estrutura de ensino de excelência e o entendimento da iniciativa privada sobre a importância de financiar pesquisas em tecnologia de ponta.
Foi graças a essa fórmula e sob a coordenação do professor Paulo Iscold, do Departamento de Engenharia Mecânica, que os estudantes conceberam, projetaram e executaram o Anequim, cujas formas remetem à silhueta de um tubarão. Em uma das modalidades, o aparelho atingiu a velocidade de 521,08km/h, batendo o recorde anterior que era 466,83km/h (veja quadro).
Do projeto do Anequim participaram 30 estudantes, em diferentes fases: da graduação ao mestrado. “A maior parte é de alunos voluntários e é muito gostoso que seja assim. A pessoa vem, porque está apta a receber”, afirma Paulo Iscold. O professor destacou que, desde o primeiro período, estudantes dos cursos de engenharia podem viver esse ambiente. Segundo o coordenador, a UFMG é uma das poucas universidades do mundo em que os alunos não apenas aprendem, como têm a oportunidade de atuar diretamente na execução dos projetos.
O professor Paulo Iscold e a equipe vitoriosa do Cea, à frente do mais novo projeto, o K-55: outros horizontes
José Mauro Moraes Júnior, de 25 anos, é um dos estudantes voluntários que participam do CEA. “Foi um certo alívio (o recorde), misturado com alegria e orgulho. Há muita gente envolvida no projeto e a conquista deu a dimensão de um feito brasileiro”, destaca o estudante de engenharia mecânica, que estava presente no dia em que os recordes foram conquistados, na base aérea de Santa Cruz, no Rio de Janeiro, de 21 a 23 de agosto.
O desenho e as análises estrutural, aerodinâmica e de vibração foram projetadas em computador. “A vantagem do uso de computador pode ser vista tanto no desenho quanto na fabricação. As formas que o avião tem dependem menos da capacidade de produção manual dos alunos”, explica Iscold. No processo de fabricação, a máquina que corta os moldes também é computadorizada, o que é dá mais precisão e permite formas mais complexas.
Outro diferencial da aeronave é a qualidade construtiva. O Anequim é o primeiro avião brasileiro com estrutura primária em fibra de carbono, o que o torna mais leve – pesa 330 quilos, vazio – e, ao mesmo tempo, rígido e forte. O professor destaca que a aeronave é resultado da experiência prática dos alunos. “É a possibilidade de exercitar com nossos alunos características que não podem ser aprendidas em sala de aula, como a criatividade, responsabilidade técnica, senso de empreendedorismo, capacidade de trabalhar em equipe e habilidade de gerenciar recursos, não só financeiros, mas equipamentos e outros materiais”, pontua Iscold.
PERFORMANCE
O professor lembra que buscar bater recorde é uma forma lúdica de envolver os alunos nos projetos, uma maneira motivacional de atrair os estudantes. O processo começa com o professor propondo um desafio. São apresentados os requisitos iniciais e, a partir daí, os envolvidos buscam melhorar a aerodinâmica e atingir a melhor performance possível.
O Anequim começou a ser projetado em março de 2011. A construção teve início de novembro daquele ano e o primeiro voo foi realizado em novembro de 2014. O motor e a hélice foram produzidos por duas empresas dos Estados Unidos, que atuaram como parceiras da UFMG, desenvolvendo as peças a partir das diretrizes criadas pela equipe do professor Iscold.
O voo oficial para a averiguação da velocidade foi acompanhado pela Federação Aeronáutica Internacional na base aérea de Santa Cruz, no Rio de Janeiro.
ENTRE OS MELHORES
O projeto vitorioso é 100% financiado pela iniciativa privada. Uma das empresas parceiras é a Fibraer, que atua em Minas há mais de 20 anos. “O apoio deles é incondicional”, afirma Iscold, acrescentando que o desenvolvimento do projeto representa ganhos para os alunos. “Eles têm a convicção ou certeza de que são bons ou melhores do que engenheiros em qualquer lugar do mundo: europeus, chineses, americanos. Sabem que vão dar conta”, destaca.
Outra vantagem é desenvolver tecnologia de ponta, que será incorporada à indústria nacional. O professor – cuja equipe agora trabalha no projeto do K-55, em parceria com o projetista José Kovacs – pontua que o conhecimento aplicado para melhorar o desempenho chegará a produção dos aviões brasileiros. Formado na UFMG, Iscold elaborou o projeto do CEA-308 que também quebrou recordes de velocidade na época. “Em 1999, o caminho era mais penoso”, lembrou.
O sonho do professor é que o Anequim possa participar de exposições pelo Brasil, mas, para isso, precisa conseguir patrocínio. “É um sonho, mas vamos trabalhar para realizá-lo”, disse.
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